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Em janeiro de 2024, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) decidiu substituir o termo "erro médico" por "danos materiais ou morais decorrentes da prestação de serviços de saúde". A antiga denominação “erro médico” não levava em consideração a natureza complexa e multifatorial dos cuidados de saúde. Devido a esse equívoco, muitas vezes o profissional médico responde por atos que não são de sua responsabilidade, colocando em risco sua imagem e reputação profissional.
A mudança estabelecida pelo CNJ chama a atenção para um tema que preocupa toda a sociedade brasileira: o aumento de processos judiciais relacionados a danos materiais ou morais decorrentes da prestação de serviços de saúde.
De acordo com o Painel de Estatísticas Processuais de Direito à Saúde, em 2024 houve aumento de 15% no número de processos judiciais relacionadas à saúde em relação ao ano anterior, chegando a 657.473 novas ações.
Um número considerável desses processos na área de saúde envolve “erro médico”, termo que passou a ser classificado como danos morais ou materiais. Na comparação entre 2023 e 2024, o aumento de ações relacionadas a “erro médico” chegou a 506%. De cerca de 12 mil processos passou para mais de 74 mil nos sistemas público e particular em apenas um ano.
Os desafios para quem atua na saúde
A judicialização crescente traz preocupação a profissionais de saúde, empresas e instituições prestadoras de serviços. Os desafios para quem atua no setor vão além das tarefas cotidianas de cuidar da saúde dos pacientes. E uma das questões levantadas é: como agir e se proteger diante de um cenário cada vez mais complexo?
Um passo importante para atuar com segurança e reduzir riscos é buscar ajuda de advogados especializados em ações judiciais relacionadas à saúde. O profissional com atuação na área jurídica poderá dar orientações preventivas como também atuar na defesa do médico, empresa ou instituição de saúde quando uma ação já tiver sido ingressada na Justiça.

A advogada especialista em ações judiciais relacionadas à saúde Paula Aranha Hapner, do Hapner Kroetz, escritório tradicional de advocacia do Brasil, explica que um profissional de saúde, empresa ou instituição prestadora de serviço de saúde, diante de uma ação judicial por dano moral ou material, deve se preocupar em reunir e disponibilizar ao escritório de advocacia toda a documentação existente que tiver registrado o atendimento, assim como identificar possíveis testemunhas que tiverem participado dos fatos, em razão do impacto que esses elementos probatórios possuem no resultado do julgamento.
Entre os pontos que contribuem para garantir os direitos de quem atua no setor de saúde, seja profissional ou empresa, pode-se destacar como fundamental o conhecimento das obrigações legais, normas e regulamentações. A legislação visa a proteger os pacientes, assegurar direitos dos profissionais e promover práticas seguras.
Atitudes e medidas preventivas
As ações preventivas implicam adotar um programa de compliance, isto é, um conjunto de obrigações no sentido de cumprir e se fazer cumprir as normas legais e regulamentares. Por meio de compliance é possível evitar, detectar e tomar providências diante de quaisquer desvios ou inconformidades que possam ocorrer. Essa iniciativa reduz riscos de demandas judiciais.
A proteção dos direitos dos pacientes, a tomada de decisões éticas complexas, as quais podem envolver dilemas morais, a relação de confiança entre os profissionais e os pacientes, além da prevenção de erros e adoção de protocolos de segurança fazem parte desse rol de medidas necessárias para garantir segurança, as quais incluem utilização de equipamentos e técnicas seguras.
Não menos importante é o profissional aprimorar seus conhecimentos, se atualizar sobre novas tecnologias do setor e estar ciente das práticas e padrões de conduta previstas pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). Outra medida importante é a adoção de medidas de segurança para garantir a integridade física e psicológica de seus pacientes.
Ações contra médicos aumentam também no Conselho Federal de Medicina
O crescimento de ações contra médicos não se restringe à esfera judicial. O número de processos ético-profissionais (PEPs) registrados pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) aumentou 55% entre 2019 e 2023, de acordo com dados fornecidos pelo próprio CRM ao jornal o Estado de São Paulo em julho de 2024. Foram 729 processos abertos em 2023 contra 470 em 2019.
As denúncias são feitas por pacientes e familiares, administradores de hospitais, Poder Judiciário, Delegacias, Ministério Público ou pela própria Comissão de ética dos Conselhos Regionais de Medicina. Entre os motivos das ações destaca-se acusação de erro na conduta médica; violação do Código de Ética Médica; descumprimento do sigilo profissional, infração no direito do paciente e seus familiares sobre decisões de práticas médicas e remuneração indevida.
As penas disciplinares aplicáveis pelos Conselhos Regionais aos seus membros estão previstas no artigo 22 da Lei nº 3.268/1957:
a) advertência confidencial em aviso reservado;
b) censura confidencial em aviso reservado;
c) censura pública em publicação oficial;
d) suspensão do exercício profissional até 30 (trinta) dias;
e) cassação do exercício profissional, ad referendum do Conselho Federal.
A advogada Ana Paula Muggiati dos Santos Thomé, do escritório Hapner Kroetz, explica que, ao receber o resultado de um PEP (Processo Ético Profissional), o médico tem a possibilidade de recorrer diretamente ao Conselho Federal de Medicina, pela via administrativa, no prazo de 30 dias, assessorado ou não por um advogado. As chances de sucesso e riscos de eventuais medidas judiciais cabíveis deverão ser avaliadas, no caso concreto, após a análise jurídica de todos os elementos – formais e materiais – do processo administrativo e de todos os registros documentais que o médico tenha reunido.
