• Carregando...
O Grande Colisor de Hádrons (LHC): uma chance para testar as mais revolucionárias teorias da Física | Fabrice Coffrini/AFP
O Grande Colisor de Hádrons (LHC): uma chance para testar as mais revolucionárias teorias da Física| Foto: Fabrice Coffrini/AFP
  • Entenda como funciona o colisor de partículas

Genebra - Mais de um ano após ter saído de operação, o Grande Colisor de Há­­drons (LHC, na sigla em inglês), está pronto para ser utilizado no­­vamente. Em dezembro, se tudo der certo, os prótons começarão a ser colididos entre si em um túnel subterrâneo entre a França e a Suíça na busca por forças e partículas que dominaram o primeiro trilionésimo de segundo do Big Bang, a explosão que teria dado origem ao Universo.

A maior e mais cara experiência física do mundo também será a chance de testar as mais bizarras e revolucionárias teorias da ciência. Não se trata de outras di­­mensões no espaço-tempo, ma­­téria negra ou até mesmo buracos-negros que podem devorar a Terra. Trata-se da tese de que o colisor está sendo sabotado pelo seu próprio futuro. Dois físicos chegaram a sugerir que a hipotética Bóson de Higgs (partícula fundamental que confere massa às outras partículas), que os físicos esperam produzir com o colisor, possa ser tão abominável à na­­tureza que a sua própria criação poderia ricochetear no tempo e parar o colisor antes que ele conseguisse produzi-la. Seria como uma espécie de viajante do tempo que visitasse o passado para ma­­tar o próprio avô.

Holger Bech Nielsen, do Niels Bohr Institute, em Copenhague (Dinamarca), e Masao Ninomiya, do Yukawa Institute for Theoreti­­cal Physics, em Kyoto, no Japão, defenderam essa idéia em vários artigos, com títulos como "Teste de efeito do futuro no Grande Colisor de Hádrons: uma proposta" e "Busca pela influência futura do LHC", postados no website sobre Física arXiv.org em 2008.

"Prevemos que todas as má­­quinas que produzirem partículas de Higgs terão pé-frio", declara Nielsen. Em um ensaio não publicado, ele faz declarações complementares sobre a teoria: "Bem, alguém até poderia dizer que te­­mos um modelo de Deus. Caso essa pessoa acredite nisso, devo dizer que Deus deve odiar as partículas de Higgs e sempre tenta evitá-las".

A influência maligna do futuro, argumentam os cientistas, po­­de explicar o porquê do projeto do Supercolisor dos EUA, conhecido com Tevatron, também de­­senvolvido para encontrar Higgs, ter sido cancelado em 1993, apesar dos bilhões de dólares gastos nele, um evento tão improvável que Nielsen o chama de "anti-milagre".

Essa teoria parece ser mais uma evidência de que as pessoas já tiveram muito tempo – talvez até tempo demais – para pensar no que pode sair do LHC, que le­­vou 15 anos para ser construído e custou mais de US$ 9 bilhões.

O colisor foi montado pelo Conselho Europeu para a Pesqui­­sa Nuclear (CERN), com a finalidade de acelerar prótons a energias de 7 trilhões de elétrons-volt em um túnel subterrâneo de 27 km e então colidi-los entre si, criando "bolas de fogo primordiais".

Nielsen e Ninomiya começaram a defender suas teorias apocalípticas no primeiro semestre de 2008. Mais tarde no mesmo ano, após o colisor do CERN ter sido acionado, a conexão entre seus dois ímãs vaporizou, o que acarretou no desligamento do apa­­relho por mais de um ano.

Nielsen diz que o evento foi "algo engraçado que nos força a acreditar em nossa própria teoria". O cientista concorda que o ceticismo faz parte do processo. Afinal de contas, a maioria dos grandes processos científicos, incluindo o Telescópio Espacial Hubble, passou por um período "pé-frio". No CERN, essa tendência se mantém: a polícia francesa prendeu no final da semana passada um físico que trabalhava em um dos projetos do colisor sob a suspeita de conspiração e ligação com a Al-Qaeda.

