O especialista em geopolítica e diretor do Centro de Estudos Europeus do Instituto de Ciências Políticas de Paris (Universidade de Sorbonne), Zaki Laïdi, defende o discurso da União Europeia sobre a necessidade de repensar as regras do Acordo de Schengen no que se refere à política de fronteiras. Ele vai além do discurso diplomático ao dizer que os franceses têm o direito de não tolerar as burcas tipo de véu islâmico e que nenhum país está aberto à imigração. Laïdi conversou com a reportagem da Gazeta do Povo na última terça-feita após palestra que proferiu no Centro Universitário Curitiba (UniCuritiba).
As mudanças propostas no Acordo de Schengen, para voltar a haver controle de fronteiras na Europa, não representam um retrocesso para a União Europeia?
As regras de Schengen não vão mudar. Elas podem ser adaptadas às condições que nós estamos encarando. Simplesmente precisamos de novas regras para situações de exceção. Alguns países, como a Dinamarca, querem voltar a controlar as fronteiras, não por causa dos imigrantes africanos, mas por causa da criminalidade. Schengen é muito importante para os europeus e isso não vai mudar.
Que tipo de políticas, então, a Europa pode ter para controlar a criminalidade sem deixar de ajudar os imigrantes?
Não se pode associar imigrantes à criminalidade. Nem todos os imigrantes são criminosos. A melhor solução é manter as populações em seus países. Mas há casos de conflitos, como a Líbia, em que as pessoas precisam de ajuda. Temos que diferenciar os refugiados de guerra daqueles que querem imigrar simplesmente porque é mais fácil para eles.
Esse tipo de política de imigração não caracteriza uma tentativa de fechamento da Europa?
Ao contrário do que dizem, não estamos fechados para o mundo. Recebemos milhares de pessoas por ano na França, por exemplo. É muito mais fácil entrar na França do que no Brasil. Inclusive, é muito difícil para um estrangeiro entrar no Brasil. E não existem países que estejam abertos para o mundo ou fazendo de tudo pelos estrangeiros, nem que queiram ajudar os imigrantes. É difícil em todo lugar. Ninguém quer imigrantes ou certos tipos de imigrantes. Eu descarto a ideia de que nós, europeus, estamos fechados.
E iniciativas como a proibição ao uso de burcas na França não denotam uma resistência a outras culturas?
Temos questões culturais, como a burca, e isso é específico da França, se refere à historia, à identidade do país. A política francesa se constituiu sem influência da religião. Os franceses não querem ver burcas nas suas ruas. E isso faz sentido, é como conduzimos as coisas. Lá também é impossível ver uma imagem cristã em uma escola, porque eles separam o Estado da Igreja.
A União Europeia foi criada para ser uma parceria política e econômica. Mas temos visto situações em que parece difícil existir essa parceria, como quando a Finlândia anunciou que não queria participar da ajuda financeira a Portugal. Como manter a solidariedade entre os países nos momentos de crise?
Os países ricos têm o sentimento de que eles estão pagando por aqueles que não têm disciplina. Se nós queremos ter solidariedade eficaz e apoio da opinião pública, nós precisamos mostrar às pessoas os benefícios dessa união. Demos grande ajuda a Portugal e à Grécia, mas colocamos condições. Não podemos simplesmente dar dinheiro sem ter garantia de que eles vão utilizar de modo correto e fazer reformas adequadas.
Qual o principal desafio da União Europeia hoje?
O maior desafio é como ser unificados sem perder a personalidade de cada um dos Estados nacionais. Estamos em uma situação em que sabemos que precisamos estar juntos, mas, ao mesmo tempo, cada país quer ter suas próprias normas.
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