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 | Edilson RodriguesAgência Senado
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Certa vez, conversando com um amigo ativista da causa libertária, ele me perguntava o motivo de o Brasil continuar apostando num modelo estatista de política e economia mesmo sendo racional e historicamente provado que o centralismo administrativo tende sempre ao fracasso. Naquele instante não pude deixar de pensar em toda a nossa história enquanto nação, em como sempre fomos filhos de protecionismos e autoritarismos diversos. Filhos, aliás, de diversas práticas despóticas — em maior ou menor grau de crueldade — sem nunca de fato termos experimentado uma administração que tenha de fato priorizado a liberdade como princípio anterior ao do controle estatista.

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Entendendo a história para entender o problema 

Somos filhos de uma das monarquias absolutas mais duradouras da história; e antes de entendermos a república brasileira e suas aporias, deveríamos nos questionar sobre quais heranças trazemos da monarquia absolutista portuguesa. 

Uma das defesas utilizadas pelos monarcas portugueses ao fim do século XVIII, com o intuito de continuar com o protagonismo absolutista em suas mãos, foi manter a concentração de poder econômico e político centralizado na Corte. O centralismo, que de certa maneira somos doentiamente dependentes até hoje, não é fruto do acaso e nem de uma mania pura e simples de nosso povo; mas sim uma herança cultural arraigada e muito bem desenvolvida através da repetição da mesma mentalidade administrativa durante os séculos. Este centralismo português perdurou e fez com que, de certa maneira, os avanços filosóficos, políticos, tecnológicos e mercantis atrasassem Portugal frente as outras potências mundiais que emergiam com a nova estrutura sócio-política afrouxada do poder central. “No século VIII havia em Portugal muitos homens ilustrados, com plena consciência do descompasso do país em relação à Europa” (Antonio Paim, “História do liberalismo brasileiro”, 2018). E, nessa feita, também nós fomos conduzidos ao mesmo caminho português através das nossas ligações diretas. 

A saída encontrada pelos portugueses, de maneira primeva, foi conhecida como as Reformas Pombalinas, realizadas por Sebastião de Carvalho e Melo (1699 – 1782), o marquês de Pombal. A ideia da reforma era apresentar Portugal à modernidade científica e filosófica, trazer novos conceitos universitários ao bojo do país, assim como abolir o religiosismo dos jesuítas como método e fonte de ensino em Portugal. A partir desse fato, aconteceu o que depois ficou conhecido como “êxodo dos jesuítas”. 

No entanto, ao fim das reformas, viu-se que o marquês de Pombal, apesar das mudanças produzidas, nada tinha feito de eficaz a não ser mudar a tradição absolutista e religiosa, para uma tradição centralizadora e pseudocientífica. Na economia, Sebastião de Carvalho aderiu reacionariamente ao mercantilismo, o que causou em Portugal uma economia profundamente estatal; unida a isso, é claro, o centralismo político que se mantinha através das ditas reformas. Sobre o tema fala Antônio Paim, em “História do liberalismo brasileiro”:

A adesão de Pombal ao mercantilismo trouxe consequências perversas para a nossa história porquanto, admitindo a riqueza em mãos do Estado, eximiu-se de criticar a tradição precedente que combatia a riqueza em geral e o lucro. Essa circunstância acarretou que embora correspondesse ao início de uma nova tradição, nem de longe revogou ou abalou a antiga. A admissão da posse de riquezas em mãos do Estado passou a coexistir com a velha tradição, crescentemente dirigida contra o empresariado privado

A Coroa Portuguesa foi, por fim, uma das últimas nações a se renderem aos movimentos representativos de contrapesos políticos democráticos que remodelavam as nações na Europa ocidental. 

