Encontre matérias e conteúdos da Gazeta do Povo
Especial Patrocinado

Flagrante em Crime Ambiental: TJPR valida prisão em flagrante de coproprietário sem participação na conduta, reacendendo debate sobre responsabilidade penal objetiva.

Em uma decisão controversa, o Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) considerou legítima a prisão em flagrante de um coproprietário de imóvel por crime ambiental, mesmo sem qualquer indício de que ele tenha participado do ato ilícito. O entendimento gera intenso debate jurídico por potencial violação de garantias fundamentais, como a presunção de inocência e a vedação da responsabilidade penal objetiva.

O caso analisado envolvia um terreno com diversas residências, onde uma intervenção de terraplanagem em área, em tese, protegida ambientalmente foi realizada por um dos moradores em seu quintal.
O caso analisado envolvia um terreno com diversas residências, onde uma intervenção de terraplanagem em área, em tese, protegida ambientalmente foi realizada por um dos moradores em seu quintal. (Foto: Divulgação)

Ouça este conteúdo

Uma recente decisão da Segunda Turma do Tribunal de Justiça do Paraná acendeu um alerta no meio jurídico. Por maioria, o colegiado entendeu que a condição de coproprietário de um imóvel onde ocorreu um crime ambiental é suficiente para justificar a prisão em flagrante, mesmo que o indivíduo sequer estivesse presente no momento do suposto dano e sem qualquer indício de que tenha praticado ou autorizado qualquer ação ilegal. O entendimento gera intenso debate jurídico por potencial violação de garantias fundamentais, como a presunção de inocência, e reacende um perigoso questionamento sobre a inadmissibilidade da responsabilidade penal objetiva no ordenamento brasileiro.

Prisão Sem Conduta: a aplicação indevida da Responsabilidade Objetiva

A polícia ambiental, ao chegar ao local, prendeu o operador da retroescavadeira que imediatamente identificou o contratante, responsável direto pela intervenção - também preso no local.

Em seguida, os policiais identificaram outro coproprietário do imóvel, que não estava presente, não foi citado por ninguém como participante e não havia qualquer indício de envolvimento direto ou indireto. Ainda assim, deslocaram-se até o seu local de trabalho, com centenas de funcionários presentes, onde efetuaram sua prisão em flagrante, causando forte repercussão.

Análise jurídica: Prisão sem conduta é constitucional?

De acordo com o advogado Rodrigo Castor de Mattos, mestre em direito penal econômico e sócio do escritório Delivar de Mattos & Castor Advogados a decisão é preocupante sob a ótica constitucional e do direito penal.

" A prisão de alguém sem qualquer indício de participação em conduta criminosa viola o princípio da presunção de inocência e traduz uma forma de responsabilidade penal objetiva, rejeitada pelo ordenamento jurídico brasileiro"

Rodrigo Castor de Mattos

O entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) é claro: ninguém pode ser penalmente responsabilizado muito menos preso em flagrante apenas por sua posição formal, como a de coproprietário, sem qualquer indício de participação, dolo ou culpa.

A prisão de alguém desvinculada de qualquer conduta criminosa afronta o princípio da presunção de inocência e o próprio conceito de flagrante delito, que pressupõe ação ou omissão voluntária relacionada ao fato.

A responsabilização criminal, portanto, exige sempre uma conduta humana consciente, com vínculo subjetivo com o resultado e comprovação mínima de autoria ou participação.

No caso dos crimes ambientais, embora o tipo penal possa admitir modalidades culposas, o artigo 3º da Lei nº 9.605/1998 é categórico ao exigir que a responsabilidade penal decorra de ação ou omissão dolosa ou culposa. Assim, a mera titularidade de um bem não autoriza prisão nem imputação penal sem demonstração de envolvimento na conduta.

Voto vencido aponta violações de garantias

Na decisão, houve voto divergente de um dos desembargadores, que enfatizou a ausência completa de elementos que vinculassem o coproprietário ao crime ambiental. O magistrado destacou que a prisão, nos moldes em que ocorreu, representava uma grave violação aos direitos fundamentais e poderia abrir precedentes perigosos.

Precedente preocupante para coproprietários

A validação dessa prisão em flagrante levanta um debate essencial: até onde vai a responsabilidade penal por danos ambientais? E mais: ser coproprietário é o suficiente para se tornar suspeito ou réu?

Especialistas temem que o entendimento do TJPR, se replicado por outros tribunais, possa gerar insegurança jurídica, principalmente entre coproprietários de imóveis rurais, condomínios ou terrenos com áreas comuns, onde a atuação de um morador poderia, injustamente, implicar os demais.

O alerta: a vedação da Responsabilidade Objetiva e os Direitos Constitucionais

O entendimento do TJPR levanta questões cruciais sobre os limites da lei penal e os direitos do acusado. Para aprofundar a discussão sobre a responsabilidade penal objetiva e o impacto prático dessa decisão, consultamos o advogado Rodrigo Castor de Mattos, mestre em direito penal econômico, que responde às perguntas que o caso suscita.

