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“Agora temos de dar as mãos. Algumas áreas chegaram ao extremo, o que gera um trânsito impraticável, falta de saúde, violência brutal e diferença entre as classes cada vez maior.”
Décio Tozzi, arquiteto e urbanista | Hedeson Alves/ Gazeta do Povo
“Agora temos de dar as mãos. Algumas áreas chegaram ao extremo, o que gera um trânsito impraticável, falta de saúde, violência brutal e diferença entre as classes cada vez maior.” Décio Tozzi, arquiteto e urbanista| Foto: Hedeson Alves/ Gazeta do Povo

O mundo todo vive um processo da superurbanização e o que se vê é o concreto se amontoando nas cidades, ocupando o que deveria ser preservado para garantir qualidade de vida a todos. As megaconstruções verticais seriam uma solução para recuperar o verde e proteger as cidades. É o que pensa o premiado arquiteto paulistano Décio Tozzi, mestre em Estruturas Ambientais Urbanas. Ele conversou com a Gazeta do Povo durante uma visita a Curi­­­tiba para participar de um work­­­shop promovido pela Associação Brasileira dos Escritórios de Arquitetura (Asbea), para falar sobre suas obras. Quatro delas foram integradas ao acervo permanente do Museu de Arte Mo­­­­derna do Centro Pompidou, em Paris, no ano passado. Entre os prêmios, o Rino Levi, do Instituto de Arquitetos do Brasil, além de grandes bienais de arquitetura em Buenos Aires e Veneza. Confira os principais trechos da entrevista:

Qual o maior desafio urbanístico hoje nas grandes cidades?

O mundo não escapa de uma discussão fundamental que é o "grande número". Todos os arquitetos estão propondo formas novas, baseadas em tecnologias avançadas, mas o principal é achar o novo desenho, em uma nova escala. Hoje a escala deve ser pensada para que tenhamos bairros verticais, quase que cidades verticalizadas. Só com essa solução poderemos preservar o verde e plantar mais árvores.

Qual é a sua avaliação sobre o que tem sido feito em urbanismo?

Vejo que em qualquer lugar o que está sendo feito está ultrapassado, tanto os modelos das cidades modernas, quanto a própria constituição do modelo de capital investido na construção. As empresas ainda estão pautadas por uma economia atomizada, quase que familiar. Ou seja, a empresa compra cinco ou seis terrenos, com oito ou dez casas, e sobem um prédio com 20 andares. Não muda nada em relação ao início da urbanização vertical das cidades, no período moderno, quando compravam um velho casarão e transformavam em um prédio de 15 andares. São 70, 80 anos, em que se mantém o mesmo processo, mas a estrutura da cidade é a mesma. Nas cidades que cresceram muito, sentimos que é impagável o desenvolvimento horizontal.

Qual seria a solução para driblar a questão desse inchaço?

São necessárias operações radicais. Falo pensando muito em São Paulo. Os curitibanos ainda estão em um "mar de rosas", mas serve como um alerta. A solução é pensar em grandes distritos verticais, ou dentro das cidades, transformando suas áreas. Na prática, seriam prédios superaltos. Me recordo de duas propostas para Brasília, que ficaram em terceiro lugar na concorrência na época da construção, de lâminas verticais. São projetos que contêm caminhos muito interessantes para hoje nas metrópoles. Agora, com a instituição jurídica do direito do Solo Criado, é permitido rarefazer uma área que está pouco ocupada e lá subir um bairro vertical, com o triplo da população que tem na área. Nas áreas horizontais, árvores, parque e bosques. O nosso grande problema é resolver a questão do ar. Em São Paulo, por exemplo, há áreas que não têm mais verde. A fauna se transformou em insetos, fungos e ácaros. Não tem mais passarinhos, somente asfalto e concreto.

Como seriam esses bairros verticais?

Grandes construções, quase que como um prédio em cima do outro, cada um com uma pracinha em cima. É um outro urbanismo, mais aéreo, acredito muito nisso. Funcionariam, na verdade, como pequenas cidades, com cinema, teatro, padaria, mercadinho, escritório, farmácia, enfim, todos os serviços que se tem em uma cidade. Em um raio de um quilômetro, com oito quarteirões, se poderia andar a pé, não precisaria de carro. Seriam usados somente para viajar, passear no fim de semana em um local mais distante. Esses módulos verticais se implantariam aos poucos, em substituição àquela ocupação extensiva. Os terrenos de casas poderiam ser transformados em parques.

Ainda há tempo para se fazer um resgate?

Os arquitetos brasileiros podem engendrar soluções interessantes. O pós-guerra, que teve cidades totalmente reconstruídas, pode servir de exemplo. Um novo urbanismo surgiu em cima do que foi destruído na Segunda Guerra Mundial. Estamos quase que em um estágio de guerra em algumas cidades, como São Paulo. As soluções podem ser muito criativas. Mas as novas propostas de arquitetura não podem ser mais os "predinhos" da era moderna e, sim, as megaestruturas, que ocuparão menos o solo, deslumbrando o resgate da natureza, da sociabilidade e da alegria de viver. É demorado, um plano de salvamento de 30 anos. Afinal foram 80 anos de degradação e de especulação sobre a terra, deteriorando-a. Não só a terra, mas a vida humana.

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