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Em um momento marcado por alternativas ao casamento tradicional, a fidelidade conjugal continua sendo a melhor fonte de prosperidade as famílias.
Em um momento marcado por alternativas ao casamento tradicional, a fidelidade conjugal continua sendo a melhor fonte de prosperidade as famílias.| Foto: Bigstock

Na Odisseia de Homero, conhecemos a história de Penélope, uma mulher que esperou fielmente o marido, Odisseu, retornar da guerra. Apesar de receber a atenção de mais de 100 pretendentes, a rainha de Ítaca usou da diplomacia e da astúcia para adiar as investidas dos homens por 20 anos, tecendo simbolicamente um sudário funerário para ganhar tempo. Ela só considerou a ideia de se casar novamente quando foi possível confirmar que Odisseu havia morrido.

Mas e quanto a Odisseu? Foi fiel a Penélope? Isso depende de como você olha para a situação. Durante sua árdua jornada pelo oceano na volta para casa, ele encontrou duas mulheres sedutoras. A primeira, Circe, usou sua magia para encantar Odisseu, atendendo a todos os seus desejos íntimos. No entanto, depois de um ano de conforto em uma ilha, o personagem pediu para ser liberado com sua tripulação, para que pudessem retornar a seus lares.

Mais tarde, na jornada, Odisseu naufragou e se viu sozinho em outra ilha, onde a ninfa obcecada Calipso o manteve como prisioneiro amoroso por sete anos. Ela ofereceu ao guerreiro a imortalidade se ele ficasse e se tornasse seu marido para sempre. Mas, todos os dias, Odisseu ia à prara para chorar e rezar, ansiando pelo retorno à esposa e ao filho.

Zeus interveio, e Calipso foi forçada a libertá-lo. E ele finalmente chegou em casa para um encontro épico com Penélope.

Minha interpretação dos envolvimentos de Odisseu é a de um herói que cai, mas triunfa no final pela virtude da fidelidade. O compromisso com o casamento muitas vezes é repleto de dificuldades e erros, mas o que importa é reverter a situação, curar feridas e perseverar no amor conjugal fiel.

O que é a fidelidade conjugal?

Na linguagem moderna, a fidelidade conjugal frequentemente é entendida como a abstenção de relações sexuais com qualquer pessoa que não seja o cônjuge. Porém, isso envolve não apenas uma simplificação exagerada, mas também uma hiperfocalização no aspecto sexual do casamento.

Se o casamento é o que a lei natural ensina –  ou seja, a união de um homem e uma mulher que se doam completamente um ao outro (mentes, vontades, corações e corpos), estão abertos para a procriação, concordam com uma união vitalícia e são exclusivos (sem parceiros paralelos permitidos) –, então não se trata apenas de manter as mãos longe de outras pessoas, mas principalmente de ser fiel ao presente completo de si mesmo que é dado e recebido no casamento.

Portanto, podemos distinguir diferentes tipos de infidelidade que prejudicam várias áreas da união conjugal. A infidelidade da mente e da vontade envolve o desejo ou anseio intelectual por intimidade com outra pessoa fora do vínculo matrimonial, o que inclui negligenciar o cuidado com o cônjuge, mesmo que nenhuma outra pessoa esteja envolvida.

A infidelidade emocional, por outro lado, envolve desviar o coração, permitindo que os sentimentos se apeguem a outra pessoa e/ou negligenciando as necessidades emocionais do cônjuge. E a infidelidade física, é claro, envolve o corpo e consiste em ceder a atos físicos externos, incluindo afetos sexuais e/ou negligenciando as necessidades físicas e sexuais do cônjuge.

Essencialmente, é possível trair não apenas através do sexo, mas de várias maneiras, incluindo o estabelecimento de laços intelectuais e/ou emocionais com um amigo do sexo oposto que não seja o cônjuge. De fato, a infidelidade intelectual e emocional muitas vezes é o degrau que leva ao escorregão para a infidelidade sexual.

