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Arqueologia

A música na Idade da Pedra

Flauta feita de osso encontrada em uma caverna na Alemanha mostra que há 35 mil anos os humanos já desenvolviam atividades musicais

 | Sascha Schuermann/AFP
(Foto: Sascha Schuermann/AFP)

Ulm, Alemanha - Há mais de 35 mil anos, durante a parte mais intensa da última era do gelo, o som da música preencheu o vazio de uma caverna localizada hoje no sudoeste da Alemanha, o mesmo lugar em que o Homo sapiens primitivo esculpia os primeiros exemplos de arte figurada do mundo. Música e escultura, expressões da criatividade artística, começaram então a espocar entre os primeiros humanos modernos conforme eles foram povoando a Europa e o resto do mundo.

Arqueólogos anunciaram nesta semana a descoberta de uma flauta feita de osso e dois fragmentos de flautas de marfim com cinco orifícios para os dedos. Os objetos, considerados "os instrumentos musicais mais completos retirados das cavernas", foram encontrados na caverna Hohle Fels, nas montanhas localizadas a oeste de Ulm, Alemanha.

Uma flauta mais simples com apenas três orifícios feita com marfim de mamute foi descoberta há alguns anos em outra caverna próxima, assim como duas outras flautas feitas com ossos de asas de cisne. Nessa mesma caverna, os arqueólogos também encontraram belíssimas esculturas de animais. Entretanto, todos os artefatos encontrados até hoje nunca foram precisamente datados, o que impossibilitou precisar a ascensão da música no decorrer da história.

As evidências mais concretas de instrumentos musicais foram encontradas inicialmente na França e Áustria, mas eram muito mais recentes dos que os objetos revelados nesta semana.

Em um artigo publicado no site da revista científica Nature, Nicholas J. Conard, da Universidade de Tuebingen, na Alemanha, comentou: "Os achados de Hohle Fels demonstram a presença de uma tradição musical bem estabelecida durante a época que os humanos modernos colonizaram a Europa".

Apesar de a identificação, realizada pela análise do carbono radioativo, ser imprecisa, amostras e ossos foram testados por dois laboratórios independentes, na Inglaterra e na Alemanha, usando métodos diferentes. Os cientistas confirmaram que as datas passadas por ambos os laboratórios foi de, no mínimo, 35 mil anos.

A equipe de Conard disse que foi encontrada uma abundância de artefatos de pedra e marfim, pontas de flechas e objetos de pedras e ossos lascados. Aparentemente, muitas pessoas viveram e moraram nessa região da Alemanha assim que chagaram à Europa, há aproximadamente 40 mil anos, 10 mil anos antes da extinção completa dos Neanderthais nativos. Os Neanderthais, parentes próximos dos humanos, não deixaram evidências concretas de terem se desenvolvido musicalmente.

Dos artefatos recentemente encontrados, o mais importante foi uma flauta feita com um osso de abutre. A parte preservada do instrumento mede quase 22 cm e inclui o orifício através do qual o músico assoprava. O escultor do instrumento entalhou duas fendas profundas em forma de V e quatro linhas finas próximas aos orifícios para os dedos. A ponta final do instrumento aparenta estar quebrada, mas devia medir 5 cm, visto o tamanho regular do osso do qual foi feita a flauta.

A descoberta de uma flauta de marfim com três furos em 2004, realizada por Conard na caverna Geissenkloesterle, próxima a Ulm, também inspirou o cientista a ampliar suas buscas nas cavernas da região. Conard acredita que o sul da Alemanha "pode ter sido um dos berços da cultura humana".

Harmônicos

Friedrich Seeberger, um especialista alemão em música antiga, usou a flauta de marfim como modelo para fazer um instrumento semelhante em madeira. Ao fazer testes com a flauta "inteira", o músico descobriu que o instrumento produzia uma gama de notas musicais comparável às notas reproduzidas pelas flautas modernas. "Os tons são bem harmônicos", disse.

Com relação à flauta com cinco orifícios, cuja descoberta foi anunciada nesta semana, ainda não foi feita uma réplica, mas os arqueólogos disseram esperar que o maior diâmetro do instrumento consiga produzir um número comparável de notas e possibilidades musicais, ou até maior.

Os arqueólogos alemães acreditam que "a música na Idade da Pedra pode ter contribuído na manutenção de redes sociais mais abrangentes, e assim, talvez, acabou por ajudar na expansão demográfica e territorial dos humanos modernos".

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