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Nossos colunistas analisam as revelações contidas nos arquivos e fazem previsões sobre as consequências do episódio.
Nossos colunistas analisam as revelações contidas nos arquivos e fazem previsões sobre as consequências do episódio.| Foto: Gazeta do Povo

“Autoritarismo”, “governo ilegítimo”, “humilhação mundial”, “fraude eleitoral”.

Estas são algumas das expressões usadas por cinco colunistas da Gazeta do Povo convidados pela editoria de Ideias para opinar sobre o relatório divulgado na noite de quarta-feira (17) pela Câmara dos Estados Unidos.

O documento, apresentado pelo Comitê Judiciário do Partido Republicano, traz denúncias de censura em contas brasileiras da rede social X cometidas a partir de decisões do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes.

Veja a seguir a análise dos nossos colaboradores com relação às revelações contidas nos arquivos e suas previsões sobre as consequências desse episódio.

Rodrigo Constantino

É assustador o que veio à tona. Tirar da clandestinidade o que o ministro Alexandre de Moraes colocou nessas decisões é fundamental para dar transparência à democracia. E também para mostrar por que havia esse sigilo. Porque são medidas claramente ilegais e abusivas.

Talvez o caso mais chocante seja o do [youtuber] Monark, que não cometeu crime algum. Ele criticava o ministro e teve os seus direitos fundamentais anulados, a pedido do Alexandre.

A constatação clara, para mim, é que o ministro não enxerga seus críticos como seres humanos. É o risco da desumanização em curso no país. Os críticos para ele são pragas, vírus que precisam ser eliminados para proteger o sistema.

Eu sabia disso porque sou vítima, estou nos arquivos. Já havia pedido várias vezes para que o ministro suspendesse o sigilo do meu caso, para mostrar ao Brasil o que ele tinha contra mim.

O que o mundo está vendo agora é uma coleção de tuítes inocentes e totalmente legítimos dentro de qualquer democracia. Não há nenhum crime, nenhum atentado golpista sendo articulado.

A linha de defesa dos censores e bajuladores do ministro Alexandre é argumentar que ele estava tentando salvar a democracia de golpistas, mas temos de lembrar que essas decisões todas são anteriores ao 8/1.

Está muito claro: a ditadura está escancarada. E outra coisa que chama a atenção, claro, é que todas as contas censuradas são de direita.

Se o Brasil fosse um país sério, tinha que cair muita gente. A começar pelo ministro Alexandre.

Mas a gente sabe que o Brasil não é um país sério, então a gente fica apreensivo. Porque o sistema vai dobrar a aposta, como tem feito sempre.

Esse embate ninguém sabe como vai terminar. Minha previsão é de que o Brasil vai virar uma Venezuela de vez. Ou que, pelo menos, o Alexandre de Moraes caia o quanto antes.

Luiz Philippe de Orleans e Bragança

Os documentos apresentados no Congresso dos Estados Unidos comprovam que houve, por parte do ministro Alexandre de Moraes, censura, violação da legalidade, abuso de poder e interferência nas eleições.

São quatro coisas extremamente graves, não dá para conduzir o país com um ministro que pratica isso livremente. E sabemos que os outros ministros também poderiam ter sido os protagonistas disso.

O sistema é muito permissivo, justamente porque não tem um contrapeso ao poder do Judiciário. A preocupação é: como o sistema vai reagir?

Certamente, eles vão querer contemporizar, amenizar essa situação. Achar uma saída que não envolva o impeachment do ministro ou uma reforma do Judiciário. São coisas que nós, a população e os parlamentares, precisamos exigir.

Para a população em geral, cabe pressionar os parlamentares do centro a abandonar o governo e apoiar o lado da verdade. Também precisamos de uma pressão para ter CPI e impeachment de ministro, assumindo a premissa de que esses documentos têm toda a legalidade – e a minha impressão é de que têm.

Temos ainda que reverter todas essas medidas ilegais que foram tomadas e fazer uma reforma do Judiciário. Eu diria que esses são os próximos passos que a população está esperando do parlamento e do sistema como um todo. Precisamos encampar esse novo movimento.

Francisco Razzo

Achei o relatório muito interessante, me parece uma afirmação de tudo o que a gente, de alguma forma, vem sentindo – que é a existência de uma postura arbitrária do ministro Alexandre de Moraes. E também de uma postura partidária, em algum momento.

Há um flerte explícito com o combate a posições políticas ligadas a uma tendência conservadora e, sobretudo, afiliada à direita brasileira, goste ou não dela.

É um ministro que, tudo indica, tem um posicionamento político explicito. Isso é um drama para uma república que depende da separação e do equilíbrio entre os poderes.

