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Obra de Georgina de Albuquerque, de 1922, mostra Leopoldina com o Conselho de Estado
Obra de Georgina de Albuquerque, de 1922, mostra Leopoldina com o Conselho de Estado| Foto: Reprodução

Dom Pedro I tomou a decisão de declarar a Independência assim que recebeu três cartas, entregues a ele na tarde de 7 de setembro de 1822 por Paulo Bregaro, oficial do Supremo Tribunal Militar, e pelo major Antônio Ramos Cordeiro. Os dois haviam partido do Rio de Janeiro cinco dias antes e haviam viajado a cavalo praticamente sem parar.

Uma carta era do ministro José Bonifácio, que naquele momento era o político de maior influência sobre o regente. “Senhor, o dado está lançado e de Portugal não temos a esperar senão escravidão e horrores”, escreveu. A outra havia sido emitida por Henry Chamberlain, cônsul britânico no Rio de Janeiro, que atualizava o destinatário dos debates políticos em Portugal, onde parecia claro que o filho do rei Dom João VI estava para ser afastado de suas funções no Brasil.

A segunda carta era de Leopoldine Caroline Josepha von Habsburg-Lothringen, que no Brasil ficou conhecida como Maria Leopoldina. Era esposa de Pedro e, durante a viagem do marido a São Paulo, havia assumido o posto de chefe do Conselho de Estado e Princesa Regente Interina do Brasil. “Pedro, o Brasil está como um vulcão”, ela escreveu. “Até no paço há revolucionários. Até oficiais das tropas são revolucionários. As Cortes Portuguesas ordenam vossa partida imediata, ameaçam-vos e humilham-vos. O Conselho de Estado aconselha-vos para ficar. Meu coração de mulher e de esposa prevê desgraças, se partirmos agora para Lisboa”.

E prosseguia: “O Brasil será em vossas mãos um grande país. O Brasil vos quer para seu monarca. Com o vosso apoio ou sem o vosso apoio ele fará a sua separação. O pomo está maduro, colhei-o já, senão apodrece. Ainda é tempo de ouvirdes o conselho de um sábio que conheceu todas as cortes da Europa, que, além de vosso ministro fiel, é o maior de vossos amigos. Ouvi o conselho de vosso ministro, se não quiserdes ouvir o de vossa amiga. Pedro, o momento é o mais importante de vossa vida. Já dissestes aqui o que ireis fazer em São Paulo. Fazei, pois. Tereis o apoio do Brasil inteiro e, contra a vontade do povo brasileiro, os soldados portugueses que aqui estão nada podem fazer”.

Foi quando Pedro proclamou que o Brasil deixava, a partir daquele momento, de manter qualquer vínculo com Portugal. E Leopoldina se tornava a primeira imperatriz do Brasil.

“Verdadeiro paraíso” 

Pedro tinha bons motivos para confiar na esposa. Nascida a 22 de janeiro de 1797 no palácio Hofburg, em Viena, ela pertencia a uma família nobre que fazia parte de uma das dinastias mais tradicionais e poderosas da Europa, que estava no poder na Áustria desde o distante ano de 1282 e assim se manteria até o final da Primeira Guerra Mundial, em 1918.

Foi sobrinha neta de Maria Antonieta, a última rainha da França, morta em 1793. Sua irmã mais velha, Maria Luísa, era desde 1810 a segunda esposa de Napoleão Bonaparte. Conhecia pessoalmente o poeta Johann Wolfgang von Goethe. Habituada a ouvir composições de nomes do porte de Joseph Haydn e de Ludwig van Beethoven, desenhava, pintava e tocava piano. Mas seu maior interesse estava nas ciências naturais, em especial botânica e mineralogia. “Uma semana antes de partir para o Brasil, teve ainda Leopoldina uma agradável surpresa. Num envoltório de papel, cuidadosamente amarrado, enviava-lhe Goethe uma poesia”, relata Roselis von Sass na biografia Leopoldina: uma Vida pela Independência.

