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Assista à reportagem em vídeo| Foto: TV Globo

Curitiba – Daqui a exatamente um mês, quando Tony Blair deixar o número 10 de Downing Street, tradicional sede do governo britânico, as três principais economias da Europa terão completado um ciclo de renovação de seus líderes: Ângela Merkel, na Alemanha, Nicolas Sarkozy, na França e Gordon Brown, no Reino Unido, são a nova cara da política européia. À frente dos três, o desafio de recolocar o continente no rumo do crescimento econômico e de aprofundar a integração do bloco.

Após uma idealizada e dualista campanha entre esquerda e direita, Sarkozy, um conservador, inicia o mandato querendo mostrar que seu governo está aberto a outras linhagens políticas. O escolhido para ocupar o cargo de ministro das Relações Exteriores, Bernard Kouchner, por exemplo, é um socialista (pero no mucho, foi a favor da invasão no Iraque), fundador da ONG Médicos Sem Fronteiras. Dos 15 ministros que compõem seu gabinete, sete são mulheres, uma com nome e sangue árabe, Rachida Dati (da Justiça), filha de pai marroquino e mãe argelina.

"Essa é uma aposta corajosa. Ela vem acompanhada de uma novidade no discurso político de um homem relativamente jovem – ele tem 52 anos de idade –, que não recusa comparação com Kennedy e que considera que a política tem que ter uma dose de glamour, ou seja, tem que seduzir mais do que irritar ou provocar rejeição", diz Estevão Rezende Martins, coordenador do Núcleo de Estudos Europeus da Universidade de Brasília (UnB).

Gordon Brown, que assume a Grã-Bretanha, é novo na titularidade do cargo, mas faz parte do governo Blair desde seu início, como ministro da Fazenda. Sua chegada à liderança do Partido Trabalhista e, portanto, como premier, é um repeteco do que fizeram os conservadores em 1990, quando John Major, então também ministro da Fazenda, tomou o lugar de Margaret Thatcher, buscando dar novo fôlego ao governo e vencer as eleições seguintes, como de fato ocorreu – e como pretendem agora os trabalhistas.

"Embora o governo britânico tenha assumido coletivamente a responsabilidade da decisão pelo Iraque, Gordon Brown não tem o desgaste em seu nome, como tem Tony Blair. Com isso o partido resolve um outro problema: a idéia de que Blair não poderia desfazer alguma medida, porque seria uma espécie de confissão pública de ter pisado na bola. Brown pode desfazer, porque ele pode dizer: ‘estamos numa nova fase’", analisa Martins, referindo-se a uma eventual retirada das tropas britânicas do Iraque.

Merkel, Sarkozy e Brown – os três da mesma geração – possuem muito mais afinidades do que o trio anterior (Schroeder, Chirac e Blair). Na presidência da UE até 1.º de julho, a chanceler alemã quer deixar o terreno aplainado para a aprovação da Constituição Européia. Nesta última semana, ela visitou líderes europeus para discutir o novo texto, bem mais modesto do que aquele barrado por franceses e holandeses em 2005. A carta antiga, um verdadeiro Frankenstein de remendos, passou por um "emagrecimento" e está com cerca de 1/3 de seu tamanho anterior. Do original, restaram apenas as partes que tratam da estrutura de arquitetura do processo decisório da UE e das instituições do bloco. A parte politicamente complexa, e que não raro servia à interesse de apenas um ou outro país, será discutida em negociações pontuais.

Como muitos especialistas apontam que o "não" francês tem muito mais a ver com uma insatisfação interna do que com a Constituição em si, uma mudança de opinião do eleitorado francês não será surpresa. O presidente francês, ao tomar posse, disse que a "França está de volta à Europa". "Todo mundo estava esperando um gesto da França. Há um grande interesse nisso. O próprio Sarkozy está propondo um tratado mínimo, com mudanças na ponderação de votos, como a votação por maioria qualificada. O fato de tudo ter de ser decidido por unanimidade, como é hoje, está bloquenado o andamento do bloco", afirma o professor de História da Universidade de Sorbonne, em Paris, Luis Felipe de Alencastro.

Brown é mais enigmático sobre sua política externa. Garante que não será mais um "poodle" de Bush, como Blair tem sido chamado, mas nem por isso trocará Washington por Bruxelas. Como o homem do cofre inglês por 10 anos, sempre fez oposição ao protecionismo agrícola europeu e é inclusive rotulado por alguns como um "eurocético". Tem a seu lado, no entanto, líderes preocupados com a arrumação da própria casa, como Merkel e, ao que parece, Sarkozy, além do português José Manuel Barroso, um liberal, à frente da Comissão Européia, o que pode acabar atraindo-o para a UE.

O fato é que, há meio século, os europeus sabem que para manterem o bem-estar econômico e o peso político da Europa terão de ficar unidos. Após um momento de paralisação e dúvida, esta é uma boa oportunidade de seguirem em frente.

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