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Sala do Belas Artes, em São Paulo: público classe A e B | Divulgação
Sala do Belas Artes, em São Paulo: público classe A e B| Foto: Divulgação

O Caixa Belas Artes voltará a ser apenas Belas Artes. Na esquina das avenidas Paulista e Consolação, o histórico cinema de rua de São Paulo anunciou o fim da parceria com a Caixa Econômica, que não renovou o contrato encerrado em dezembro de 2018. 

Inaugurado em 1967, o espaço pode fechar em dois meses caso não encontre novos patrocínios, de acordo com o dono do Belas Artes e ex-secretário municipal de Cultura, André Sturm. 

O montante da estatal destinada ao cinema, ao longo de cinco anos, é estimado em R$ 11 milhões. Apenas o aluguel da área, que possui mais de mil metros quadrados, custa quase R$ 2 milhões ao ano. Em 2015, o faturamento bruto foi de cerca de R$ 4 milhões, sendo apenas o patrocínio da Caixa correspondente a quase metade, o que evidencia a dependência da empresa em relação à estatal. 

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A medida faz parte de uma ampla revisão de contratos de estatais promovidas pelo novo governo. Além de promessa de campanha de Jair Bolsonaro, o Tribunal de Contas da União determinou, ao final de 2018, que a União implemente a obrigatoriedade de transparência das ações de patrocínio, com disposição de informações nos sites das estatais, incluindo, em especial, a motivação para a seleção do patrocinado. 

Essa nova política de marketing também mirou o esporte. Maior patrocinadora do futebol nacional, estampando sua marca na camisa de 24 clubes, o banco está em processo de revisão desses patrocínios. Nos últimos 7 anos, a estatal despendeu-se R$ 663,6 milhões com futebol, muitas vezes arcando com valores acima dos pagos pelo mercado. 

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A exemplo da Caixa, a Petrobras também anunciou estar "revisando sua política de patrocínios", e vai parar de apoiar a Sessão Vitrine, iniciativa que busca dar maior visibilidade aos filmes nacionais. Ao contrário do Belas Artes, a Vitrine Filmes anunciou que continuará funcionando, mesmo sem a renovação do patrocínio. 

No tocante ao Belas Artes, há quem o defenda por exibir produções “fora do circuito comercial” e “contra a hegemonia” dos cinemas de shopping. No entanto, segundo pesquisa de mercado, a localização é um critério mais considerado pelos clientes na escolha de destino do que a programação: apenas 20% dos clientes afirmam optarem pelo Belas Artes em virtude do último fator

Cinema para os mais ricos

A Caixa acerta na postura, pois o financiamento da cultura por meio da máquina pública tem se mostrado socialmente regressivo. Levantamento realizado pelo Midia Dados Brasil, por exemplo, mostrou que 58% do público consumidor de cinema na cidade de São Paulo integra as classes A, B1 e B2. Logo, se alguém tem a ganhar com este auxílio, além dos próprios donos do Belas Artes, são os paulistas de maior renda. 

Não é algo isolado: entre os consensos da ciência econômica listados por Gregory Mankiw, professor de economia de Harvard, consta o de que governos deveriam eliminar subsídios para questões culturais, como esportes. Não é comum, por exemplo, cinemas europeus sobreviverem com ajuda financeira de impostos

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Não deveria, portanto, caber à administração pública auxiliar o custeio de um cinema: eles têm de sobreviver por conta própria, seja pela venda de ingressos, pipocas e refrigerantes, ou por meio de parcerias e patrocínios privados. Caso contrário, o que há é tão somente a utilização do dinheiro público para a criação de uma demanda artificial — e, neste caso, um tratamento especialmente injusto para com as classes mais baixas, que não costumam ter acesso ao tipo de entretenimento oferecido pelo estabelecimento. 

Belas Artes já foi fechado antes

Caso ocorra o fechamento, não será a primeira vez. O espaço ficou fechado entre 2011 e 2014, indicando que as dificuldades de se manter viável financeiramente vêm de longa data. À época, houve protestos e uma mobilização que reuniu mais de 90 mil assinaturas pedindo por sua reabertura. Diante disso, o então prefeito de São Paulo, Fernando Haddad, aproveitou-se do fato de que seu partido ainda comandava o Palácio do Planalto e auxiliou na articulação do patrocínio da Caixa

A exemplo da postura de Haddad, a atual gestão da prefeitura de São Paulo em nota lamentou o fim do patrocínio e “colocou-se à disposição para auxiliar na busca de uma solução”. Dessa forma, entende-se que tentará fazer pressão a fim de obter uma nova forma de financiamento para a empresa. 

Vale ressaltar que a marca diz ser viável para anunciantes: em 2018, teve 1.150 citações na mídia, e um valor estimado em R$ 6,5 milhões em publicidade. Se assim for, não deve ser um desafio fechar um novo patrocínio junto à iniciativa privada — algo por que os corretores da Caixa e demais pagadores de impostos certamente agradeceriam.

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