“Falava quatro línguas; certamente dentro em breve estaria conhecendo bem o idioma português. Tocava violino e piano”, descreve a biógrafa. “Música e botânica eram as suas ocupações prediletas, principalmente a botânica. Das suas viagens e excursões trazia cestas cheias de plantas exóticas que aproveitava para pintar. As paredes dos seus aposentos no paço viviam cheias de pinturas e de desenhos de história natural. Teria sido com muito maior prazer naturalista do que princesa”.

Além de uma possível consultora culta e bem informada, Leopoldina era uma noiva de grande interesse para um pretendente como Pedro, que era naquele momento herdeiro do trono do Reino Unido de Portugal, Brasil e Algarve e poderia se beneficiar do vínculo com a dinastia Habsburgo. O casamento se deu por procuração, em Viena, a 13 de maio de 1817. O arquiduque Carlos, tio de Leopoldina, representou Pedro na cerimônia. O casal só se conheceu pessoalmente em novembro, quando ela chegou ao Rio de Janeiro. Ela tinha 20 anos, ele 19.

Leopoldina gostou do que viu. Escreveu à família: “O Brasil é um verdadeiro paraíso, há uma incontável quantidade de plantas, arbustos e árvores, especialmente espécies de palmeiras que nunca havia visto nem em estufa; estou colecionando pássaros”. Quando ao marido, escreveu: “não é apenas lindo, mas também bom e compreensivo”. Por outro lado, reparou: “O caráter do meu marido é extremamente exaltado. Só poso continuar observando e ficar chorando em silêncio”.

Leopoldina e Pedro passeavam a cavalo pela floresta da Tijuca, e ela o acompanhava em reuniões ministeriais. Mas, com o passar dos anos, as atividades junto ao marido começaram a ficar reduzidas, na medida em que uma sequência de gravidezes se sucedia.

Foram sete herdeiros: Maria da Glória (que, em 1833, aos 15 anos, assumiria o trono de Portugal), Miguel (morto ao nascer), João Carlos (que morreu com 11 meses de vida), Januária Maria Carlota (1822-1901), Paula Mariana (1823-1833), Francisca Carolina Joana (1824-1898) e, por fim, Pedro de Alcântara, o futuro Dom Pedro II, nascido em 1825 e morto em 1891.

Morte precoce 

A partir de 1823, na medida em que Pedro I se mostrava cada vez mais interessado nas aventuras extraconjungais e mais espaço dava a Domitila de Castro, que passou a viver como dama de honra da própria rainha, Leopoldina e Pedro se afastaram, tanto em seu relacionamento quanto na parceria política.

Há suspeitas de que, além de humilhada pela convivência forçada com a amante principal do marido, ela tenha, com alguma frequência sido agredida fisicamente por Pedro, que também cortou a mesada a que ela tinha direito – Leopoldina se mostrava financeiramente pressionada, a ponto de depender de um agiota alemão chamado Jorge Antonio von Schäffer.

A imperatriz morreria a 11 de dezembro de 1826, semanas antes de completar 29 anos, logo após sofrer um aborto espontâneo daquele que seria seu oitavo filho. Estava deprimida e maltratada, constantemente doente e isolada na própria corte.

Dias antes de morrer, escrevera uma carta à irmã: “Há quase quatro anos, minha adorada mana, como a ti tenho escrito, por amor de um monstro sedutor me vejo reduzida ao estado da maior escravidão e totalmente esquecida pelo meu adorado Pedro. Ultimamente, acabou de dar-me a última prova de seu total esquecimento a meu respeito, maltratando-me na presença daquela mesma que é a causa de todas as minhas desgraças. Muito e muito tinha a dizer-te, mas faltam-me forças para me lembrar de tão horroroso atentado que será sem dúvida a causa da minha morte”.

Além da suspeita, provocada pela carta, de que uma agressão de Pedro tenha desencadeado sua crise final, uma parcela da população culpou Domitila pela morte. A casa da amante em São Cristóvão foi apedrejada e seu cunhado, camareiro da imperatriz, foi atacado com dois tiros.

O corpo de Leopoldina repousa num sarcófago de granito verde, na Capela Imperial, sob o Monumento do Ipiranga, em São Paulo (SP). Em sua biografia, ela deixou um legado expressivo: a participação importante durante a independência e a maternidade de uma rainha portuguesa e um rei brasileiro.

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