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Hugo Chávez e Norberto Ceresole
Hugo Chávez e Norberto Ceresole: neonazismo| Foto: Reprodução

Pouca gente fora da Venezuela sabe, mas Hugo Chávez teve um guru neonazista argentino chamado Norberto Ceresole. Mesmo se não tivesse desempenhado um papel relevante na Venezuela, Ceresole seria uma figura digna de interesse por si só, porque é uma eloquente amostra da fusão entre esquerdismo e nazismo ocorrida depois da II Guerra.

Não há nada de insólito nessa ideia, haja vista a aliança entre a União Soviética e o III Reich feita em 1939, ainda antes de Hitler ter começado a deportar de judeus e outras minorias para campos de concentração e extermínio. A União Soviética impediu que os bloqueios econômicos lançados pelo Ocidente tivessem o impacto desejado, e talvez, sem ela, não houvesse Holocausto.

Lembre-se ainda que a aliança não foi quebrada pela União Soviética, mas por Hitler, que escolheu invadi-la à traição. Só isto fez com que a União Soviética se ladeasse ao Ocidente — mas é a estátua de Churchill que os antirracistas de araque tentam destruir.

Nazismo e esquerda

Uma coisa é uma aliança de fato entre esquerdistas e nazistas; outra, a fusão de ambas as ideologias numa só coisa. A aliança talvez seja mais norma que exceção; a fusão é mais complicada. Joachim Fest, biógrafo de Hitler, atribui a Hitler o fim do nazismo de esquerda, sediado em Berlim, capitaneado pelos irmãos Otto e Gregor Strasser, no qual se destacava Goebbels. A conceituação do que é esquerda é sempre controvertida, então cabe dizer que esses nazistas berlinenses não eram racistas, eram anticapitalistas e simpatizavam com a União Soviética.

Goebbels aderiu a Hitler, Otto fugiu da Alemanha em 30 e Gregor foi morto na Noite das Longas Facas (1934). Nessa noite, foi liquidado outro grupo nazista que poderia ser identificado como esquerda: os SA, liderados por um guerreiro viril e homossexual chamado Ernst Röhm. Röhm queria uma revolução permanente, e não aceitava a aliança de Hitler (eleito em 33) com o capital.

Hitler, tal qual seu adorado Mussolini, não era contra o capital, muito pelo contrário: pretendia ter uma política de campeões nacionais irrigados pelo Estado; a Bayer e a Volkswagen são como que Fribois alemãs. Na Prússia centralizadora e estatista, foi fácil implementar esse capitalismo de compadrio.

A embasada tese do chileno Víctor Farías, que lhe deu merecida notoriedade na Europa, é que Heidegger era o filósofo da corrente das SA. Assim sendo, não é de admirar que neonazistas se deem bem na esquerda em geral, dado que no pós-guerra a esquerda passou a ser heideggeriana, via Sartre e Derrida.

Quanto à América do Sul em particular, é necessário lembrar que Perón — aquele por quem os argentinos babam até hoje, e cujo cadáver embalsamado tem um mausoléu para visitação — abriu as portas da Argentina para receber nazistas. Mengele viveu lá sem fazer esforço para disfarçar a identidade, e atuou como médico também no Chile, no enclave ariano criado por um nazista pedófilo chamado Paul Schaefer, que fez um campo de concentração para alemães que viviam presos, tomando choques, sendo abusados e drogados.

O lugar se chamava Colonia Dignidad (ainda existe, mas mudou de nome), e é mais conhecido não por essas barbaridades, senão por ter prestado serviços a Pinochet, liberando seu espaço para torturar esquerdistas. Os governos de esquerda, porém, nada fizeram contra o enclave. A Alemanha compactuou e compactua a até hoje com a impunidade dos alemães responsáveis pela colônia, e não dá atenção às vítimas alemãs tratadas por décadas como ratos de laboratório de experimento social.

Mas deixemos de delongas, e vamos a Ceresole e à Venezuela. Ele não é o inventor do nazismo de esquerda, mas com certeza é o principal teórico racista e antissemita sul-americano a receber da esquerda um tapete vermelho.

Cosmovisão antissemita e imperialista

Que Ceresole é um negacionista do Holocausto, está fora de questão. Em Caudillo, Ejército, Pueblo: la Venezuela del Comandante Chávez (1999), que eu tenho e li metade, ele cita muito o maior negacionista do Holocausto, Robert Faurisson, para tratar do tema. Num livro sobre a Venezuela, ele sente a necessidade de voltar à Alemanha de 45. Para ele, a pior tragédia humanitária da II Guerra foi o bombardeio de Dresden pelos Aliados, e os campos de extermínio, "pouquíssimos", mataram muito menos que esse bombardeio.

