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Com o prólogo de “Breaking Bad”, Gilligan fez história ao entregar um spin-off tão bom quanto o original
Com o prólogo de “Breaking Bad”, Gilligan fez história ao entregar um spin-off tão bom quanto o original| Foto: Michele K.Short/AMC/Sony Pictures Television

Agora que ‘Better Call Saul’ encerrou sua sexta e última temporada, na noite da última segunda-feira (22), com um excelente final, pode-se dizer que Vince Gilligan conseguiu o que poucos criadores de televisão conseguiram — se é que algum conseguiu —: lançou uma das maiores séries de todos os tempos, depois sustentou um spin-off que é digno de seu antecessor.

Há uma longa lista de sitcoms entre os anos 1970 e 1990 que se originaram de uma série de sucesso e tiveram seus próprios enredos bem-sucedidos: (‘Dias Felizes’/’Laverne & Shirley’; ‘Tudo em Família’/’The Jeffersons’; ‘Cheers’/’Frasier’). Mas, nesses casos, bastava pegar personagens de um programa e colocá-los em um ambiente diferente para criar um novo conjunto de cenários cômicos.

O feito extraordinário de Gilligan é de uma ordem de magnitude mais impressionante.

Breaking Bad’ é, sem dúvida, a maior série dramática já feita para TV. As pessoas podem argumentar a favor de vários outros enredos, mas o que sela a questão para mim é o fato de que não apenas o programa foi incrível (atuação incrível, personagens, mistura de ação, suspense, comédia, drama e cinematografia criativa), como foi consistentemente bom.

Muitas séries são ótimas por uma ou duas temporadas, mas perdem o fôlego bem antes de chegarem ao seu ponto alto. ‘Breaking Bad’ começou em um ritmo vertiginoso, ganhou força à medida que avançava, continuou melhorando e entregando surpresas, e terminou com uma temporada eletrizante conduzida a uma conclusão satisfatória.

Gilligan já merecia estar no panteão dos grandes nomes da televisão por seu trabalho na criação, escrita e produção de ‘Breaking Bad’.

Quando ouvi pela primeira vez a respeito dos planos para uma série centrada no advogado Saul Goodman, fiquei cético. Ele era um personagem recorrente e importante em ‘Breaking Bad’, mas não um dos personagens centrais, e muitas vezes servia de alívio cômico. Quanto eles realmente poderiam extrair do personagem? Seria como David Chase, depois de encerrar ‘The Sopranos’, decidir fazer uma nova série sobre Hesh construindo seu negócio de agiotas.

E, no entanto, eles deram um jeito.

Juntamente com Peter Gould (que escreveu o episódio de ‘Breaking Bad’ que apresentou o personagem de Saul Goodman), Gilligan conseguiu montar seis temporadas de uma série que também se fortaleceu e chegou a uma conclusão satisfatória.

O programa serviu principalmente como um prólogo de ‘Breaking Bad’, mas também como uma sequência. Ele teve muitas aparições e enredos que se cruzaram com personagens do original, mas também criou novos personagens dinâmicos, liderados pelo interesse amoroso de Saul e eventual parceira no crime, a advogada Kim Wexler. Dois dos personagens principais de ‘Better Call Saul’ (Ignacio “Nacho” Varga e Lalo Salamanca) foram literalmente criados a partir de uma fala de dois segundos da segunda temporada de ‘Breaking Bad’. O show incluiu fan services e participações especiais de personagens de ‘Breaking Bad’ apenas para ser divertido, sem parecer forçado ou distrair os pontos principais da trama.

Better Call Saul’ alcançou emoções que nunca se poderia prever com base no que sabíamos de Saul antes de a série começar. Também conseguiu explorar ainda mais o tema do que faz as pessoas com tremendo potencial lutem tanto com as tentações do lado sombrio. Não é apenas a história de como Saul “chutou o balde” [N/E: a expressão em inglês “breaking bad” é equivalente à expressão “chutando o balde” em português], mas também de Kim e do ex-policial corrupto Mike Ehrmantraut.

[Nota: se você não assistiu às séries, pare de ler aqui, pois haverá spoilers.]

Enquanto ‘Breaking Bad’ terminou com um tiroteio dramático, a principal sequência de ação do final de ‘Better Call Saul’ (uma perseguição policial) terminou nos minutos iniciais do show. Muito do que se segue acaba sendo negociações legais sobre a punição de Saul. Dentro disso, no entanto, há muito drama e suspense.

A pergunta que permeou grande parte do episódio foi: Saul tem um último truque na manga para se safar de tudo? Por um tempo, parece que sim, enquanto ele consegue convencer os promotores federais do que poderiam ser várias sentenças de prisão perpétua, para meros sete anos em uma prisão estilo clube de campo.

Em certo ponto, o público fica se perguntando se ele iria trair Kim no final para que ele pudesse fazer um acordo ainda mais brando.

E, no entanto, logo descobrimos que seu verdadeiro objetivo era levar Kim de volta a Albuquerque para ouvi-lo confessar completamente sua culpa por ajudar Walter White na construção de seu império de metanfetamina. Isso acaba com todas as suas defesas e o envia para uma prisão muito mais dura por 86 anos.

Embora, à primeira vista, pareça irreal pensar que um advogado egoísta, mentiroso e intrigante faria isso consigo mesmo, o desfecho é, na verdade, consistente com o personagem complexo que os escritores vinham construindo há seis temporadas.

Na temporada anterior, Saul foi capaz de manipular uma senhora idosa para resolver um caso de ação coletiva que lhe daria uma grande recompensa para ele. Mas ele se sente culpado por seu esquema ter envolvido a alienação da senhora de todos os seus amigos em um lar de idosos, então ele aceita as consequências e o impacto financeiro significativo.

Em outro momento da série, quando ele humilha seu irmão manipulando arquivos legais, Saul está em casa impune. Até enxergar o irmão, um advogado brilhante, se devorando por dentro, momento no qual ele faz sua confissão — que eventualmente o leva a ser suspenso do negócio por um ano.

O final de ‘Better Call Saul’, portanto, pode não ser feliz. Mas certamente é apropriado. E marca um final impressionante para o universo do crime de Alburquerque de Vince Gilligan.

© National Review 2022. Publicado com permissão. Original em inglês.
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