Tal movimento de modernização política e econômica veio principalmente da monarquia-parlamentarista inglesa, suscitada após o episódio que ficou conhecido como Glorious Revolution de 1688 (revolução inglesa contra o absolutismo); assim como dos philosophes das incontáveis revoltas do democratismo francês; os movimentos representativos democráticos tinham essas duas novas hastes filosóficas como bases dos fundamentos políticos modernos. Se faz citar que, Gertrude Himmelfarb, historiadora americana, também aponta o iluminismo dos Estados Unidos, advindo dos filósofos políticos americanos que preconizaram a revolução americana de 1776, como influenciadores desse processo de modernização filosófica e política no Ocidente. 

Tais impulsos de renovação das administrações governamentais e das compreensões filosóficas sobre política e economia eram anseios difundidos até mesmo entre os países tidos como tradicionalmente conservadores e fechados às mudanças estruturais; um exemplo disso foi a própria Inglaterra e Portugal.

Na Inglaterra, assim como posteriormente no Brasil, ainda que inicialmente surgissem na sociedade certos grupos em defesa do retorno à monarquia absoluta, não tardou para que até mesmo os tradicionalistas se rendessem às benesses do sistema representativo.

O absolutismo diluído

O absolutismo da monarquia portuguesa foi cedendo naturalmente à monarquia-parlamentarista — de moldes democráticos — já em voga em muitos países da Europa na primeira metade do século XVIII. Por vezes, é verdade, tal novo modo de fazer política era extremamente turvo nos países de tradição monacal mais vigorosa, em especial naqueles de tradição católica profundamente arraigada, como era o caso de Portugal. Todavia, certo foi que a monarquia absolutista portuguesa cedeu naturalmente até seu fim histórico com a Revolução do Porto em 1820; seguido da promulgação da primeira constituição portuguesa em 1822.

Não obstante, este absolutismo, por hora diluído, foi se materializando e continua a tocar-nos através dos centralismos políticos ainda recorrentes em nossas práticas republicanas; centralismos tais que nada mais são do que vestígios — ou até mesmo renovos políticos — dos absolutismos de outrora, agora encarnados nos Estados nacionais sob as peles das mais diversas ideologias modernas e personalismo parvos.

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Todavia, na modernidade, e isso é patente de se observar com clareza: o protagonismo do Estado vem substituir aquele protagonismo típico do Monarca em tempos de absolutismo. Da mesma forma, o sustentáculo religioso tradicional é substituído pelas teorias fantasmagóricas das ideologias moderna; tais ideologias, na modernidade, acabam por efetuar exatamente o mesmo papel da religião tradicional, em tempos medievais.

A ideologia é uma religião invertida, negando a doutrina cristã de salvação pela graça, após a morte, e pondo em seu lugar a salvação coletiva, aqui na Terra, por meio da revolução e da violência. A ideologia herda o fanatismo que, algumas vezes, afetou a fé religiosa e aplica a crença intolerante a preocupações seculares (Kirk Russel, “A política da prudência”, 2014, p. 95)

Tal característica histórica, enraizada desde as profundezas da cultura portuguesa e, obviamente, chegando até nós, esclarece de maneira quase que total as nossas insistências nas escolhas políticas autoritárias e protecionistas. Paim amarra sua reflexão dizendo: 

Em síntese, o marquês de Pombal cria uma segunda grande tradição na cultura brasileira, destinada, como a precedente, a uma longa vivência. Com a República [brasileira], os militares iriam apropriar-se da bandeira de que é incumbido ao Estado promover a riqueza, fazendo com que se perpetuasse até nossos dias essas reminiscências do mercantilismo do século XVIII. Data de Pombal, igualmente, o entendimento cientificista da ciência, que ainda se encontra presente na realidade brasileira (Antonio Paim, “História do liberalismo brasileiro”, 2018, p. 36)

