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Mulher acorrenta as mãos em protesto contra as medidas de austeridade econômica da Grécia, em Atenas: cidadãos de países menores veem entrada no bloco como causa de seus problemas | Yiorgos Karahalis/Reuters
Mulher acorrenta as mãos em protesto contra as medidas de austeridade econômica da Grécia, em Atenas: cidadãos de países menores veem entrada no bloco como causa de seus problemas| Foto: Yiorgos Karahalis/Reuters

Caso Pando - Unasul já alcançou uma vitória de cooperação

Estabelecida pela Declaração de Cuzco, em 2004, a União dos Países da América do Sul (Unasul) foi idealizada para unir Mercosul, Comunidade Andina, Chile, Guiana e Suriname numa zona de livre comércio. Por enquanto, seu maior feito foi a interferência nos conflitos relacionados ao referendo na região boliviana de Pando em 2008, quando morreram 17 pessoas.

O grupo de países enviou uma missão à região para ajudar na obtenção de um acordo entre governo e oposicionistas. "Foi um momento em que a região conseguiu resolver o problema sozinha, sem precisar de qualquer outra potência", disse o embaixador Hermano Telles Ribeiro à Gazeta do Povo.

Para além de ações de aconselhamento como essa, a integração dos países da América do Sul passaria necessariamente pela renúncia gradativa de soberania em nome de um bem comum – quanto mais integrado o bloco, maior ela é.

  • Os blocos econômicos da América tem política distante da Europa

A crise econômica grega não apenas escancarou o problema da dívida pública de países membros da União Europeia. Também tirou do baú desconfianças que os europeus ainda têm em relação ao mais integrado dos blocos regionais, principalmente no que se refere a abrir mão da soberania nacional e apertar o cinto nas finanças. Após quase 20 anos de unidade europeia e 10 de moeda comum, num cenário em que o temor pelo retrocesso da integração alcança vozes como a da poderosa chanceler alemã Angela Merkel, uma das questões que vêm à tona é se vale a pena continuar o esforço pela união do Mercosul.

O problema da assimetria entre os países membros, que atinge qualquer bloco, foi equacionado bem pela Europa, com a destinação de rios de dinheiro pelos países mais ricos aos menores. Foi assim que Grécia, Portugal e Espanha passaram por rápido desenvolvimento nos anos 80 e 90. Agora, os donos da carteira cobram a conta exigindo austeridade fiscal dos novatos. As medidas restritivas, como corte de salários e benefícios públicos na Grécia geraram protestos contra a União Europeia, numa demonstração de que muitos europeus associam suas agruras à adesão ao bloco.

No bloco sul-americano, as assimetrias são igualmente grandes, e, com menor número de países participantes, elas ficam mais evidentes. Talvez por isso ainda estejamos longe de aprovar uma tarifa externa comum, que homogenizaria o preço de importação de produtos de fora do bloco e o tornaria uma união aduaneira perfeita.

Para compensar a assimetria entre os países, o cientista político da UFPR Alexsandro Eugenio Pereira acredita que o Brasil precisa desembolsar mais. A mesma opinião tem o especialista da Divisão de Comércio Interna­­cional da Cepal Sebastián Her­­reros. Para ele, o Brasil poderia fazer mais, a começar pelo au­­mento de verbas destinadas ao Fundo para a Convergência Es­­trutural do Mercosul (Focem), criado para financiar projetos que fomentem o desenvolvimento e coesão social das economias menores – Uruguai e Paraguai.

Pereira acredita que a integração sul-americana só avançará realmente num contexto mais amplo. "Continuar investindo nela se justificaria em termos políticos e econômicos se houvesse uma integração maior, e não só dentro do Mercosul. Se a Unasul (União de Nações Sul-Americanas) avançasse, as assimetrias poderiam ser percebidas de forma mais significativa e seria mais fácil encontrar estratégias para minimizá-las", disse à Gazeta do Povo.

Uma base importante construída pela União Europeia foi o fortalecimento de suas instituições, algo em que o Mercosul ainda precisa trabalhar. Um exemplo é o Tribunal Arbitral do Mercosul, que muitas vezes sequer é acionado para resolver conflitos comerciais – que são comuns num bloco econômico: quanto mais comércio, mais rusgas. "Suspeito que o tribunal não seja usado porque os Estados não lhe dão muita credibilidade, talvez por achar que, após uma sentença, os governos não irão cumpri-la", diz Herreros.

O candidato à Presidência José Serra (PSDB) também já declarou que o Mercosul precisaria de reformas, mas seria difícil que num eventual governo tucano isso fosse feito. Por outro lado, uma eventual continuidade do governo do PT, com Dilma Rousseff, provavelmente não resolveria o baixo comprometimento do Brasil, que, ao contrário do que faz na esfera internacional, mantém um "low-profile" na política regional.

Nesse quesito, o governo Lula fez questão de não se posicionar enfaticamente – o que impede que as coisas mudem. A crítica de Serra quanto a isso foi feroz: "As reuniões de presidentes (membros do Mercosul) parece mais um espetáculo, e avanço concreto não tem", disse, em entrevista concedida em maio.

Se o Brasil assumisse seu papel natural de liderança, como a Alemanha faz na Europa, "o Brasil poderia até colher vantagens como ocupar no futuro um assento permanente no Conse­­lho de Segurança da ONU", avalia Pereira.

Defesa

Uma política coletiva de defesa seria um passo que poderia aprofundar a integração do bloco europeu, mas a integração de forças de segurança entre os países é hoje um tabu. Ela chegou a ser muito debatida, mas está mais distante da realidade do que em qualquer época dos últimos 20 anos, na opinião do especialista em relações governamentais da consultoria Trilogy Advisors LLC, de Washington, John Sitilides.

"Os países têm conferências sobre uma política de defesa unitária, mas na prática não há capacidade para uma força separada da Otan", pondera Sitilides, em entrevista à Gazeta do Povo.

Especialmente agora que os países estão tentando reduzir ao máximo seus gastos com segurança. Por coincidência, é a Grécia quem gasta mais com a pasta, proporcionalmente ao produto interno bruto (PIB). "Enquanto os integrantes da Otan gastam de 1% a 2% do PIB, a Grécia vai até a 5%, por considerar que sofre uma ameaça existencial da Turquia", diz Sitilides.

Na América do Sul, a cooperação em segurança se restringe ao empréstimo de um ou outro helicóptero e ações pontuais nas fronteiras. Se confiar nos vizinhos diante de um tribunal já é difícil, no meio da selva seria muito mais.

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