Somos unidades de corpo e alma, e o compartilhamento de nossas almas (por meio de nossas mentes e emoções) naturalmente leva ao compartilhamento de nossos corpos. Portanto, proteger o amor conjugal inclui direcionar nossos tesouros mais íntimos para o cônjuge e evitar apelos alternativos, como fez Penélope. Ou, depois de cair, levantar-se novamente, como Odisseu.

É necessário um esforço concentrado para evitar indiscrições em todos esses aspectos. Quando a fidelidade se torna difícil e mil cantos de sereia estão tocando em nossos ouvidos, amarramos nossa vontade ao mastro e tomamos as medidas necessárias para evitar armadilhas. Isso fica mais fácil com o esforço positivo de focar em tecer (e refazer) as duas partes do casamento, homem e mulher, em uma só.

Casais comprometidos se esforçam para manter uma união mais perfeita a cada dia, focando na colaboração diária, na compreensão mútua e na tolerância. E também em fazer concessões, suportar pacientemente as falhas do outro, demonstrar bom humor e fazer sacrifícios criativos para acrescentar alegria à rotina diária. Dessa forma, a maior parte da energia romântica e da atenção já está no lugar certo, e não sobra muito de nenhum dos dois para os outros.

Críticas modernas à fidelidade conjugal

A fidelidade conjugal envolve muito trabalho árduo, então é razoável perguntar: vale a pena? Há décadas, temos sido perseguidos por mensagens que afirmam que sexo fora do casamento, divórcio fácil e sem culpa, coabitação e relacionamentos românticos entre pessoas do mesmo sexo são aceitáveis – e que devemos relaxar com relação à ideia de que o casamento fiel é o único e ideal.

Hoje ouvimos novas vozes pedindo para a sociedade ser ainda mais flexível, considerar o poliamor e apoiar casamentos abertos (o que os acadêmicos chamam de "relacionamentos não monogâmicos consensuais”).

Outras vozes, mais combativas, estão pedindo para a sociedade abolir completamente a mononormatividade – que, assim como a heteronormatividade, é usada como termo pejorativo (neste caso, em relação ao ideal monogâmico). Essas vozes afirmam que é discriminatório colocar a monogamia em um pedestal acima de outros relacionamentos românticos.

Vale a pena parar para perguntar: é um ponto válido? Ou os benefícios superam os custos quando se trata de fidelidade?

Benefícios pessoais da fidelidade conjugal

A pesquisa em ciências sociais sobre parcerias não monogâmicas ainda está nos estágios iniciais, mas os dados até o momento não são favoráveis. Os participantes desses estudos relatam ser menos felizes e satisfeitos (inclusive sexualmente) se comparados aos casais monogâmicos.

Os pesquisadores presumem que isso se deve ao estresse e ao estigma social. Segundo essa narrativa, se a sociedade fosse mais compreensível, esses grupos teriam resultados melhores. No entanto, a sabedoria baseada em experiência sugere outras razões relacionadas à natureza do próprio arranjo (e não a fatores sociais externos).

Aqui estão algumas das hipóteses mais óbvias. Em primeiro lugar, um compromisso matrimonial sólido gera benefícios psicológicos profundos. Uma vez que a promessa de ser fiel, exclusivo e permanente é feita, os casais experimentam uma sensação profunda de paz psicológica. Essencialmente, eles percebem que podem confiar um no outro. Nenhum deles precisa se preocupar se o interesse está diminuindo ou se pode haver um novo parceiro à espreita.

O medo do futuro também é menor, pois casais fiéis têm confiança de que não ficarão completamente sozinhos ao enfrentar tragédias, doenças, a velhice e, finalmente, a morte. Os medos com relação à criação dos filhos e ao futuro deles também são reduzidos, pois as mães podem contar com a ajuda dos pais e os pais podem contar com a ajuda das mães. Quando ambos os sexos contribuem com seus talentos únicos para o empreendimento da criação dos filhos, uma grande sinergia de suas forças proporciona às crianças um ótimo começo na vida.

