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Mais de três décadas depois, Tom Cruise dá vida novamente ao piloto de caça Maverick, em Top Gun 2
Mais de três décadas depois, Tom Cruise dá vida novamente ao piloto de caça Maverick, em Top Gun 2| Foto: Reprodução YouTube

O filme Top Gun: Maverick não tirou o meu fôlego, principalmente por voar direto à Zona de Conforto. Seguindo à risca a fórmula de bilheteria dos anos 80 e servindo grandes nacos de nostalgia, Tom Cruise nos deu um filme que é, com orgulho e coragem, uma obra para papais e homens cinquentões. É um filme de ação com boa dose de eficiência e brigas empolgantes que te manda para casa pensando “Bem, era exatamente isso o que eu esperava”.

Esse esforço de agradar aos mais velhos até começa com uma música das antigas (“Danger Zone”, de Kenny Loggins), refrescando as informações da introdução do original de 1986, e reestabelecendo cenas tais como aquela em que o Maverick, com um sorriso tão brilhante que pode ser visto do espaço, acelera a motocicleta ao lado da pista de pouso e decolagem. Apesar de ter um dos créditos mais intrigantes do ano — “Música por Harold Faltermeyer, Lady Gaga e Hans Zimmer” —, o filme, com direção pouco arriscada de Joseph Kosinski, escolhido a dedo pelo Tom Cruise, não tenta mesclar estilos nem se adaptar ao século XXI. Na maior parte, eu aprovo; o filme não faz esforços embaraçosos para se distanciar do passado com aquela besteira de “Você é um dinossauro, James Bond, como ousa flertar com as mulheres?”. Ainda assim, não pude deixar de pensar no filme errado de 1986: De Volta às Aulas [com o comediante falecido Rodney Dangerfield]. Cruise é Rodney Dangerfield, mas não consegue ver a piada.

A ideia dele é: e se você puder simplesmente ignorar a realidade, voltar à sua velha escola e descobrir que todo mundo ainda está cantando as mesmas músicas de rock clássico que você amava quando tinha 22 anos? E se, em vez de ser enrugado e irrelevante, você ainda fosse o centro das atenções e todo mundo quisesse ir para a festa contigo, e falar contigo, e jogar futebol homoerótico sem camisa contigo na praia?

Tom Cruise agora tem idade para ser o avô de um piloto de caça, mas — para ser justo — como ele continuou fantasticamente em forma, pode ser que ele seja o único membro de carteirinha da Associação Americana de Aposentados que conseguiria representar esse papel. Ele vai fazer 60 anos em julho, mas continua (meio) garotão, ou ao menos ele continuava quatro anos atrás quando começaram as filmagens de Top Gun: Maverick.

A cada cena, você já sabe o que vai acontecer e está tudo bem. O primeiro filme não era interessante, chocante seria se este fosse. Desta vez, o objetivo é explodir uma usina de enriquecimento de urânio subterrânea em um país estrangeiro (não identificado!) e depois zarpar antes que os caças inimigos revidem. Qual é o país? Você que adivinhe. Para um filme que trata de coragem indomável, Top Gun: Maverick é cheio de dedos para não ofender qualquer mercado de além-mar, então a questão de quem é o inimigo é meio nebulosa. Não dá nem para dar uma boa olhada na cara dos bandidos ou ouvir que língua estão falando. O pavor de ofender alguém é o aspecto mais anos 2020 do filme.

A despeito de estar mais para lá do que para cá, o Maverick, que é chamado de volta à ativa no centro de treinamento Top Gun como instrutor de voo, claramente não vai ficar trabalhando na lousa por muito tempo. Vai ter um interesse amoroso magramente desenvolvido (desta vez com Jennifer Connelly, como uma bartender bonita da base de San Diego que ama velejar em alta velocidade e dirige um Porsche clássico), e nenhum outro personagem em torno do Maverick vai fazer muito mais do que enfatizar o quanto ele é fenomenal. Já que o Goose morreu, vai ter um filho do Goose (Miles Teller) com o mesmo bigode lamentável do pai, e um pouco de atrito para resolver, já que o Maverick meio que causou a morte do Goose, mas o Goose filho está mais chateado mesmo é porque o Maverick o tirou da Academia Naval. Eu fico excepcionalmente grato que, em hora nenhuma, Maverick e Goose filho repetem a cena da música “You’ve Lost That Lovin’ Feeling”.

[N. do T.: Nesta cena, Maverick e Goose vão a uma festa em que encontram Iceman, personagem de Val Kilmer, que é o antagonista. Ice provoca Maverick, eles se entreolham de perto, o que é um pouco homoerótico. Depois, tentando seduzir a mocinha Charlie (Kelly McGillis), Maverick canta desafinadamente essa música, cujo título em tradução livre é “Você Perdeu o Amor”. Ela, então, vai ao banheiro feminino... e ele a segue.]

Embora essa continuação tenha sido projetada com cuidado, não senti nenhuma empolgação ou suspense, e até as revelações são bem formulaicas (a mesma estratégia de puxar o tapete é usada duas vezes no ponto alto). Uma oportunidade perdida foi a construção rasa dos personagens subsidiários. O ego de Cruise como produtor parece fazer com que ele tenda a aceitar roteiros que sejam cheios de tagarelice sobre o quão maravilhoso é o personagem dele. Cruise chamou dois atores ótimos — Ed Harris, como um almirante enferrujado e Jon Hamm [de Mad Men] como um almirante enferrujado um pouco menos velho, que na verdade é mais novo que Cruise — e ambos são reduzidos a monitores que ficam soltando perdigotos sobre Maverick estar desobedecendo as regras de novo, ameaçando botá-lo de castigo, até por fim se curvarem à sua pura magnificência. O filme mais antigo — feito antes que Cruise tivesse o poder de guiar tudo a seu redor — tinha personagens coadjuvantes com muito mais substância, especialmente o Iceman de Val Kilmer. Ao menos Cruise teve a generosidade de dar uma cena meio supérflua para Kilmer na continuação, que leva em conta a triste condição debilitada do ator (depois de um câncer de garganta, Kilmer mal consegue falar).

O melhor piloto de caça do mundo ser Cruise é tão plausível quanto o melhor atacante do mundo ter a idade dele, mas tanto faz! Cruise ainda é Cruise. Ele faz o que ele pode, e o que ele pode é ser o herói americano. Pode-se dizer que ele faz isso melhor ou ao menos com mais longevidade do que qualquer outra estrela da história de Hollywood. Além disso, a autoglorificação de Cruise é uma lisonja a todos nós: subconscientemente, ele nos faz sentir mais novos. Se ele ainda tem uma aparência quase tão boa quanto a que tinha 30 anos atrás, talvez o resto de nós também tenha?

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Kyle Smith é membro do National Review Institute e crítico-mor do National Review.

©2022 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

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