Modernidade e tempos atuais

Passamos, após a independência de 7 de setembro de 1822, por épocas de dissensões quase que tribais em nossa nação então recentemente livre. Tais alvoroços foram causados pelas constantes revoluções e pseudorrevoluções ocorridas durante o Primeiro Reinado (1822 – 1831) e o tempo de regência, perdurando até o início do Segundo Reinado, em 1840. A partir do Segundo Reinado experimentamos verdadeiros mares calmos e crescente planos de avanços sociais e institucionais. Todavia, e isso devemos avaliar mais de perto, nunca tivemos a oportunidade de dizer que cultivamos uma verdadeira política liberal duradoura no país; ou seja, uma política gerencial que priorizasse a descentralização econômica e política, assim como que carregasse em seu bojo de sensatez administrativa a liberdade individual como adubo social para uma posteridade próspera, livre e perene. 

Trocando em poucas palavras, raramente experimentamos um liberalismo como modus operandi duradouro de um governo nacional. Por isso o assombro de liberais e conservadores ao se verem constantemente confrontados por socialistas a dizerem que o liberalismo fracassou no Brasil; fracassou em quê? No regime militar que brevemente flertou, na década de 1970, com a abertura industrial, para logo após retomar para as mãos do Estado o protagonismo econômico? Ou no governo Fernando Henrique Cardoso que também rapidamente usou da privatização como último antídoto possível? Aquilo que Mário Covas chamou de “choque de capitalismo”. O capitalismo figura sempre como a solução final nos fracassos das sociedades estatistas, o desfibrilador de qualquer Estado que adota o socialismo como modelo administrativo. 

Em suma, os governos nacionais sempre se mantiveram em contato direto com o estatismo; o motivo é óbvio: os poderes conferidos pelo Estado lhes davam a segurança de perpetuar e instrumentalizar seus egos e ideologias. 

Não obstante, maculada por corrupções e conchavos constituídos por de trás dos véus da proteção jurídica e, por vezes, dos apelos populares, a república constantemente se encontra sob mascaramentos que nunca rompem o ciclo vicioso do protecionismo acovardado. Insólitos foram os momentos onde a liberdade figurou como regra máxima em nossos governos, e quando isso ocorreu, sequer éramos república ainda.

O segundo reinado mantém-se como fato isolado em nossa história, quando vivemos sem golpes de Estado, estados de sítio, presos políticos, insurreições armadas, tudo isto com absoluta liberdade de imprensa, mantidas as garantias constitucionais dos cidadãos (Antonio Paim, “História do liberalismo brasileiro”, 2018, p. 150)

O momento mais expressivo de liberdades gerais que nosso país experimentou em seu seio público foi há mais de 100 anos, sob a monarquia parlamentarista, onde as oposições compreendiam melhor que nós — orgulhosos republicanos modernistas — as necessidades de ter a liberdade como motor de uma sociedade ordeira. 

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Sob esta perspectiva, e de maneira analítica e racional, devemos considerar a monarquia parlamentarista — constantemente pedida no país na contemporaneidade —, não como um sonho reacionário ou um fetiche medievalista, mas efetivamente como uma estratégia e anseio popular historicamente justificável frente aos constantes fracassos republicanos. Defender a monarquia parlamentarista, no Brasil, é o mesmo que defender o único modelo político-administrativo que funcionou de maneira satisfatória em solo nacional. Isto é: que operou para além das propagandas ideológicas e romances modernistas.

República, o Deus que falhou 

Após o golpe republicano, em 15 de novembro de 1889, o Brasil não diminuiu sua aporia histórica do estatismo. Para sermos mais exatos, pioramos e muito no quesito protecionismo e ações estatistas; iriamos atravessar, após a Proclamação da República, por tempos de autoritarismo diversos que perdurariam até os fins da década de 1980. Apesar dos ganhos esporádicos em questões de cunho democrático, tais ganhos tinham mais relação com os avanços éticos e políticos mundiais do que com qualquer visionarismo ético-institucional da República brasileira. Segundo Paim, a República brasileira assumiu claramente uma “feição autoritária e antiliberal”  (Antonio Paim, “História do liberalismo brasileiro”, 2018, p. 149). 