Por outro lado, a não monogamia consensual promove a desconfiança, a insegurança e o medo. Sem promessas de fidelidade, exclusividade ou permanência, esses relacionamentos são instáveis e propensos à dissolução. Naturalmente, comparações com outros parceiros sexuais levarão a profundas inseguranças e baixa autoestima. E alguém certamente se sentirá menos amado e valorizado do que os outros do círculo social.

As pessoas em relacionamentos poliamorosos também serão mais temerosas com relação ao futuro, pois a instabilidade inerente a esse arranjo dificulta o planejamento e o investimento a longo prazo. Os membros desse grupo que demandam muita atenção (doentes, idosos, deprimidos) serão deixados para se virar sozinhos.

Os desafios se multiplicam quando entram em cena as crianças. As discussões sobre as diferentes perspectivas dos cuidados infantis e da disciplina aumentarão, pois a rotatividade de amantes significa que mais opiniões de adultos devem ser gerenciadas em relação ao que fazer com as crianças. E, é claro, há um risco maior de transmissão de doenças sexualmente transmissíveis, com todo o estresse, acusações e os conflitos que resultarão disso.

Em segundo lugar, as parcerias matrimoniais permanentes acumulam benefícios materiais e financeiros. As pessoas casadas fielmente estão em melhor situação financeira porque compartilham seus recursos, sem dividi-los com parceiros românticos adicionais.

Elas investem juntas em seus bens, economias, planos de aposentadoria e educação. Esse investimento inclui o trabalho que não é monetizado – como o tempo gasto ajudando com os filhos, realizando as tarefas domésticas e mantendo os outros bens materiais (uma energia que não é despendida com parceiros externos não relacionados ao lar principal).

Casais casados também podem assinar contratos aproveitando oportunidades de longo prazo, como apólices de seguro, propriedade de imóveis e empreendimentos empresariais. Já os casais não monogâmicos encontram mais dificuldades financeiras. Inúmeras perguntas sobre como lidar com as despesas trarão uma exaustão decisória sufocante.

Em um casamento aberto, surgirão discussões sobre quem paga pelo quê, onde se vive e quanto pode ser gasto em novos relacionamentos românticos. O ciúme parece inevitável, pois os parceiros gastam dinheiro em relacionamentos externos e tornam o planejamento financeiro um campo minado emocional. A instabilidade dos arranjos poliamorosos impedirá o estabelecimento de metas a longo prazo.

Em terceiro lugar, casamentos fiéis criam uma ética da união. Para fazer o relacionamento durar, os cônjuges devem aprender a negociar, a se comprometer e a encontrar soluções que sejam vantajosas para ambos. Esse compromisso fortalece o caráter e constrói a resiliência emocional.

Limites à autonomia pessoal garantem o crescimento do altruísmo, o que leva a uma atitude mais humilde me relação aos outros – incluindo o cônjuge, os filhos, os vizinhos e à sociedade em geral. Compaixão e paciência são necessárias para perseverar, o que resulta em cônjuges mais compassivos.

Os casamentos abertos, no entanto, fomentam uma ética de divisão. Esses relacionamentos priorizam a autorrealização de cada indivíduo por meio de sentimentos subjetivos, em vez da unidade conjugal, o que faz com que tensões e desentendimentos tenham mais chances de levar a impasses e rupturas do que a compromissos. Cada parceiro vai preferir liberar a tensão externamente, em novas distrações e prazeres, enfraquecendo ainda mais o relacionamento principal.

Relacionamentos abertos e poliamorosos serão mais suscetíveis à divisão e ao divórcio, e trarão esse espírito de separação para seu estilo de criação dos filhos – o que pode acarretar na separação das crianças de seus pais biológicos e dos laços relacionais estabelecidos. Questões de paternidade, responsabilidade e aborto terão o potencial de semear uma profunda discórdia e criar um conflito amargo.