O entendimento do TJPR levanta questões cruciais sobre os limites da lei penal e os direitos do acusado. Para aprofundar a discussão sobre a responsabilidade penal objetiva e o impacto prático dessa decisão, consultamos o advogado Rodrigo Castor de Mattos, Mestre em Direito Penal Econômico, que responde às perguntas que o caso suscita.O entendimento do TJPR levanta questões cruciais sobre os limites da lei penal e os direitos do acusado. Para aprofundar a discussão sobre a responsabilidade penal objetiva e o impacto prático dessa decisão, consultamos o advogado Rodrigo Castor de Mattos, Mestre em Direito Penal Econômico, que responde às perguntas que o caso suscita. (Foto: Foto: Dessa Pires/Escritório Delivar de Mattos & Castor Advogados)

JORNALISMO GAZETA DO POVO: o impacto prático dessa decisão?

Advogado Rodrigo Castor de Mattos: A decisão pode gerar um efeito multiplicador extremamente preocupante. Ela abre espaço para que qualquer coproprietário de imóvel, mesmo sem envolvimento direto ou indireto com uma infração ambiental, seja alvo de prisão em flagrante apenas com base no registro de propriedade. Isso compromete a segurança jurídica de milhares de pessoas que dividem propriedades com terceiros, especialmente em áreas urbanas e rurais com uso compartilhado.”

JORNALISMO GAZETA DO POVO: O que a defesa deve fazer nesse tipo de situação?

Advogado Rodrigo Castor de Mattos: A primeira providência deve ser a impetração imediata de habeas corpus, demonstrando a ausência de situação de flagrância nos termos do art. 302 do CPP. Também é essencial reunir documentos e testemunhos que comprovem a completa ausência de envolvimento do coproprietário na conduta. A defesa precisa destacar, com base em precedentes do STF e STJ, que a responsabilidade penal objetiva é inadmissível no ordenamento jurídico, mesmo em matéria ambiental.

JORNALISMO GAZETA DO POVO: A decisão pode influenciar outros estados?

Advogado Rodrigo Castor de Mattos: Sem dúvida. Decisões como essa, ainda que localizadas, têm potencial de repercussão nacional, especialmente quando tratam de temas sensíveis como o Direito Penal Ambiental. Por isso, é fundamental que os tribunais superiores como o STJ e o STF se manifestem de forma clara e firme, a fim de uniformizar a jurisprudência e impedir que garantias fundamentais sejam relativizadas sob o pretexto de tutela ambiental.

JORNALISMO GAZETA DO POVO:A decisão se alinha com a legislação ambiental brasileira?

Advogado Rodrigo Castor de Mattos: Não no aspecto penal. É verdade que, na esfera administrativa e civil, a legislação ambiental adota o regime de responsabilidade objetiva, o que dispensa a demonstração de dolo ou culpa. No entanto, quando falamos de responsabilidade criminal, os princípios constitucionais são outros: é indispensável comprovar uma conduta dolosa ou culposa. O que vemos nesta decisão é uma perigosa confusão entre os regimes jurídico administrativo e penal, o que pode gerar distorções graves na aplicação da lei.”

Quais medidas preventivas coproprietários devem adotar para evitar esse tipo de situação?

Advogado Rodrigo Castor de Mattos: Recomendo que todo coproprietário tome algumas providências básicas, mas estratégicas, como:

  • Manter a documentação do imóvel atualizada, com a descrição clara das áreas de uso exclusivo e comum;
  • Formalizar acordos internos de uso e gestão por escritura pública ou instrumento particular com firma reconhecida;
  • Comunicar-se de forma documentada com os demais proprietários sempre que houver intervenções no imóvel;
  • Estar atento às autorizações ambientais e agir prontamente para impedir qualquer atividade irregular por terceiros na propriedade.”

Essas medidas, ainda que simples, podem fazer diferença em situações como essa, demonstrando boa-fé, diligência e ausência de vínculo com possíveis infrações.

Advogado Rodrigo Castor de Mattos: O episódio reforça a necessidade de equilíbrio entre a proteção ao meio ambiente e a preservação dos direitos fundamentais do acusado. Não se pode, sob o pretexto de proteger o meio ambiente, flexibilizar garantias constitucionais, como a presunção de inocência ou a exigência de conduta penalmente relevante.

É fundamental que o tema seja revisto pelos tribunais superiores, para evitar que decisões semelhantes tragam insegurança e prejudiquem cidadãos que, mesmo sem culpa, passam a ser tratados como criminosos.

O escritório Delivar de Mattos & Castor Advogados mantém o compromisso de produzir conteúdos jurídicos de qualidade, com análises e reflexões sobre temas relevantes do Direito.

Confira também o artigo sobre a prisão após condenação pelo júri e a proteção à presunção de inocência, publicado no site do escritório:
Acesse o conteúdo completo aqui.

Siga o escritório Delivar de Mattos & Castor Advogados nas redes sociais para mais conteúdos sobre Direito Penal, Ambiental e Constitucional.

Site: https://delivardemattos.com.br/

Receba nossas notícias NO CELULAR

WhatsappTelegram

WHATSAPP: As regras de privacidade dos grupos são definidas pelo WhatsApp. Ao entrar, seu número pode ser visto por outros integrantes do grupo.