Enquanto avançávamos nos direitos basilares de um sistema pretensamente democrático — como na ampliação do sufrágio —, ainda mantínhamos o Estado como rédeas das liberdades reais dos indivíduos. No caso brasileiro, o Estado tornara-se o método indubitável de como se fazer política. 

De Deodoro da Fonseca até os dias atuais, vivemos uma espécie de variações de estatismos; nunca chegando efetivamente a um Estado liberal aos moldes democráticos sadios. República velha (1889 – 1930); passando pela era Vargas (1930 – 1945) — incluindo aqui o Estado Novo —; a República populista (1946 – 1964); o golpe de 1964 — seguido do regime militar (1964 – 1985); até a redemocratização (1985 – atual). Se fôssemos tornar o avanço histórico-político brasileiro uma reta crescente, era para termos superado o exemplo do Segundo Reinado, atualizado suas configurações, adequado às necessidades contemporâneas as suas instituições, e abolido a dependência quase que unilateral do indivíduo frente à administração estatal. O que, definitivamente, não ocorreu e parece estar bem longe de ocorrer.

Momentos políticos da modernidade brasileira

Três momentos distintos desta história republicana autoritária e protecionista se fazem destacar para melhor análise do estatismo na República: 

1- A era Vargas, com seu nacionalismo amorfo e egocêntrico, destacado magistralmente pelo intelectual e ex-diplomata brasileiro, José Osvaldo de Meira Penna (1917 – 2017) em seu livro A ideologia do século XX, é o tipo de discrição que se encaixa perfeitamente no ditador brasileiro, Getúlio Vargas (1882 – 1954). O termo que acima utilizei: “amorfo” e “egocêntrico” é explanado e justificado pelo intelectual:

Em suma, [Getúlio Vargas era] cínico como pensam alguns, não mantinha compromisso com qualquer ideia ou programa. Navegava com a corrente que soberbamente sabia desviar para manter á tona o barco de sua ambição irresistível. Não revelando qualquer fé religiosa ou qualquer convicção moral ou doutrinária, mesmo em que pese seu suposto comtismo, era também imune a qualquer simpatia ou antipatia de política concreta: democracia, liberalismo, fascismo, comunismo, socialismo, etc. — que determinasse, a priori, uma linha de ação, tanto no âmbito interno quanto no da política externa (J. O. de Meira Penna, “A ideologia do século XX: Ensaios sobre o nacional-socialismo, o marxismo, o terceiro-mundismo e a ideologia brasileira, 2017, p. 178)

O autoritarismo de Vargas é simplesmente um reflexo de seu próprio personalismo doentio. O Estado acabou sendo uma projeção de seu ego na máquina governamental, fazendo do maquinário institucional uma espécie de personificação de suas vontades. Algo próximo do que Ludwig Feuerbach, por exemplo, afirmou ser a religião frente ao homem, isto é: uma projeção da consciência perfectível do humem no próprio homem. Não seria abuso dizer, para completar a ideia de Penna, que a religião de Vargas era o seu próprio ego encarnado no Estado. 

2- O regime militar, que acentuou largamente as práticas de autoritarismo político em território nacional, flertou brevemente com a abertura de mercado principalmente na década de 1970; época denominada de “o milagre econômico da Ditadura Militar”. Não obstante, como é costume dos regimes militares, não tardou para que o Estado colocasse novamente as suas garras na economia e afundassem-nas ainda mais nas liberdades políticas individuais. Nossa história, aliás, mostra o quão tolo é aquele indivíduo que pensa ser a liberdade econômica desvinculada da liberdade política. 

