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Vendedor de objetos típicos de Gana, Christian Mintah promete festa dupla pela seleção de seu país e pela do Brasil | Hedeson Alves/Gazeta do Povo
Vendedor de objetos típicos de Gana, Christian Mintah promete festa dupla pela seleção de seu país e pela do Brasil| Foto: Hedeson Alves/Gazeta do Povo

Amizade

Africanos vão unir forças pelo continente

Mesmo longe de casa, o Mundial que começa em junho será especial para a nigeriana Olajumoke Aransiola e o ganês Christian Mintah. Tudo porque a Copa do Mundo de 2010 será a primeira no continente deles. "Esse Mundial vai ser bom não só para a África do Sul, mas para todo o continente, porque milhões de pessoas terão a oportunidade de perceber que a nossa cultura é muito rica e que os países africanos não se limitam a selva, miséria e guerra", argumenta a estudante nigeriana da UFPR.

Mesma opinião de Mintah. Para o ganês, a Copa na África do Sul será uma ótima oportunidade para que outros torcedores africanos acompanhem a disputa in loco. "Todos os africanos estão motivados, na África do Sul, participando desse momento histórico", relata o rapaz.

Os dois também são unânimes em dizer que torcerão por todas as seleções africanas na competição. "Se Gana cair, torço para a Nigéria, Costa do Marfim, Argélia ou África do Sul. Qualquer uma dessa seleções. O importante é a África ir bem", enfatiza o ganês.

Já Olajumoke chegou a quase ter problemas por causa desse posicionamento. Na final do Mundial Sub-20, em que o Brasil perdeu nos pênaltis para Gana em 2009, ela declarou aos amigos brasileiros que torceria pelo país africano. "Nós africanos não somos como os brasileiros, que não torcem pela Argentina, por exemplo. Se tem um país africano em campo, torcemos, independentemente da nacionalidade", diz a nigeriana que, mesmo entre amigos, teve de se conter na comemoração do título de Gana.

  • Janko Ilic: na torcida pela sérvia

Em outubro, o chef de cozinha sérvio Janko Ilic, 35 anos, completa 11 de Curi­­tiba. A estudante Olajumoke Aran­­siola, 24, veio da Nigé­­ria há 4 para cursar Far­­mácia na Universidade Federal do Paraná (UFPR). Alexa Somoza Rudniak, professora de espanhol, 45, deixou Honduras com destino ao Brasil há duas décadas. E Christian Mintah, 22, roda os estados brasileiros há 14 meses vendendo artesanato típico de seu país, Gana.Além de escolher o Brasil para viver, esses quatro estrangeiros têm em comum o fato de terem de torcer por suas respectivas seleções na Copa do Mundo praticamente sozinhos, já que são raros os imigrantes da mesma nacionalidade no país. De acordo com o cadastro de imigrantes da Polícia Federal, residem no Pa­­raná 136 sérvio-montenegrinos (134 ainda constam no sistema como cidadãos da antiga Sérvia e Montenegro, ex-repúblicas iugoslavas que formaram um só país entre 2003 e 2006, e dois de nacionalidade apenas sérvia), 22 nigerianos, 13 hondurenhos e apenas 4 ganeses.

Dos imigrantes entrevistados pela reportagem, apenas o sérvio Ilic terá a sorte de ver sua seleção na companhia de compatriotas. "Conheço quatro sérvios em Curitiba e dois são meus amigos. Eles vão assistir aos jogos da Sérvia lá em casa", diz o chef, que veio ao Brasil por causa da namorada curitibana que conheceu na Itália. Olajumoke até tem um amigo nigeriano em Curitiba, mas ele está na Nigéria, onde foi visitar a família e pretende assistir ao Mundial. Alexa, que veio para o país ao se casar com um brasileiro, conhece outra hondurenha na cidade, mas não mantém contato com ela. E Mintah, único que ainda não fala português, sequer conhece outro ganês que resida no Brasil.

Dos quatro, Ilic é o que mais gosta de futebol. Justamente por causa dessa paixão, hoje o sérvio fala um português praticamente sem sotaque. "Quando cheguei [a Curitiba] eu jogava futebol seis vezes por semana. E foi ouvindo o pessoal depois do jogo, na hora da cervejinha, que melhorei meu português", explica o sérvio, que começou a jogar no time de um amigo da namorada. "Aí fui conhecendo mais e mais gente e hoje posso dizer que praticamente todos os meus amigos brasileiros conheci no futebol", recorda. O plano de Ilic agora é tirar proveito disso. "Nos jogos da Sérvia vou fazer churrasco lá em casa. E todos vão torcer para nós", fala.

