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Trump deve anunciar seu indicado à Suprema Corte, referente à vaga aberta com a aposentadoria de Anthony Kennedy, no dia 9 de julho. | JIM WATSON/AFP
Trump deve anunciar seu indicado à Suprema Corte, referente à vaga aberta com a aposentadoria de Anthony Kennedy, no dia 9 de julho.| Foto: JIM WATSON/AFP

Quando precisou fazer a primeira indicação de seu mandato para a Suprema Corte, em 2017, Donald Trump tinha o juiz Bill Pryor em mente. Levando em consideração declarações a respeito do aborto feitas anteriormente pelo magistrado, no entanto, ele foi considerado não confiável para assumir o cargo. 

Em 2003, na sabatina de Pryor para se tornar um juiz federal de segundo grau, o senador Chuck Schumer, que representa o estado de Nova York pelo Partido Democrata, contestou falas anteriores de Pryor, nas quais ele comparava abortos a assassinatos. Pryor não voltou atrás. Em vez disso, surpreendeu a todos dizendo que “acredito não apenas que Roe v. Wade** não encontra suporte na Constituição, mas também que essa decisão culminou num resultado moralmente errado. Ela levou ao massacre de milhões de crianças não-nascidas e inocentes”. 

A coragem de Pryor o transformou em herói para muitos, incluindo o ministro da Suprema Corte Antonin Scalia, que faleceu em 2016. Mesmo diante da possibilidade quase certa de derrota em relação à sua nomeação como juiz de apelações, por parte dos democratas do Senado, Pryor não se curvou ao poder político do “lobby do aborto”. 

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Mesmo assim, Pryor conseguiu o cargo de juiz de segundo grau. Foi sua coragem sob o fogo cruzado que o impulsionou. Como John Malcolm, da Heritage Foundation, diria mais tarde, o juiz Pryor tem “uma espinha de aço titânico”. 

Na lista dos 25 nomes dentre os quais o presidente Trump deve escolher sua próxima indicação para a Suprema Corte há outros que possuem coragem semelhante. A dificuldade está em precisar, com exatidão, quem são eles. Como prever que, uma vez juiz da Suprema Corte, alguém irá se recusar a curvar-se aos pensamentos dominantes da elite intelectual? 

Todos na lista de Trump dizem – e já demonstraram – ter a crença de que a Constituição deve ser interpretada na letra da lei. O mesmo, contudo, era dito por Anthony Kennedy durante a administração Reagan, quando o juiz foi indicado e sabatinado para a Suprema Corte. 

Kennedy, no entanto, pisou na bola. No julgamento do caso Planned Parenthood v. Casey, em 1992, quando havia a oportunidade de reverter o que fora decidido em Roe v. Wade, Kennedy confirmou a constitucionalidade do aborto. Na época, estudiosos especializados na Suprema Corte atribuíram o novo entendimento do juiz a Laurence Tribe, professor da Escola de Direito de Harvard, e sua ‘persuasão, lisonja e também seus assessores’. 

Em 1988, após as indicações frustradas dos juízes Robert Bork e Douglas Ginsburg, o então presidente Ronald Reagan nomeou Kennedy para o mais alto tribunal dos EUA. Para a surpresa de todos, Tribe, um ícone liberal***, assistiu às sabatinas e usou termos lisonjeiros para se referir a Kennedy. 

“O que eu acho mais promissor nesse quadro que emerge é que não há traços de um ponto de vista simplista, único e fixo”, disse o professor de Harvard. “Eu acredito que ele [Kennedy] possui uma inteligência enorme, senso de imparcialidade e compromisso com princípios, mas não uma visão unitária”. 

“Visão unitária”: isso é fundamental. Uma visão clara da Constituição foi o que separou Kennedy de seus colegas Scalia e Clarence Thomas, mesmo quando votaram juntos. Igualmente fundamental foi a fraqueza na personalidade de Kennedy percebida pelo professor Tribe: a vaidade. Tribe sabia que, sem uma visão clara da Constituição, um vaidoso Kennedy poderia se sentir lisonjeado ao adotar, como os professores de direito costumam dizer, “a melhor visão”. 

Por mais que a esquerda tenha clamado por isso, Reagan não pediu aos potenciais indicados à Suprema Corte que discorressem sobre suas visões acerca do aborto. Os candidatos, no entanto, foram questionados sobre o que pensavam de Roe v. Wade. Esse processo é a pedra fundamental para analisar se o juiz adere ou não à lei conforme o que está escrito na Constituição. 

Os democratas do Senado e o lobby do direito ao aborto, porém, parecem não conseguir distinguir o apoio à interrupção da gravidez e o apoio a Roe v. Wade. Se o fizessem, teriam que admitir que o que consideram ser uma política aceitável não tem amparo da Constituição. 

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Trump fez certo ao afirmar que não perguntaria a seus potenciais candidatos seus posicionamentos no que concerne ao aborto. Mas é praticamente certo que todos os finalistas acreditam que Roe v. Wade contemplou uma decisão errônea. 

Kennedy acabou demonstrando que a visão externalizada por um candidato durante sua pré-confirmação nem sempre se sustenta. Afirmar que Roe v. Wade foi decidido de forma errônea é um indicador forte, mas não suficiente, de como o juiz irá agir se for confirmado ministro. 

O professor Tribe provou, em última análise, que o que importa é a “visão” que um candidato tem sobre a Constituição, bem como se seu caráter será forte o suficiente para resistir à persuasão da elite intelectual. Um candidato em potencial pode ser questionado a respeito de sua visão constitucional. Mas como determinar a força de seu caráter? Embora seja difícil discernir, deve-se observar, dentre os possíveis candidatos, quais aguentariam ser vilipendiados na mídia e na academia. 

O desprezo é inevitável se, após a confirmação como ministro, o juiz aderir à Constituição conforme foi escrita. Os juízes Scalia, Clarence Thomas, Samuel Alito e agora Neil Gorsuch, a primeira indicação da administração Trump, foram difamados por se recusarem a aderir à “melhor visão” do texto. Se Trump não quiser cometer os mesmos erros de outros presidentes republicanos, ele vai escolher alguém comprometido com a visão daqueles que, de fato, escreveram a Constituição, bem como um nome que tenha caráter capaz de resistir tanto à lisonja quanto ao desprezo. 

John S. Baker Jr. é professor emérito da Escola de Direito da Universidade Estadual da Louisiana

** Nota da editora [1]: Roe v. Wade é o caso julgado pela Suprema Corte dos EUA em 1973 que reconheceu o direito ao aborto, também chamado de “interrupção voluntária da gravidez”, no país. 

*** Nota da editora [2]: No cenário norte-americano, o termo liberal é usado também para quem se identifica com pautas progressistas nas áreas de comportamento e costumes.

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©2018 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

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