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Fachada do prédio do Google em Mountain View | Ben NuttallFlickr
Fachada do prédio do Google em Mountain View| Foto: Ben NuttallFlickr

Com o chefe do Facebook, Mark Zuckerberg, sendo questionado pelo Congresso americano sobre as práticas de coleta de dados de sua empresa, especialistas em privacidade estão se perguntando: por que o Google ficou de fora deste debate? 

Motores de busca, smartphones e a própria navegação na web coletam mais dados e monitoram a vida dos seus usuários de uma maneira que o Facebook só poderia sonhar. O Google sabe os sites em que eles navegaram, quais lugares visitaram e muitas (senão todas) de suas pesquisas, eventos de calendários, documentos e e-mails. 

Mas na tempestade sobre privacidade que surgiu com o escândalo da Cambridge Analytica e do Facebook, o Google saiu praticamente ileso. Os executivos da companhia foram convidados a testemunhar sobre o uso e abuso de dados, mas o comitê do Senado retirou o pedido e a empresa foi mencionada com moderação durante as várias horas de interrogatório pelo qual passou Zuckerberg.

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A elite da tecnologia dos Estados Unidos, entretanto, guarda em silêncio o medo de que a atenção que está sendo dada ao vazamento de dados dos usuários do facebook reflita sobre todos eles — em especial sobre o Google. Tais temores podem ameaçar a invencibilidade do gigante da tecnologia. 

A empresa dona do Google, Alphabet, administra o mecanismo de busca mais popular do mundo, o software Android que está instalado em milhões de smartphones, o navegador Chrome, o YouTube e o serviço de e-mail Gmail — o que dá à companhia acesso sem precedentes a detalhes sobre a vida diária de seus usuários. 

O Google e o Facebook compartilham um duopólio de longa data que domina a publicidade online. E o Google não mostra sinais de desaceleração: ele já é considerado um líder no desenvolvimento de veículos autônomos (Waymo), dispositivos inteligentes (Nest) e inteligência artificial (através do Google e DeepMind), e todas essas empresas precisam de dados dos usuários para prosperar. 

"O Google realmente tem uma pegada muito maior quando se trata de rastrear a vida diária de bilhões de pessoas", disse Wolfie Christl, pesquisadora de privacidade da organização sem fins lucrativos Cracked Labs, que escreve sobre big data e direito digital. "E muitas vezes é uma informação muito invasiva e muito sensível. Muitas pessoas pesquisam no Google o que elas não contariam nem a seus parceiros". 

Andrea Faville, porta-voz do Google, disse que a empresa permite que os usuários saibam quais dados são coletados e como eles são usados e controlem quais dados poderão ser compartilhados. As políticas da empresa proíbem comportamentos enganosos e uso indevido de dados pessoais, segundo Faville. "Se encontrarmos evidências de violações, tomaremos medidas. O Google está completamente focado em proteger os dados de nossos usuários enquanto faz com que os produtos que eles amam funcionem da melhor forma para eles”. 

As diferenças entre Google e Facebook 

Até agora, o Google não foi relacionado ao grande escândalo do Facebook, em que a empresa de consultoria política Cambridge Analytica explorou as políticas de privacidade da rede social para coletar indevidamente os dados pessoais de até 87 milhões de usuários, principalmente nos EUA. 

Como o Facebook, no entanto, a enorme rede de publicidade do Google foi usada por fontes russas para espalhar desinformação durante a eleição de 2016. E alguns dos mais recentes choques de privacidade surgiram de regras imprecisas que ambas as empresas permitiram. 

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Usuários do Facebook que baixaram seus dados de serviço no mês passado ficaram surpresos ao encontrar registros de "metadados" de suas mensagens de texto e telefonemas, incluindo nomes e números de telefone. A coleta destes dados só foi possível porque os usuários do Android concordaram, talvez inconscientemente, em compartilhar seus detalhes de chamadas e mensagens quando instalaram o aplicativo móvel do Facebook. 

Desde então, o Google mudou a maneira como os aplicativos Android pedem permissão aos usuários para fazer chamadas e enviar mensagens, mas os apps ainda podem acessá-los. O sistema operacional da Apple para iPhone, o iOS, nunca permitiu que aplicativos de terceiros acessassem dados de chamadas. 

