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 | Mauro Campos
| Foto: Mauro Campos

O gosto da lona não faz bem a Wanderlei Silva. Foram duas derrotas em pouco mais de três meses. Primeiro, para o croata Mirko Cro Cop, em novembro, e depois para o americano Dan Henderson, ambas pelo Pride, no Japão. Acostumado a justamente o contrário, fazer seus adversários beijarem o solo com fúria e rapidez impressionantes, o ainda maior nome do vale-tudo mundial quer retomar o caminho das vitórias e esquecer o sabor amargo dos insucessos recentes.

E já tem data marcada, ou melhor, pretendida para isso. O paranaense quer participar, a partir do dia 8 de abril, do último evento do Pride (edição 34) comandado por Nobuyuki Sakakibara, presidente da entidade que "revelou" Wanderlei, de saída da organização. Seria a oportunidade de retribuir o carinho do dirigente e, ao mesmo tempo, recuperar o prestígio no mundo das lutas.

Para tanto, Wanderlei treina arduamente em casa e na academia Chute Boxe, acompanhado 24 horas por dia pelo preparador físico Rafael Alejarra. E foi após uma forte sessão de "tortura", cansado mas muito à vontade no minicentro de treinamento que tem nos fundos da sua residência, que Wandeco, como é chamado pelos amigos, falou sobre os dez anos de carreira, o momento atual de questionamento e o que planeja para quando pendurar as luvas.

Você reinou absoluto durante muitos anos no vale-tudo mundial. Duas derrotas em um curto espaço de tempo é um sinal de decadência?Foram dois resultados negativos e isso é ruim para todo atleta, por melhor que seja. Influencia bastante na imagem. Mas o negócio agora é treinar. E vou correr atrás do clássico, que é quando se ganha de um atleta top. O próximo cara que eu pegar de nome e conseguir fazer uma boa atuação, já estarei lá em cima novamente. O esporte é assim, e no futuro, quando eu for comentar de vitória e derrota nas minhas palestras, vou poder falar com propriedade, e mostrar que eu dei a volta por cima.

O que provocou essas duas derrotas?Toda derrota tem a sua peculiaridade. A primeira eu perdi porque peguei um cara maior (Cro Cop), mais pesado, me abri um pouco e acabei tomando uns golpes. Já na segunda (Dan Henderson), adoeci na véspera e isso pode ter influenciado. Mas também fui surpreendido, acabei levando um cruzado na ponta do queixo que foi fatal.

Se arrependeu de ter lutado doente?Os médicos falaram que eu podia não lutar. Mas eu ia fazer o evento principal da noite, e toda a luta estava sendo promovida em cima de mim. Era meu compromisso, meu trabalho, eu tinha que fazer. Fui, fiz e infelizmente perdi. Se eu ganho doente a vitória teria sido melhor. Não me arrependo, tudo para mim é a experiência.

Quando será o seu próximo combate?Vai mudar o presidente do Pride, o Nobuyuki Sakakibara, e o último torneio com ele à frente será no dia 8 (próximo domingo). E esse cara é muito quente. Ele casou lutas muito boas para mim, tive chance de mostrar meu trabalho. E eu quero muito me apresentar lá. Pedi para ele casar uma luta minha com qualquer um. Aceito qualquer um. É um evento importante de despedida, portanto, estou lançando esse desafio. Aliás, se tiver alguém lendo a Gazeta do Povo e estiver sem fazer nada, vamos lá para o Japão fazer um "peguinha" com o Silva.

De alguma forma as derrotas, e o fato de já ter 30 anos de idade, fazem você projetar o final da carreira?Não, por enquanto não. Quero lutar até os 35 anos de idade, no ritmo que eu estou, fazendo quatro, cinco lutas por ano. Só que agora estão acontecendo coisas novas, como o caso do Randy Couture (lutador americano), que tem 43 anos e está em uma condição muito boa. Eu vou lutando enquanto eu sentir que estou no ritmo.

Quais as suas pretensões quando o momento de pendurar as luvas chegar?Já estão surgindo vários planos para eu abrir centros de treinamento. Pessoas de três países me convidaram, dos Estados Unidos (Los Angeles), Japão (Tóquio) e França (Paris). São empresários querendo que eu coloque meu nome e prestígio, além de treinar os atletas. Mas eu acho que ainda não é o momento, estou em ritmo forte de competição. E na luta não se pode parar. Se parar, para voltar é muito pior.

Você tem a intenção de atuar também como empresário de lutadores?Com certeza, também é um caminho. Hoje em dia eu sou conhecido pelos promotores de todos os eventos, tenho abertura em todos eles para no futuro colocar meus atletas. Através do meu mestre (Rudimar Fedrigo) estou aprendendo como se monta um time, se administra os atletas. Eu me espelho no meu mestre para tudo. E se eu for tão bom quanto ele, tenho certeza de que terei uma carreira de sucesso.

