Paixão e profissionalismo. A fórmula do sucesso do Fluminense, invicto há 11 partidas e vivíssimo na luta contra o rebaixamento no Campeonato Brasileiro, remete Cuca à infância e torna ainda mais saborosa a caminhada para cumprir o que ele mesmo decretou, no dia de sua apresentação, como o maior desafio de sua carreira.
Sob a desconfiança dos erros cometidos e assumidos na passagem turbulenta pelo Flamengo, o treinador desembarcou nas Laranjeiras no dia 2 de setembro com a missão de salvar uma equipe com cerca de 98% de risco de queda para a Série B e reativar a própria carreira. Mais do que isso, Cuca encarava a linha tênue entre a razão e a emoção, trazendo à tona um sentimento encubado desde a infância, no Paraná.
"Torcia pelo Atlético-PR, mas todo mundo tinha um time no Rio. Todo mundo era Flamengo, mas eu e o Cuquinha éramos Fluminense. Me lembro bem da ocasião em que tinha Washington e Assis, de um gol de título em cima da hora que comemoramos bastante. É da época de guri", revelou ao site GloboEsporte.com.
E foi realmente com base no sentimento que Cuca começou a mudar o rumo tricolor. Precisamente no empate por 2 a 2 com o Goiás, pela 31ª rodada do Brasileirão, o treinador arriscou e optou por quem ele sentia estar com mais vontade de tocar o barco. Trocou o ex-capitão Luiz Alberto por Dalton, chutou para longe especulações de mudança de comando, e desde o compromisso seguinte, contra o Atlético-MG, o Flu só sabe o que é vencer.
Assim o treinador começou a escrever o roteiro daquela que pode se tornar a reação mais improvável da história da competição na era dos pontos corridos, um filme que Cuca descarta o papel de protagonista. "Acho que 99% da responsabilidade é dos jogadores", decretou.
Confira toda a entrevista do treinador tricolor:
Onze jogos de invencibilidade e seis vitórias consecutivas. Qual foi a mágica que você aprontou, Cuca?
Não tem mágica. É muito trabalho e dedicação do pessoal em campo. Isso está se refletindo em resultado e nos dando uma chance de escapar desse rebaixamento.
Sempre foi colocada em questão a qualidade do elenco do Fluminense. De repente, jogadores que eram considerados ruins começaram a jogar muito bem, caso, por exemplo, do Mariano. Como isso aconteceu?
Sempre achei o Mariano um bom jogador. É que deu aquela liga, aquela junção. Hoje o time é outro, o pessoal é parceiro. Eles estão sempre se cobrando, se ajudando, se motivando. Temos jovens como o Dalton, o Digão, o Gum, o Dieguinho, o Diogo, o próprio Rafael. São todos jogadores muito jovens. Maicon, Alan, Tartá... A maioria é cria do clube e deu aquele jeitinho gostoso. Se Deus quiser, vamos até o fim do ano assim.
Quando foi que esse quebra-cabeça se encaixou?
Acho que foi naquele jogo em Goiânia. Foi um jogo-chave para mim. Algumas coisas ocorreram de ordem interna, outras de direção técnica, tomamos algumas medidas e a partir dali as coisas melhoraram bastante.
Foi uma partida em que, por exemplo, o Luiz Alberto pela primeira vez não foi titular da zaga. Foi difícil tomar esse tipo de decisão, de barrar jogadores veteranos?
O Luiz é só um exemplo. Não estão jogando o Roni, o Paulo César, o Wellington Monteiro, o Fabinho, mas se estivessem o time estaria bem também. Não existe culpado. O pessoal que entrou está respondendo bem, é puramente questão técnica.
E como estão se comportando esses jogadores que estão fora?
Eles devem estar felizes. Fazem parte do grupo e podem amanhã jogar. Não tenho nada contra ninguém. O que existe é um momento bom que todo mundo está vivendo.
Qual o seu percentual nesta reação, Cuca?
É pequeno comparado ao deles dentro de campo. Se eles não respondem ao que é planejado, nada vale. Então, 99% é deles.
Em geral, quando o trabalho de um treinador dá certo ele tem um representante em campo. Podemos dizer que no Fluminense esse papel é exercido pelo Fred?
Sem dúvida. É o representante, mas junto dele vem todo o pessoal. Desde o Rafael, o Fernando Henrique, passando por todo o elenco. A combatividade do Diogo, a pegada e a saída para o jogo do Diguinho, a criação do Conca, a velocidade do Maicon, o oportunismo do Alan, a irreverência do Tartá, o dinamismo do Mariano, a correria do Dieguinho, a estabilidade do trio de defesa... É assim que se monta uma equipe.
Antes dessas quatro vitórias consecutivas, você chegou a achar que não daria para virar?
Sempre acreditei e continuo acreditando. Até porque, não está nada virado. Estamos dois pontos atrás, faltando três jogos. Agora enfrentaremos o Sport. Muita gente fala que eles já estão rebaixados, mas vai ser mais duro do que vencer o Palmeiras. Depois vamos ter um jogo decisivo com o Vitória, que pode definir muita coisa. Para em seguida encerrar contra o Coritiba. É dedicação total, aliada à Sul-Americana, que é um campeonato que queremos, mas tira muita coisa no condicionamento físico. Temos que saber equilibrar.
Durante a boa fase é fácil receber elogios, mas antes você sofreu muito no clube?
Pô! Sofri muito! Nesse jogo com o Goiás mesmo, era decisivo, tivemos uma reunião interna dura, como tem que ser. São coisas que fazem parte da profissão. O torcedor estava desconfiado com razão. Mas hoje o momento é outro.
Você uma vez disse que seu time de infância era o Fluminense. É ou não é? Está sendo especial para você este momento?
Meu time de infância era o Atlético-PR, mas todo mundo tinha um time no Rio. Todo mundo era Flamengo, mas eu e o Cuquinha éramos Fluminense. Me lembro bem da ocasião em que tinha Washington e Assis, um gol de título em cima da hora que comemoramos bastante. É da época de guri. Depois que se vira profissional, acaba perdendo aquela paixão de torcedor. Fica a lembrança, mas aprendemos a gostar de outros times por trabalhar neles, sentir o clube. É gostoso.
Você vai ficar no Fluminense em 2010 se o ano terminar bem?
Faltam 20 dias para acabar o ano, temos seis jogos que definem a nossa vida na Série A e na Sul-Americana. Não quero perder um minuto para falar de dinheiro. Quero me concentrar no Cerro, no Sport, depois, se Deus quiser, ir para Quito ou para o Uruguai. Não tenho tempo. Depois do dia 6 a gente senta e define alguma coisa.
Faltam seis jogos, como você disse. O que vai ser decisivo nessa reta final?
Sempre peço para Deus sabedoria e sorte. Para saber o que fazer e para sempre a bola passar perto e sair para o adversário e entrar para o nosso time. Deus está abençoando. Temos que ter fé. E fé combina com o Fluminense em todos os sentidos. Quando o pessoal canta a musiquinha do João de Deus eu canto junto. É momento de luta. Quando pensarmos que somos os bons, vamos perder. Temos que continuar como guerreiros.
Se conseguir salvar o Fluminense, será sua maior vitória na carreira?
Não tenho dúvida nenhuma disso.
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