1999 é o ano que marca a saída de Ceresole da Venezuela. Mas antes disso ele já publicara, em 1997, cujo conteúdo é descrito assim na contracapa: “A política do Estado de Israel já realizou a substituição de uma ideologia (messiânica) secular por outra ideologia (hipermessiânica) religiosa. Este feito pretende transformar esse estado e essa sociedade em algo totalmente diferente ("eleito") do resto dos outros Estados e sociedades; e a hiperjudaísmo nacionalista israelita em algo oposto aos outros dois grandes monoteísmos abraâmicos. A leitura que hoje faz o nacional judaísmo ou hiperjudaísmo do Antigo Testamento (Torah) é una leitura imperial, consoante ao papel que aspira  jogar em uma nova ordem mundial globalizada. O fundamentalismo judeu está estruturando uma força — ideológica e física em escala internacional, com o objetivo de desatar uma guerra definitiva, uma guerra de extermínio que terá como cenário principal o Oriente Médio e zonas contíguas da Ásia Central. Essa solução final está desenhada tanto para eliminar a população árabe do Eretz Israel quanto para quebrar o poder militar de outros Estados árabes e muçulmanos, e lograr assim a pureza étnica e religiosa e a hegemonia que o nacional-judaísmo considera imprescindível à sobrevivência do Estado de Israel, em suas novas dimensões bíblicas.” O livro é prefaciado por Roger Garaudy, outro notório antissemita e negacionista do Holocausto, ex-comunista francês convertido ao islã. (Para islamismo e neonazismo, veja-se este texto meu, que divulga um pouco de Víctor Farías.)

Loucura, não? Religiosidade à parte, a cosmovisão nazista é atribuída aos judeus: têm um plano de dizimar as populações que não sejam de seu grupo exclusivista — uma solução final! — , e pretendem construir um Estado determinado por algo de transcendente. Trocando a religião pela mística da raça, dá no mesmo.

Os movimentos imperialistas de unificação (ou pan-nacionalismos) precederam os dois maiores movimentos totalitários. O pan-eslavismo russo pretendia fazer seu império se estender a todas as regiões povoadas por eslavos, e a União Soviética de fato cresceu sobre o Leste europeu. O pangermanismo pretendia engolir a Áustria por ser povoada por teutões.

O bolivarianismo nada mais é que um movimento imperialista de unificação. Seu nome vem de Simón Bolívar (1783 – 1830) não por simpatizar com seus ideais oitocentistas, mas por ter sido ele o presidente e artífice da Grã-Colômbia (1819 – 1831), uma república composta pela Venezuela (que incluía um grande naco da atual Guiana), Colômbia, Equador e Panamá. Depois de esse venezuelano  fomentar a Independência por países hispânicos da América do Sul, tratou de unificar a Venezuela e a Colômbia — unificação que não iria muito além de sua morte.

O mais próximo que temos para substrato histórico de movimento de unificação é isso. Tendo a Grã-Colômbia em mente, Chávez sempre pôs na mira a Guiana, e sempre briga com a Colômbia. Como explica em Caudillo, Ejército, Pueblo, Ceresole apoia as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC), e atribui ao judaísmo internacional as milícias criadas na Colômbia rural para se defender das FARC. Agentes do Mossad estariam em plena Amazônia colombiana lutando contra as FARC para implementar a solução final.

O primeiro atentado terrorista suicida islâmico da América não foi nos Estados Unidos, mas sim na Argentina. Foram dois: o primeiro em 1992, contra a embaixada de Israel, com 30 mortos; o segundo em 1994, contra a Associação Mutual Israelita Argentina (AMIA), com 85 mortos. Os atentados nunca foram esclarecidos, e o procurador (Alberto Nisman) foi suicidado às vésperas do depoimento. Ceresole escreveu em várias ocasiões — inclusive em Caudillo, Ejército, Pueblo — que os atentados foram feitos por judeus sionistas apenas para culpar muçulmanos e neonazistas.

Pequena cronologia

Na juventude, Norberto Ceresole era um guerrilheiro peronista. Foi assessor de Velasco Alvarado, o único esquerdista dentre os ditadores militares da América do Sul. Velasco mandou no Peru de 68 a 75.