Pelo jeito você será um "faz-tudo" no ramo. Mais alguma tarefa relacionada ao vale-tudo para o futuro?Gosto muito também das palestras motivacionais. Já fiz para times de futebol, como o Coritiba, no cursinho pré-vestibular do Dom Bosco a rapaziada adorou, e faço sempre nas academias e na minha igreja (do Balão, no Alto da XV), só que aí de outro tipo. Só que é preciso saber ordenar os pensamentos para que as pessoas saibam o que você está querendo dizer. Infelizmente, não tive oportunidade de fazer faculdade, sou autodidata, leio muito sobre vários assuntos, para que eu consiga colocar minhas idéias. Outra coisa que me motiva muito são projetos sociais. Já tenho participado de alguns, e quero ajudar ainda mais.

Você aponta alguém como seu sucessor no vale-tudo?Em termos de competência, o (Maurício) Shogun já me passou. Ele está muito bem, lutando com os melhores atletas, Antes ele era meu fã, agora é o contrário. É um cara humilde, gente boa, uma pessoa que gosto muito e aprendi a admirar. Trabalha sério, não tem medo de ninguém. Aliás, quero aproveitar e dar os parabéns, pois ele vai casar agora em setembro. E aproveito para convidar todo mundo que lê a Gazeta do Povo para entrar em contato com o Shogun para ir na festa. É só falar que eu liberei.

São dez anos de carreira no vale-tudo. Quais as principais mudanças de quando você começou para os dias atuais?A imprensa especializada tem dito que o MMA (Mixed Martial Arts) cresceu nos últimos seis meses o que não tinha conseguido em dez anos. Isso se dá em virtude da liberação do esporte em cidades importantes dos Estados Unidos. Como na Califórnia, onde o governador Arnold Schwarzenegger assinou um decreto liberando. Assim como em Las Vegas, onde estamos lutando. Através disso, está se abrindo o caminho em todo o país, e os Estados Unidos todo têm um mercado fabuloso. Eles são alquimistas, tudo que fazem vira ouro.

A recente união do americano dos eventos, Ultimate Fighting Championship (UFC) com o japonês Pride FC é importante nesse processo?Sem dúvida. Eles estão lançando a maior organização de vale-tudo do mundo. Teremos duelos entre os melhor desses eventos, serão combates cada vez mais difíceis e o mundo inteiro vai prestar atenção. Eu, o (Evangelista) Cyborg e o (Maurício) Shogun estamos no time japonês. Também é um incentivo para eu tentar a realização de um projeto de comprar um horário em canal aberto aqui no Brasil, para passar as lutas desses eventos. O brasileiro gosta muito de luta, e aqui temos os melhores do mundo. Já entrei em contato com dois canais e estou vendo o preço. Se eu conseguir uns produtores bons, e conseguir mostrar todo o show, vai ser minha contribuição para o esporte crescer.

Você fica aborrecido por ser mais famoso no Japão do que no Brasil?Não, até porque assim consigo levar uma vida tranqüila aqui. No Japão, nos Estados Unidos também está ficando assim, não posso dar uma volta na rua que a galera já fica em cima. Para se ter uma idéia, um vídeo meu no Youtube foi o mais assistido por três dias, visto por 600 mil pessoas. E o legal é que estou alcançando um reconhecimento de gente de todas as classes e faixas etárias.

Algum ato de idolatria te marcou muito?Todo evento que eu vou acontece alguma coisa. Eu já vi mais de dez pessoas com a mesma tatuagem que eu tenho na cabeça. Tem um cara na França super meu fã, fez minha tatuagem e se tornou meu amigo.

É difícil lidar com o assédio?Eu sou supersimples, nasci nas Mercês, morei em Santa Felicidade, e tem cara que chega perto de mim tremendo. É estranho. Eu trabalhei durante dez anos no balcão do bar do meu pai (Holando Silva), então eu tenho um bom trato com as pessoas, de balconista mesmo. Já lutava profissionalmente e trabalhava lá. Esse tempo fez com que eu trate todo mundo da mesma maneira.

Como você gasta ou investe o dinheiro que arrecadou no esporte?Vivi sempre de uma maneira muito simples. Sei que não posso me iludir com tudo que tenho agora, pois não vai ser assim para sempre. É apenas um período. Então procuro investir da melhor maneira possível para que depois eu não dependa de ninguém. Eu fui aprender o que é cartão de crédito neste ano. E para dizer que não comprei nada, com a minha última bolsa trouxe dos Estados Unidos duas calças, dois tênis e um Playstation 2.

E brinca com o Wanderlei Silva no game do Pride?Luto com o meu boneco, e ele vai bem, dá um monte de porrada nos outros. E o videogame é legal, pois atinge um público diferente, muita gente me conhece através do videogame.

Você tem um filho homem (Thor, 3 anos), gostaria que ele seguisse seus passos?Eu falo pra ele direto: "e aí, você vai lutar igual o papai?". Ele responde: "lógico!". Eu quero muito que ele seja lutador. Eu já tinha uma filha (Rafaela, 10 anos), então queria um menino. Então avisei minha mulher que, se nós não tivéssemos um filho homem íamos tentar mais um. Mas minha mulher (Téa) é tão fabulosa que já deu certo na primeira. Sempre levo ele na academia, gosto quando ele fica brincando dando soco no saco de areia. Ele que vai decidir, mas como convive com isso será algo normal.

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