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Artigo

A marcha suicida dos progressistas

Foi interessante ver o Partido Re­­publicano perder contato com a América real. O que se ti­­nha era um partido liderado por conservadores que não en­­tendiam os colegas mo­­de­­rados, nem tampouco sim­­pa­­tizavam com eles ou com os re­­­presentantes de distritos me­­nos conservadores.

Às reuniões do partido, com o intuito de convencer os demais membros, essa liderança levava pes­­qui­­sas de opinião mostrando que o país a apoiava fervorosamente. Foi sustentada por grupos de interesse e festejada pelos correligionários e pela imprensa simpatizante. Gastou dinheiro público no esforço de comprar apoio, mas acabou desprezada pela na­­ção.

Não é nada interessante ver os democratas perderem contato com a América real. Isso porque o enredo é exatamente o mesmo. A liderança do partido é formada por liberais que, isolados nas grandes cidades e nas regiões costeiras, não entendem a ala moderada nem simpatizam com ela. Contam com as próprias pesquisas de opinião encomendadas e convenientes, mídia favorável e a proteção de correligionários, e, descaradamente, planejam gastar o dinheiro alheio para comprar votos.

Essa ofensiva ideológica não será nem um pouco mais bem-su­­cedida do que a anterior. Uma pesquisa do Washington Post e da ABC News, divulgada na última segunda-feira, confirma o que outros levantamentos do tipo já mostraram. A maioria dos americanos ama a figura de Barack Oba­­ma, mas o apoio às políticas dos democratas vem caindo rapidamente.

A aprovação das medidas de Obama na área da saúde, por exemplo, baixou de 57% para 49% desde abril. Os que as desaprovam eram 29% e agora são 44%. Há bem pouco tempo, em junho, os eleitores com renda maior do que 50 mil dólares ao ano preferiam Obama aos republicanos nesse tema, com diferença de 21 pontos em favor do democrata. Hoje estão divididos, metade para cada lado.

A maior parte dos eleitores in­­dependentes agora desaprova a es­­tratégia de Obama para a saúde. Em março, apenas 32% dos americanos achavam o estilo de Obama ultrapassado, do tipo liberal que aumenta impostos para gastar mais. Hoje 43% pensam assim.

Ainda estamos nos primeiros estágios da marcha suicida dos li­­berais, mas já passamos por três fases. A primeira foi a do pacote de estímulo à economia. Normal­­men­­te, o que se espera de um pa­­cote desse tipo é que seja projetado pa­­ra combater o desemprego e es­­timular a economia durante a re­­cessão. Mas os congressistas do Par­­­­tido Democrata usaram-no como pretexto para gastar em medidas decorativas o montante de 787 bi­­lhões de dólares, novamente di­­nheiro alheio. Apenas 11% desse valor serão empregados até o final do ano fiscal – um tri­­unfo da ideologia sobre o pragmatismo.

E há, ainda, o orçamento. Em vez de apaziguar ansiedades em relação aos déficits, prevê um aumento da dívida do governo da ordem de 11 trilhões de dólares entre 2009 e 2019.

Por fim, há a questão da saúde. Cada uma das acusações clichê de Ann Coulter contra os democratas é gloriosamente confirmada pelas medidas patrocinadas pelo partido nesse tema. Quase nada é feito no sentido de controlar a alta nos custos que se seguiu à reforma do sistema pelo modelo adotado em Massachusetts, sobrecarregado precisamente por não haver controle de gastos. Não se tem a preocupação de premiar os prestadores de serviço eficientes e, menos ainda, de dar um jeito nos ineficientes.

A reforma aumentará em 239 bilhões de dólares o déficit federal nos primeiros dez anos, segundo a Comissão de Orçamento do Con­­gresso. Pequenos negócios teriam a folha de pagamento acrescida em 8%. Os porcentuais mais altos de tributação ultrapassariam os de Itália e França. Nas faixas de renda mais elevadas, os moradores de Nova Iorque e da Califórnia teriam de entregar mais de 55% do que ganham a uma ou outra instância do governo.

Nancy Pelosi tem índices de aprovação mais baixos do que os de Dick Cheney e muito mais baixos do que os de Sarah Palin. E mesmo assim os democratas têm permitido que domine a cena no Congresso – esta é uma época na qual os independentes prevalecem na paisagem eleitoral. Quem irá impedir essa onda esquerdista? Há alguns meses, parecia que Obama conduziria uma coalizão de centro-esquerda. Em vezes disso, tema após tema, tem cedido às velhas raposas do Capitólio.

Maquiavel afirmou que um líder deveria ser tanto temido quanto amado. Obama é amado, mas não temido, pela liderança do Partido Democrata. Na questão da saúde, o presidente havia chamado a atenção para o controle de gastos. A liderança não levou isso em conta porque não o teme. Na política ambiental, Obama fez campanha contra o relaxamento das compensações por poluição. A liderança votou uma lei própria, estabelecendo precisamente isso, porque não tem medo do presidente. Quanto aos impostos, Oba­­ma prometeu que a tributação má­­xima não subiria acima dos níveis da Era Clinton. A liderança ignorou a promessa porque, mais uma vez, não o teme.

Na semana passada, o governo anunciou a proposta de que as decisões sobre gastos na saúde pú­­blica sairão das mãos do Congresso para ficar a cargo dos tecnocratas do Executivo. É uma boa ideia, que pode levar a uma real economia de custos. Mas não há motivos pa­­ra achar que a medida será incorporada à legislação final para o setor. A liderança dos democratas jamais cederá poder a uma administração da qual não toma conhecimento.

A bola está com os moderados do partido. Esses bravos parlamen­­tares vêm tentando conter o rombo fiscal. O problema é que, por serem moderados, não têm influência (são representantes de distritos nem sempre alinhados aos de­­mocratas). Acabam seduzidos pe­­la liderança, no final das contas. E aqui vamos nós de novo. To­­da no­­va maioria tende a superestimar seus poderes. Já vimos esse fil­­me. Ainda o veremos outras vezes.

Tradução: Christian Schwartz

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