Com sua soldadesca, Hugo Chávez, militar de baixa patente, tentou dar um golpe de Estado em 1992, e se tornou presidente democraticamente em 1999. De posse do Executivo, lançou plebiscitos e criou uma Constituinte para destruir as instituições venezuelanas. É uma trajetória parecida com a de Hitler, um soldadinho de baixa patente que tenta dar um golpe de Estado, elege-se e destrói a democracia de cima para baixo, sem precisar pegar em armas.

Segundo o jornal colombiano El Tiempo, Chávez e Ceresole se conheceram em junho de 1994, em Buenos Aires. Chávez saíra da Venezuela após o golpe fracassado. Em 1995, Ceresole é expulso da Venezuela, acusado de conspirar para outra tentativa de golpe de Estado. Em 1999, com Chávez já presidente, sai da Venezuela outra vez, após o constrangimento causado pela sua entrevista ao tradicional jornal venezuelano El Nacional (hoje digital, por falta de papel). Lá, expõe todas as suas opiniões políticas.

Ideal de Ceresole

A entrevista foi reproduzida em Caudillo, Ejército, Pueblo. Lá ele plagia Mussolini, e se diz adepto de uma terceira posição contrária ao liberalismo e ao comunismo. O comunismo é criticado por ser racionalista e europeu. O seu ideal político fascista é bem nítido na entrevista que, com justeza, boquiabriu os venezuelanos: “O povo da Venezuela gerou um caudilho. O núcleo do poder atual é precisamente essa relação estabelecida entre o líder e a massa. Essa natureza única e diferencial do processo venezuelano não pode ser tergiversada, nem mal interpretada. Trata-se de um povo que deu uma ordem a um chefe, a um caudilho, a um líder militar. Ele está obrigado a cumprir com essa ordem que lhe deu o povo. Portanto aqui a única coisa que deve importar é a manutenção dessa relação povo-líder. Ela está no núcleo do poder instaurado. É a essência do modelo que vocês [venezuelanos] criaram. […] ‘Democratizar’ o poder tem hoje um significado claro e unívoco na Venezuela: quer dizer ‘diluir’ o poder, quer dizer ‘gasificar’ o poder, quer dizer anular o poder. [...] Na Venezuela, a mudança canalizar-se-á através de um homem, de uma ‘pessoa física’, e não de uma ideia abstrata ou de um partido genérico.”

Quanto ao racismo, vale ressaltar que Ceresole trata de “raça-cultura branco-europeia” — assim, com hífen — e que crê na degeneração dos Estados Unidos com a imigração. Por causa desse racismo, ele a apoia: crê que nós, os moreninhos, podemos degenerar a sua raça-cultura. O ódio de Ceresole é voltado sobretudo para os Estados Unidos e a democracia liberal, representantes da sociedade “judaico-cristã ocidental” — sim, ele usa em 99 a expressão, antes de Bin Laden.

Depois da partida de Ceresole, o conselheiro de Chávez passa a ser Heinz Dieterich, alemão residente no México. Ainda não li. Segundo Víctor Farías, é um continuador de Ceresole.

Viva o Brasil!

Aqui, o caudilho alinhado com Perón foi Getúlio Vargas. Seu antissemitismo foi secreto, e o Itamaraty nunca teve coragem de revelar à opinião pública que proibia a entrada de judeus. Mengele morreu em Bertioga, mas teve que esconder muito bem a sua identidade para viver entre nós. E o mais importante: a despeito de toda simpatia do ditador pelo Eixo, e de toda a sua competência propagandística, o racismo verdadeiro (que é mais do que o preconceito contra a cor, passível de ser revertido com bons exemplos) nunca pegou no nosso povo, e o Brasil terminou por ser o único país da América do Sul a enviar soldados para combater o Eixo. Lá, não os brasileiros tinham armas para surpreender ninguém: surpreendiam pela mistura de gente de todas as cores, e se surpreendiam, negativamente, com a separação racial dos soldados norte-americanos.

Argentinos se dizem peronistas, mas aqui só Ciro, Lula e seus bajuladores acadêmicos tentam restaurar um varguismo. Vargas e Lula passaram. O racismo científico passou. O racismo pós-moderno passará também, e nosso país, a despeito de sua elitezinha universitária mequetrefe, precisa seguir iluminando o mundo com o que tem de melhor. Os gregos contagiaram os romanos mesmo sem armas; nós podemos fazer o mesmo. A crença na individualidade, em vez de “raças-culturas” coletivistas, nada mais é que a essência da “civilização judaico-cristã ocidental.”

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