O protecionismo crescia cada dia mais, as estatais tornaram-se o modus operandi da economia nacional ao ponto de ser um social-democrata — Fernando Henrique Cardoso — o grande estopim das privatizações após tal era. A indústria, no fim da era militar, ainda era muito vigorosa por conta dos reflexos da abertura já citada da década de 1970; não obstante, já iniciava ali seu mergulho vertiginoso no parâmetro econômico nacional, tal mergulho perdura ainda hoje com idas e vindas constantes. 

3- A economia estatal tem uma característica largamente conhecida dos economistas liberais, que se trata do crescimento quase que exponencial através da irrigação da economia nacional com dinheiro público, fazendo com que os mostradores econômicos cresçam e gerem uma sensação de segurança monetária. Todavia, como hoje se percebe após a era PT (2003 – 2016), tal modo de fazer economia através do protagonismo do Estado não passa de maquiagens econômicas que não tardam em mostrar suas feiuras costumeiras. 

Se trata, em suma, de requentar a economia nacional com os investimentos do tesouro nacional, sem ter como via de reposição, todavia, os investimentos proporcionais de capitais externos e da livre-iniciativa nacional. Com essa conta faltante, é inevitável que o país decresça e constantemente viva eras de crises econômicas acentuadas; seguidas de respiros econômicos momentâneos e leve crescimento; sucedido após isso, no entanto, de novos afogamentos econômicos e por vezes também políticos. 

Tal ciclo é largamente conhecido e, no Brasil, cansativamente repetido; não sendo necessário mais que uma geração para ver tal sequência mais de uma vez. E, como se a desgraça faltasse, ainda temos o parasita imoral da corrupção sistêmica que só faz acentuar as crises e decréscimos sociais e econômicos da nação.

O problema

No fundo, nós nutrimos através de um behaviorismo social, isto é: através de repetições incansáveis, um modo de ser sociedade altamente dependente do Estado, uma submissão consentida e, não raro, defendida por nós mesmos. Cultivamos, em nossas práticas a crenças políticas, a ideia de que o Estado deve nos gerir e fazer por nós coisas que naturalmente deveríamos tomar como nossos deveres básicos, por exemplo, a autodefesa e a defesa dos nossos familiares quando possível. 

A dinâmica da política moderna, assegurada e difundida por homens como: Wilhelm Von Humboldt, Ludwig Von Mises, Friedrich von Hayek, Murray Rothbard, Leo Strauss, Raymond Aron, entre outros, é o princípio de que: quanto mais funções e aberturas o Estado tiver para ser protagonista da política num país, menos liberdades o indivíduo de fato experimentará. Tal psicologia de dependentes, aquilo que Ortega Y Gasset e Gustave Le Bon chamavam de “massificação” ou “consciência de massa”, impede que a política brasileira avance para além dos muros da vontade estatal ou do personalismo populista.

O Povo é quem modela o Estado e não o contrário

A democracia afirma, em seu cerne, que o poder dela imanado é embrionariamente descentralizado; ou seja, que não vem de nenhuma estrutura oficial, de nenhuma massa política ou social, mas sim dos indivíduos-cidadãos que livremente unidos forjam em seu seio comunal o que popularmente denominamos de POVO. Se o poder democrático de uma sociedade advém do povo — e de fato vem —, então esse Povo torna-se uma entidade social muito além de um mero aglomerado social, assim como muito anterior a quaisquer instrumentos administrativos da própria sociedade. O Povo é muito mais que um Estado; o Estado que, por sua vez, nada mais é que um instrumento desse mesmo Povo e não a sua encarnação ou invólucro. 

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O Povo é, em suma, a soma real dos indivíduos livres e mentalmente sãos que compõe uma nação livre e soberana. E dessa soma de indivíduos livres e mentalmente sãos se forma tal colosso oficial — o Povo — que pode e deve atuar para balancear e balizar os poderes do Leviatã. Se remontarmos a estrutura social, por fim, veríamos o seguinte plano disposto: Indivíduo>Família>Povo>Sociedade organizada > Instrumentos estatais

A solução

O povo (soma dos indivíduos) é o único capaz de superar as atitudes absolutistas do Estado, e para isso necessário se faz uma remodelagem da cultura na qual atualmente somos meros espectadores e servos. Uma passagem de consciência submissa para uma mentalidade autônoma; de uma consciência dependente para uma mentalidade prudente e responsável. Esta é a condição para mudar tal cenário de conformidade débil. 

