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Policial chora durante funeral do coronel da Polícia Militar Luis Gustavo Teixeirano, no Rio de Janeiro, no dia 27 de outubro de 2017. Teixeira, Comandante do 3º Batalhão de Polícia Militar do Rio de Janeiro, é o 112º policial a ser morto até agora este ano. Seu carro foi atingido por pelo menos 17 balas quando criminosos abriram fogo contra ele no Meier, bairro no norte do Rio. | CARL DE SOUZA/AFP
Policial chora durante funeral do coronel da Polícia Militar Luis Gustavo Teixeirano, no Rio de Janeiro, no dia 27 de outubro de 2017. Teixeira, Comandante do 3º Batalhão de Polícia Militar do Rio de Janeiro, é o 112º policial a ser morto até agora este ano. Seu carro foi atingido por pelo menos 17 balas quando criminosos abriram fogo contra ele no Meier, bairro no norte do Rio.| Foto: CARL DE SOUZA/AFP

O coronel da PM Luiz Gustavo Teixeira, de 48 anos, morreu no dia 26 de outubro depois que a viatura onde ele estava foi atingida por pelo menos 17 disparos. A artéria aorta, a traqueia e o pulmão esquerdo foram atingidos. O suspeito, Matheus do Espírito Santo, já havia sido preso em dezembro do ano passado, durante um confronto de traficantes com a polícia, e foi solto em junho. Casado e com dois filhos, Luiz Gustavo estava na corporação fazia 26 anos. Ao ser baleado, virou estatística: é o 112o policial militar assassinado no Rio de Janeiro em 2017. 

Nos últimos meses, também perdeu a vida o cabo Thiago Rodrigues da Silva, de 32 anos. Ele saía de casa quando seu carro foi cercado por 10 pessoas, que o raptaram e o mataram. O soldado Antônio Nunes, de 34 anos, morreu durante um confronto perto da Favela de Manguinhos, na Zona Norte, logo no primeiro dia de janeiro. O cadáver do sargento reformado Marcondes José Meireles, de 57 anos, foi encontrado com um corte profundo no pescoço, em Itaboraí, região metropolitana da cidade. A cabo Elisângela Bessa Cordeiro, de 41 anos, estava no carro com o marido, na Avenida Brasil, quando assaltantes abordaram o veículo. Ela foi ferida na cabeça e não resistiu. 

Esse massacre vem acontecendo há décadas. Todos os anos, desde 1995, são mais de 100 mortos anuais – com a única exceção de 2015, quando 91 pessoas foram assassinadas. Na soma de 1995 a 2017, morreram mais de 3 mil policiais militares, ou 3,52% dos 90 mil homens que, nesse período, formaram a corporação na cidade. Entre os soldados americanos que lutaram a Segunda Guerra, o índice de mortalidade foi menor: 2,52% da tropa perdeu a vida entre 1942 e 1945. 

Uma policial coloca flores no túmulo do coronel da Polícia Militar Luis Gustavo Teixeira, durante seu funeral no Rio de Janeiro, no dia 27 de outubro de 2017, um dia depois de ser morto. Teixeira, Comandante do 3º Batalhão de Polícia Militar do Rio de Janeiro, é o 112º policial a ser morto até agora este ano. Seu carro foi atingido por pelo menos 17 balas quando criminosos abriram fogo contra ele no Meier, bairro no norte do Rio.CARL DE SOUZA/AFP

Fora de serviço 

Ao todo, segundo Polícia Militar do estado, morreram na capital carioca, em 2017, 23 policiais em serviço, 69 durante a folga e 20 reformados. Mas salta à vista o total de agentes que perderam a vida fora do expediente. Não é um número casual – nos últimos 22 anos, 80% dos PMs mortos de forma violenta estavam de folga. O que eles estavam fazendo? 

Bicos, muitas vezes. Os trabalhos fora do expediente ajudam a explicar por que a maior parte das mortes acontece entre quinta-feira e domingo. Atuar como segurança, num desses dias, representa risco de vida. Principalmente se o bico acontece na Baixada Fluminense e na Zona Norte, que concentram 60% dos homicídios de policiais deste ano. Era na Baixada que estava o segundo sargento Fábio Cavalcante e Sá, a vítima número 100 deste ano, alvejado com um tiro de fuzil na cabeça. Tinha 39 anos, 18 deles na corporação. 

