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Passei a última semana do ano passado em For­­taleza e fiquei im­­pres­­sionado com a percepção que se tem por lá da Co­­pa do Mundo de 2014. Acos­­tu­­ma­­do ao olhar permanentemente crítico que o Centro-Sul lança sobre o Mundial, me de­­parei com otimismo, esperança e or­­gulho. Parecia se tratar de outro evento ou, até mesmo, de outro país.

Não há caminho ruim para pontos turísticos que não seja justificado com a frase "essa rua vai ser reformada para a Copa" – ou ampliada, ou substituída por outra via maior e mais moderna. A Copa transformou-se em solução para tudo: para a mobilidade urbana precária, para a desigualdade social acentuada, para a se­­gurança pública instável, para o futebol claudicante. Acredita-se verdadeiramente que o Mundial deixará um legado. Mesmo que por linhas não ne­­cessariamente retas.

A uns cento e poucos quilômetros de Fortaleza fica Lagoi­­nha, um paraíso visitado por europeus e americanos, mas ainda pouco explorado por brasileiros. Indo para lá de carro pela praia, fui apresentado pelo guia turístico ao esqueleto de um enorme empreendimento que um grupo português co­­me­­çou a construir, mas abandonou há dois anos por determinação judicial – houve irregularidades na liberação da obra, que inclui um enorme resort e um condomínio com 100 so­­brados duplex, todos com vista para o mar. "O governador vai acabar dando um jeito de liberar a obra, senão vai faltar leito para hospedar os turistas da Co­­pa", disse o guia, em uma bre­­ve aula de jeitinho brasileiro aplicado a grandes eventos internacionais.

O otimismo é potencializado pelo papel reservado a For­­ta­­le­­za na Copa. Serão seis jogos (dois do Brasil), fora a presença na Copa das Confederações. O crescimento do Nordeste acima da média nacional nos últimos anos (embora ainda haja muita pobreza e desigualdade na região) reforça essa tendência a acreditar em um futuro me­­lhor, mesmo que o risco de desilusão seja grande.

O perfil de quem gerencia a Co­­pa em São Paulo ou no Pa­­ra­­ná não difere muito do de quem encabeça o projeto no Nordeste, no Centro-Oeste ou no Norte. O risco de se gas­­tar (muito) mais e se en­­tregar (muito) menos do que o prometido é igual de uma ponta a outra do país. A diferença está na maneira como cada um encara o Mundial. Se o verdadeiro legado de uma Copa do Mundo – como es­­creveu Simon Kuper em Soc­­cernomics – for o orgulho que a população sente por estar no centro das atenções do planeta por um mês, é certo que alguns es­­tados estão mais aptos a usu­­fruir dele. Mesmo que isso não seja necessariamente algo positivo.

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