Benefícios públicos da fidelidade conjugal

Além das vantagens pessoais que a fidelidade conjugal oferece, existem inúmeros benefícios públicos, especialmente para crianças e famílias de baixa renda. Cerca de 25% da população dos Estados Unidos é composta por crianças, ou seja, indivíduos  vulneráveis e dependentes dos adultos

Casamentos fiéis proporcionam os seguintes benefícios às crianças: 1) um lar mais estável e uma probabilidade maior de que elas tenham o apoio da família ao longo da vida; 2) um lar mais seguro, com um risco virtualmente menor de abuso infantil (pois não haverá outro adulto do sexo masculino no convívio diário); 3) uma paternidade de maior qualidade, devido à sinergia equilibrada entre os sexos descrita anteriormente; 4) uma base para a identidade da criança, o que satisfaz o desejo humano de conhecer e ser amado por seus parentes biológicos; 5) melhores resultados educacionais, pois essas crianças têm estatisticamente mais chances de obter notas melhores, o que está relacionado com maiores ganhos futuros; 6) mais recursos financeiros aumentados, conforme descrito anteriormente, incluindo herança e ativos familiares.

Outros segmentos vulneráveis de nossa sociedade incluem os pobres e os homens da classe trabalhadora – e o casamento tradicional os beneficia de várias maneiras. Um dado interessante dá conta de que 97% dos millennials que evitaram uma vida de pobreza seguiram a seguinte sequência: se formaram no ensino médio, conseguiram um emprego em tempo integral depois de concluírem sua educação e se casaram antes de terem filhos. O poder dessa sequência, que inclui o casamento monogâmico, pode impulsionar muitos indivíduos vulneráveis para cima.

Além disso, o casamento está associado a uma melhor saúde mental e física para os homens. Homens casados monogamicamente com uma mulher têm menos probabilidade de apresentar depressão e experimentam níveis mais altos de felicidade. Da mesma forma, os homens têm melhor situação financeira quando estão casados e são fiéis.

Todos os benefícios descritos acima se estendem à sociedade como um todo. Eles criam famílias mais unidas e estáveis que fortalecem o tecido social. Sua ética de unidade gera uma rede de confiança ao longo das gerações, dando origem à aquisição de virtudes e a um imenso capital social.

Por outro lado, toda a instabilidade, ruptura e infidelidade das uniões não monogâmicas vão desgastar e rasgar as comunidades, aumentando a anarquia relacional e o dano humano, especialmente com relação aos mais vulneráveis: crianças e os pobres.

Vamos reconhecer que, em nosso mundo ferido, os danos são muitas vezes inevitáveis. A vida acontece e, muitas vezes, não podemos alcançar o ideal, não importa o quanto tentamos. Com compaixão e misericórdia, podemos evitar julgamentos dolorosos de pessoas em situações específicas. No entanto, não podemos desistir da fidelidade ao ideal do casamento, que é a fonte de cura humana, unidade e florescimento.

Somente quando reconhecemos um ideal pelo que ele é – um padrão pelo qual todas as outras opções são calibradas – podemos trabalhar para transformar situações não ideais nas melhores versões possíveis de si mesmas. Aqueles em famílias estáveis e intactas têm uma responsabilidade especial: eles devem se aproximar dos que estão feridos em seus relacionamentos e compartilhar sua riqueza relacional, para promover a cura social em larga escala.

Futuro brilhante

Nas últimas décadas, nossa civilização tem experimentado várias alternativas ao casamento tradicional. No entanto, as evidências são abundantes de que, tanto do ponto de vista pessoal quanto do público, temos maior probabilidade de prosperar quando casamentos fiéis, monogâmicos e baseados na lei natural são abundantes e normativos.

A todos os nossos heróis do casamento moderno, aqueles que enfrentam situações desafiadoras e fazem tudo o que podem para colocar as necessidades de seu cônjuge e filhos antes dos próprios desejos egocêntricos: saudamos vocês. Obrigado pelo seu serviço à nação. Vocês estão seguindo o caminho da fidelidade, que leva a um futuro mais brilhante para todos.

© 2023 Public Discourse. Publicado com permissão. Original em inglês.

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