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Aqui neste hotel, localizado na periferia de Frankfurt, está concentrada boa parte da imprensa brasileira que veio para cobrir a Copa. Cruzamos diariamente com intelectuais da bola e da literatura, como Ubaldo Ribeiro, Tostão, Veríssimo, etc., uns ligados ao dia-a-dia do futebol, outros nem sempre. Mas o interessante é exatamente esta troca, onde o mesmo tema acaba sendo focado por óticas diferentes. O futebol é um espetáculo autêntico, não é fabricado pela mídia e sua popularidade é intrínseca. E disso todos nós temos consciência. Com humildade devo dizer que cada um aqui sente, à sua maneira, uma certa frustração por apenas analisar e não ser o ator, numa vitrine tão iluminada como é a Copa do Mundo.

Albert Camus, quando menino, gastava seu tempo batendo bola nos terrenos baldios na Argélia, e na escola era respeitado mais pelo futebol do que pelas letras. Mas, para felicidade de seus leitores, não seguiu adiante como atleta, usando seu talento e imaginação como escritor. No caso de Tostão, é interessante porque ele caminhou por etapas, vencendo uma de cada vez. Mais do que jogador, ele foi campeão mundial e um dos ícones da seleção de 70. Enquanto jogador, ele preenchia seu tempo nas concentrações, lendo ou escrevendo, diferente da maioria que desfrutava o ócio jogando cartas ou pebolim. Parou cedo de jogar, e depois se dedicou à medicina durante 18 anos, retomando o tema agora como colunista. Quando jogava, Tostão talvez sentisse, ao contrário, uma certa frustração por não estar "do outro lado", ou seja, como jornalista. Aí é que vem a diferença, porque para escrever, não há limite de idade, e mesmo cego, como Borges, ainda é possível repassar uma idéia para alguém digitar. Nós, porém, principalmente quem já teve uma certa intimidade com a bola, sentimos falta daquele gostinho de pisar no gramado, e dentro de um estádio lotado. Imagine então disputando uma Copa do Mundo!

Por isso até entendo aqueles que, como eu, sofrem desse mal, e vez por outra expelem o fel em cima de um jogador que não foi bem, porque no fundo queríamos estar do lado de lá. Há, portanto, que se policiar nos exageros, pois ele pode fluir de uma frustração recolhida e inconsciente. Isso é tão perverso quanto o ato subserviente do analista mamão com açúcar.

O Brasil foi mal contra a Croácia? Foi. Ronaldo não jogou nada? Não jogou. Mas que vontade poder estar ali, naquele momento, no gramado perfeito do histórico estádio de Berlim, com 72 mil pessoas aplaudindo ou vaiando, e milhões acompanhando pela telinha! Confesso que não tenho inveja nenhuma dos cartolas que afundam suas poupanças nas confortáveis cadeiras da tribuna de honra, mas admiro e me frustro por não estar, ou ter estado, lá dentro como protagonista do show.

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