Ele acredita que a Sérvia possa se classificar em primeiro no Grupo D, que conta ainda com Alemanha, Austrália e Gana, e chegar às quartas-de-final. Mas, independentemente do resultado, o chef já está empolgado. "Para mim é muito bom assistir à Copa, já que é muito difícil passar um jogo da Sérvia na tevê brasileira", conta.

Já Olajumoke prevê dificuldade para acompanhar o time da Nigéria longe da família – que não vê desde que veio ao Brasil – e sem nenhum conterrâneo do lado. "No meu país a gente se reúne com os vizinhos, faz a maior festa nos jogos. O que me consola é que meus amigos africanos que moram aqui torcerão pela Nigéria", conta a estudante, que terá apoio de angolanos e até de colegas cujos países também estarão no Mundial, como um ganês e uma marfinense. A Nigéria está no Grupo B, ao lado de Argentina, Coreia do Sul e Grécia.

Alexa é realista em relação a Honduras: não acredita que o time passe da primeira fase no Grupo H, que tem ainda Espa­­nha, Chile e Suíça. "Mas nada vai me impedir de torcer muito pelo meu país", diz a professora de espanhol, que revê Honduras em um Mundial 28 anos depois da participação na Copa da Espanha.

Para acompanhá-la na torcida, Alexa terá o apoio do marido brasileiro e das duas filhas – uma nascida na Argentina e outra, no Brasil. "Em relação a Brasil e Argentina, somos um pouco divididos. Mas Honduras é unanimidade aqui em casa", enfatiza.

Mintah, por sua vez, ainda não sabe se estará no Brasil quando a Copa começar. O ganês, que im­­porta e vende artesanato africano e também ataca de MC em um grupo de rap em São Paulo, cogita a possibilidade de ir ao país do Mundial em junho/julho. "Tenho bons amigos sul-africanos, que podem me recepcionar. E eu quero muito participar da festa, mesmo não tendo ingressos para ir aos jogos", diz o rapaz.

Se não puder estar na África do Sul, Mintah já sabe o que fará. "Vou vestir minha camisa de Ga­­na e comemorar muito, esteja onde estiver, sozinho ou acompanhado. Você não sabe a alegria que é para meu povo estar na Copa do Mundo", comenta o ga­­nês, que chegou a comprar um celular com televisão exclusivamente para acompanhar os jo­­gos da seleção.

Assim como os outros três entrevistados, Mintah também vai torcer pelo Brasil no Mundial. "Uma vantagem de estar aqui é que você passa a ter duas seleções pa­­ra torcer na Copa", ressalta, se dizendo indiferente à seleção da Inglaterra, país onde morou por sete anos. "Para quem gosta de futebol, não tem como não torcer pelo Brasil. Ainda mais morando aqui", resume.Problema político se transforma em espírito guerreiro

Para a professora de espanhol Alexa Somoza Rudniak, a participação de Honduras na Copa da África do Sul vem em um momento importante, após uma grave turbulência política. "Infelizmente, estivemos em evidência nos últimos meses por motivos políticos. Portanto, para o povo hondurenho, que é sofrido, a Copa é um momento de alegria e vem em uma excelente hora", enfatiza a moradora do Brasil há 21 anos.

No final de junho de 2009, o presidente Manuel Zelaya foi deposto por militares com o apoio da Suprema Corte e do Congresso. O presidente pretendia fazer uma consulta popular para modificar a constituição do país. Roberto Micheletti assumiu interinamente o governo. Zelaya foi expulso do país, enviado à Costa Rica, de onde retornou clandestinamente e passou 128 dias exilado na Embaixada do Brasil. No começo do ano, foram realizadas novas eleições presidenciais, vencidas por Porfírio Lobo.

Todo o cenário, comenta Ale-xa, pode ajudar Honduras na Co­­pa. "Somos pequenos, mas que­­remos mostrar nosso valor. E acho que esse espírito vai vir mais forte do que na Copa de 1982, justamente por conta de todos esses problemas políticos", avalia a professora hondurenha.

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