O relatório acaba mostrando a extensão de um poder que está engolindo, com sua força arbitrária, posicionamentos políticos que não estão alinhados aos dele. Sempre com aquele discurso, problemático e perigoso, de estar fazendo isso em nome de uma democracia, de uma liberdade.

Supõe-se que ele se assume como o responsável pela condução de um país. Ele tem essa sensação de que está fazendo isso como uma forma de proteção, quando fala da internet e das redes sociais. Como se o povo precisasse de um ministro para ensiná-lo a ser democrático – passando por cima de parlamentares que tiveram votos expressivos.

Também acho interessante a maneira como o Elon Musk tem participado desse debate. O fato de o relatório ter sido divulgado pelo Congresso americano, e não exatamente por ele, foi uma estratégia muito boa.

Porque confere um cuidado institucional e formal. Não é simplesmente uma bravata dele, solta no X como se fosse um CPF fazendo isso. Ele se utilizou da força institucional de um país que defende a liberdade de expressão – até para proteger os funcionários do X no Brasil desses arroubos autoritários do Alexandre de Moraes.

Isso mostra que o Elon Musk tem interesses comerciais no Brasil, mas também quer protagonizar um debate sobre liberdade de expressão.

Obviamente, não preciso concordar com todas as ideias que o Musk possa representar. Mas, com relação a esse posicionamento, me pareceu que ele foi bastante esperto. Fez a leitura correta de certas ameaças que o ministro havia feito contra o X e soube se valer de uma costura, de uma estratégia institucional.

Isso tudo pegou muito mal para o Alexandre de Moraes, o que vai radicalizar ainda mais os posicionamentos aqui no Brasil. Também vai escancarar o fato de que o Lula hoje não precisa governar com o Congresso. Ele governa justamente com o Judiciário, uma força política cada vez mais manifesta.

E, por mais que existam essas perseguições aos conservadores e à direita, acho que se abriu uma possibilidade de defesa não exatamente de um posicionamento ideológico, mas da liberdade de expressão mesmo.

Hoje não há mais direita e esquerda. Você tem aqueles que defendem a liberdade de expressão, que estão interessados em debater esse assunto. E aqueles que defendem um autoritarismo em nome da democracia – e que pretendem, acima de tudo, domesticar a democracia.

Esse é um discurso que, em princípio, parece democrático. Mas que tende a castrar a democracia em nome do bem, de uma superioridade moral. Esse é o grande problema.

Todo esse autoritarismo fala em nome de uma proteção contra o discurso de ódio, contra as ameaças à ordem pública. E o Alexandre de Moraes se tonou um símbolo dessa narrativa.

Paulo Polzonoff Jr.

O relatório só prova o que todos sabíamos: Alexandre de Moraes usou a censura para beneficiar Lula no processo eleitoral de 2022.

No mundo ideal, isso provocaria não só a queda do ministro como também levaria a um debate profundo e necessário sobre a legitimidade questionável de Lula como presidente. Mas não vivemos no mundo ideal.

Vivemos no Brasil e aqui, como diz o clichê, tudo pode acontecer, inclusive nada. Me preocupa um pouco a empolgação (totalmente justificável!) das pessoas com o documento.

Também torço para que o relatório tenha consequências, claro. Mas por enquanto qualquer prognóstico que se faça ficará no âmbito do desejo.

O meu desejo, e o desejo de milhões de brasileiros, é o de que Alexandre de Moraes e seus cúmplices no STF sejam jogados na lata de lixo da História e que eu possa dizer com todas as letras que Lula é presidente ilegítimo e as eleições foram fraudadas não nas urnas, e sim no TSE.

Mas, repetindo, por enquanto isso é apenas um desejo.

J.R. Guzzo

O que mais chama a atenção, neste temporal levantado pela Câmara dos Estados Unidos em torno da censura no Brasil, não é, na verdade, a humilhação mundial para o atual regime em vigor por aqui – onde o Supremo Tribunal Federal, logo ele, é exposto à comunidade das nações como o maior violador da Constituição e das leis brasileiras.

O extraordinário, mesmo, é que quase toda a mídia esteja contra Elon Musk, que detonou o assunto todo, contra a Câmara americana, contra a liberdade de expressão e a favor da censura.

Com exceção da Gazeta do Povo, que desde o começo vem tratando o tema no topo do seu noticiário, da revista Oeste e do trabalho individual de jornalistas independentes nos espaços que têm na imprensa, os veículos de comunicação demonstram, basicamente, dois tipos de atitude.

O primeiro é atacar Musk, os deputados americanos e quem se coloca contra a censura; sustentam que a mordaça, travestida de regulamentação das redes sociais, é essencial para a democracia.

O segundo é acreditar que a questão vai desaparecer se a mídia não informar o público sobre o que está acontecendo. O que se tem, em qualquer um dos casos, é uma imprensa inimiga da liberdade de imprensa.

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