Nielsen e Ninomiya propuseram uma espécie de prova: o CERN deve se engajar em um jogo de azar, um exercício de "tirar cartas" usando talvez um gerador escolhido ao acaso a fim de discernir a má-sorte do futuro. Se o re­­sultado for suficientemente im­­provável, digamos tirar uma carta de espadas em um baralho com 100 milhões de copas, a máquina poderia ou não funcionar por completo ou operar apenas com energias fracas demais para se encontrar partículas Higgs.

Obviamente, isso é loucura e o CERN não deve e não vai penhorar todos os seus investimentos para tirar cara ou coroa. A teoria foi tratada por alguns blogs como algo similar aos contos de Harry Potter. Todavia, a loucura tem sua vez na física, que rotineiramente fala sobre gatos estarem vivos e mortos ao mesmo tempo e também sobre a gravidade estar sendo expelida do universo.

Como Niels Bohr – saudoso compatriota de Nielsen e um dos fundadores da teoria quântica –disse uma vez a um colega: "Nós todos já concordamos que a sua teoria é loucura. A questão que nos divide é saber se ela é loucura o suficiente para ter chances de ser correta".

Nielsen já está versado nesta tradição. Ele ganhou fama na física por ser um dos fundadores da Teoria das Cordas (teoria que propõe unificar toda a física e unir a Teoria da Relatividade e a Teoria Quântica numa única estrutura matemática) e um grande e original pensador, "uma daquelas pessoas extremamente inteligentes dispostas a ir bem longe atrás de ideias malucas", nas palavras de Sean Carroll, físico do Instituto de Tecnologia da Califórnia.

Outro projeto de Nielsen é um esforço para demonstrar como o universo que conhecemos, com toda a sua regularidade aparente, pode se tornar completamente aleatório, um assunto que ele chama de "dinâmica aleatória".

Viagem no tempo

Nielsen admite que sua nova teoria, elaborada em conjunto com Ninomiya, sobre a viagem no tem­­po, um interesse de longa data, se tornou um assunto de pesquisa respeitado nos últimos anos. Ape­­sar do paradoxo em se voltar no tempo e matar o próprio avô, os físicos concordam que não existe qualquer paradoxo se alguém voltar no tempo para impedir que o avô seja atropelado por um ônibus. Apesar de tudo, ainda não é possível termos certeza de que produzir partículas Higgs seria uma catástrofe. Se soubéssemos, provavelmente não estaríamos tentando produzi-las.

Sempre presumimos que o passado influencia o futuro. To­­davia, isto não é necessariamente verdade na física de Newton ou Einstein. De acordo com os físicos, tudo o que é necessário saber, matematicamente falando, para se descrever o que acontece com uma maçã ou 100 bilhões de galáxias no universo durante o passar do tempo são as leis que descrevem como as coisas mudam e uma declaração de onde começaram, sendo a última a chamada condição-limite – a maçã 2 me­­tros acima da sua cabeça ou o Big Bang.

As equações funcionam perfeitamente, como enfatizaram Nielsen e outros, se as condições-limite especificarem a condição no futuro (a maçã sobre a sua ca­­beça) ao invés do passado, desde que as leis fundamentais da física sejam reversíveis, o que muitos físicos acreditam ser verdade.

"Para aqueles de nós que acreditam na física, a divisão entre passado, presente e futuro não passa de uma ilusão", escreveu Einstein uma vez a um amigo.

No romance As Sereias de Titã, de Kurt Vonnegut, toda a história humana é reduzida à entrega de uma peça de metal do tamanho de um abridor de latas para um alienígena encalhado na lua de Saturno para que ele possa arrumar sua nave espacial e voltar para casa.

Saber se o colisor terá um destino humilde ou nobre – se é que terá algum destino—ainda é um mistério.

0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]