Veja, não se trata aqui de revoluções aos moldes franceses de imposições ideológicas, por via de força, conhecido historicamente como democratismo; ou também ao modelo marxista de tomada do poder central via ditadura do proletariado. 

A proposta se faz num remodelamento social que parte do indivíduo, no intuito nobre e indispensável de reformular a sociedade a partir das atitudes pessoais e familiares responsáveis; a única maneira verdadeiramente legítima de se fazer mudanças sociais reais sem quaisquer tipos imposições e violências ditatoriais. As famílias e os indivíduos são os dois pilares primevos de qualquer sociedade humana, por isso é necessário a atuação de ambos para que a reformulação da mentalidade social não seja uma revolução que coloque em risco os próprios pilares basilares da sociedade na qual vivemos; do contrário, que seja verdadeiramente um revigoramento, um processo natural que torne sensatas as instituições políticas frente aos princípios congênitos de quaisquer corpos sociais. 

Sem a mudança de consciência individual — que em sua soma forma a consciência do povo — não se sanará a patologia de nossa cultura submissa, personalista e autoritária. Tal dependência dos poderes centrais nos impossibilita até mesmo de imaginar novas configurações de Estados. Para um peixe de aquário, o mar é um absurdo. 

É justamente neste campo arenoso que surge o papel do “empresário”, para Ortega Y Gasset: “Na gênese de todo Estado, sempre vemos ou entrevemos o perfil de um grande empresário” (José Ortega y Gasset, “A rebelião das massas”, 2016, p. 236). O termo empresário, aqui utilizado por Ortega Y Gasset, não tem o sentido jurídico-econômico de investidor e explorador mercantil da sociedade; mas sim aquele que prevê um empreendimento necessário para a comunidade, aquele que toma para si a tarefa laboriosa de constituir no corpo social as mudanças indispensáveis frente uma realidade atrasada, poluta ou imoral.

Para o constituir de um novo conceito de Estado, afirma Ortega Y Gasset: 

Não há criação estatal quando a mente de certos povos não é capaz de abandonar a estrutura tradicional de uma forma de conveniência e, além disso, de imaginar outra que nunca existiu.

Conclusão

O Estatismo, por fim, é uma espécie de dependência consentida, o brasileiro parece querer o Estado para tomar conta de suas vidas para além das funções pré-determinadas a esses instrumentos. E o pior: sequer consegue imaginar uma forma diferente de viver que não seja eternamente sob a tutela sufocante das patas do poder central. Enquanto tal arranjo cultural não for superado, dificilmente a liberdade será uma pauta para lá das verborragias acadêmicas e políticas sem sentido. Na política, liberdade com Estado inchado deveria soar ilógico. 

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Enquanto os indivíduos e as famílias não entenderem que as suas consciências de servos que devem mudar para o modo Senhor — deixando assim o modo vassalo para os instrumentos da sociedade —, manteremos essa sina consentida; nos contentaremos em ser eternos adolescentes domados. Ou seja, aqueles que não tardam em sonhar com revoluções diversas, mas que a noite vão aos seus pais pedir mesada. Estamos vivendo uma terrível inversão social que, por sua vez, é filha da inversão de valores morais e éticos. Ou o Povo requisita para si o ônus de Senhor social, ou o Leviatã (o Estado) continuará a crescer e se alimentar da vitalidade dos indivíduos — ou seja, de suas liberdades e direitos. Cabe a nós fazer o Estado se conter e atuar restritamente em suas funções, cabe aos indivíduos o protagonismo.

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