No Brasil como um todo, em 2016, morreram 335 policiais militares – com 146 assassinatos, a cidade do Rio respondeu por 43% desse total. Num distante segundo lugar, no ranking dos estados, vem São Paulo, seguido pela Bahia. O Paraná fica em sétimo. A diferença é muito grande: o Paraná precisou de 8 meses do ano para registrar 11 PMs mortos. No Rio, esse número foi alcançado na primeira quinzena de janeiro. 

Caçada a policiais 

Mas também há os casos em que assaltos comuns acabam em homicídio porque a vítima foi identificada como policial. Sobre esse problema, o comandante-geral da Polícia Militar do Rio, o coronel Wolney Dias, escreveu em agosto uma nota em que argumenta que o que está acontecendo na cidade é uma caçada a policiais. Quando eles são identificados na rua, não sobrevivem: “O policial é vítima da violência com uma desvantagem adicional: ao ser identificado como agente de segurança pública num assalto ou qualquer situação de confronto será executado sumariamente”. 

Das 112 mortes desse ano, 35 foram tratados pelos investigadores, ao menos num primeiro momento, como execução premeditada. E 48 como assaltos – situações em que, se o bandido não identificasse a vítima como policial, talvez não a tivesse matado. Se ele é identificado, é porque costuma andar armado, como já apontou o diretor da Divisão de Homicídios, Rivaldo Barbosa. “Se os policiais assaltados não usassem armas, 80% deles não teriam morrido”, ele declarou numa entrevista há algumas semanas. 

Ainda assim, por que essa raiva contra os PMs? Por que eles são assassinados quando os bandidos percebem que eles são agentes da lei? Talvez o número de pessoas mortas pela Polícia Militar ajude a entender. Dados do Instituto de Segurança Pública, uma organização da Secretaria de Segurança Pública do Estado do Rio de Janeiro, foram registrados, em 2016, 463 casos do chamado homicídio proveniente de oposição à intervenção policial. 

Esse tipo de incidente matou 7,1 pessoas por 100 mil habitantes, contra 4,7 no ano anterior.  Um relatório da ONG Human Rights Watch, publicado em 2016, apontou que PMs cariocas mataram mais de 8 mil pessoas no período de uma década, entre 2005 e 2015. É o equivalente a 20% de todos os homicídios registrados no Rio

No Brasil, em 2015 policiais militares mataram 3285 pessoas durante o expediente. São 9 assassinatos por dia, segundo o 10º Anuário Brasileiro de Segurança Pública. A Anistia Internacional critica a instituição constantemente; considera que ela pratica, com frequência, execuções extrajudiciais. 

Pouca comoção 

Em sua nota, o coronel Wolney Dias lembrou do sofrimento dos familiares. “Reescrevo hoje o mesmo desabafo, recheado de tristeza e revolta. Tristeza pela perda irreparável de cada companheiro que se vai, deixando para trás sonhos e o sofrimento da família e amigos. Revolta, pela omissão de grande parte da sociedade que se nega a discutir com profundidade um tema de tamanha relevância”. 

De fato, boa parte dos PMs que morrem tem de 31 a 41 anos. Deixam pais, mães, esposas e filhos. São milhares de pessoas que, todos os anos, perdem um ente querido. 

“As famílias são completamente abandonadas, não contam com apoio psicológico. Imagine uma criança que perde o pai dessa forma violenta, enterrado com caixão lacrado porque geralmente morreu com tiro no rosto”, diz Antônio Carlos Costa, fundador da ONG Rio de Paz

A organização mantém, na Lagoa Rodrigo de Freitas, cartazes com os rostos e nomes dos PMs assassinados e também faz manifestações pelo fim dessa violência – a mais recente foi realizada na última sexta-feira. 

Antônio Carlos diz que os policiais são vítimas porque estão na linha de frente da uma verdadeira guerra. 

“Você não tem 112 médicos assassinados num ano, não tem 112 engenheiros. A sociedade e o poder público colocaram sobre os ombros da PM a responsabilidade de dar conta da segurança pública”, ele argumenta. 

“A polícia está sozinha, trabalhando em condições desumanas, mal treinada, mal remunerada, com policiais altamente desencorajados, que enfrentam o crime organizado e seu arsenal. É uma batalha que estamos perdendo, enquanto a sociedade assiste de braços cruzados.”

O que os estudos científicos dizem sobre as diferentes taxas de homicídios por armas em vários países?

Publicado por Ideias em Terça-feira, 3 de outubro de 2017
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