“Por um lado, parece que o Google simplesmente fez um trabalho melhor ao gerenciar os dados que possui e para garantir a proteção da privacidade. O que o Facebook refletiu em alguma incompetência", disse Brian Wieser, analista sênior do Pivotal Research Group. 

"Por outro lado, acho que a indignação do consumidor é porque o episódio de Cambridge Analytica está destacando os medos mais latentes dos consumidores sobre como seus dados podem ser usados contra eles mesmos. Nesse sentido, o Google não é muito melhor”. 

Então, por que o Facebook é o único na berlinda? Segundo o Scott Steinberg, co-fundador da organização Data Does Good (Dados promovem o Bem, em tradução livre), a conversa pública sobre privacidade de dados é aleatória e dominada por reportagens investigativas, como o episódio de Cambridge Analytica. O Google, segundo Steinberg, não está no centro das críticas simplesmente porque ele tem sido melhor em evitar esse tipo de escândalo

Chris Sperandio, diretor de privacidade da consultoria de marketing Segment, acredita que há uma grande diferença na maneira como as duas empresas recolhem e usam os dados dos seus usuários. Os anunciantes do Facebook têm segmentado os usuários com base em palpites, construídos a partir de seus perfis, interesses e outros detalhes, mas também usam informações demográficas e de despesas, que são vendidas ou compartilhadas por “corretores de dados” e outras fontes de terceiros. 

"Quando você usa o Google, você está quase sempre sinalizando alguma intenção direta - seja uma busca por um produto ou um lugar ou qualquer outra coisa", disse Sperandio. As pessoas "querem dar dados às empresas em troca de excelentes serviços e experiências. Eles não querem fazer isso em troca de ‘fofocas de dados’ que estão acontecendo nos bastidores da plataforma”. 

Como o Google coleta seus dados 

O Google destaca em sua página de privacidade que reúne uma tonelada de dados sobre seus usuários, separados em três categorias: as "coisas que você faz", como o que você procura, quais sites e vídeos você olhou, onde você foi; as "coisas que você cria", como seus e-mails, contatos, eventos do calendário, fotos e documentos; e as "coisas que fazem de você, você mesmo", como nome, aniversário, endereço de e-mail e número de telefone que você deu ao criar uma conta Google. 

Mas as formas pelas quais o Google coleta dados nem sempre são tão óbvias. Em 2017, a empresa apontou preocupações com privacidade quando disse que começaria a medir o desempenho real de seus anúncios online, trabalhando com empresas não reveladas que tinham acesso a 70% das transações com cartões de crédito e débito nos EUA. 

Os usuários, de forma justa ou injusta, dizem que tendem a confiar mais no Google do que no Facebook. Uma pesquisa da Axios/SurveyMonkey com milhares de adultos americanos no mês passado descobriu que o favoritismo do Google era de 78%, batendo o Facebook (48%) com folga. 

Especialistas em privacidade disseram que as práticas e controles de dados do Google são mais avançados, mais detalhados e mais simples de usar do que os do Facebook. O gigante das buscas facilita a exclusão de partes de seus dados do site, como o histórico de localização, e notifica regularmente os usuários sobre quais dados estão abertos a empresas externas. O Facebook anunciou no mês passado que planeja melhorar seus controles de dados e tornar suas configurações de privacidade mais fáceis de encontrar.

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Google será arrastado para a polêmica? 

Mas não está claro por quanto tempo o Google poderá ficar de fora da sombra que o escândalo da Cambridge Analytica colocou sobre o Facebook. O chefe-executivo da Apple, Tim Cook, recentemente dirigiu críticas ao Facebook que poderiam ser aplicadas com facilidade ao gigante das buscas. "Para mim, é assustador quando olho para algo e, de repente, ele está me perseguindo por toda a web", disse ele em recente entrevista à MSNBC. 

Especialistas dizem que o Google tem uma coisa a seu favor: ao contrário do movimento #DeleteFacebook, não há uma maneira fácil de não usar o abrangente mecanismo de busca de uma vez por todas - o Facebook diz que eles não estão vendo muitas pessoas encerrando suas contas de qualquer maneira. 

"Ambos nos conhecem melhor do que nossos colegas de trabalho ou pessoas de nossa família", disse Charla Griffy-Brown, professora de sistemas da informação da Escola de Negócios da Universidade Pepperdine. "Tudo se resume em confiança".

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