A eleição presidencial do Egito assumiu a forma de uma corrida pelo poder com muitas interesses em jogo e regras muito pouco definidas.
Sobram perguntas sobre quem deverá redigir uma nova Constituição, que tipo de autoridade terá o novo chefe de Estado, particularmente no que condiz ao Legislativo, e qual papel o Exército poderia ter nesse sistema político nascente.
Com candidatos que variam entre o movimento revolucionário, islamistas e membros da velha guarda lutando pela liderança, a eleição poderia ser uma oportunidade final para o governante de fato do Egito, o Conselho Supremo das Forças Armadas (CSFA), ajudar a produzir uma transição política segura e genuína.
O CSFA, um corpo formado pelos 20 principais oficiais militares do Egito, outrora liderado por Hosni Mubarak, foi inicialmente recebido como um defensor da revolta, mas seu gerenciamento autoritário da transição e suas decisões aparentemente paradoxais corroeram parte da boa vontade de que gozava no mês de fevereiro deste ano.
Hoje, o Conselho se encontra entre o fogo e a frigideira. Historicamente, o CSFA se considerava o único agente nacional com legitimidade, capacidade e sabedoria para proteger o país de ameaças estrangeiras e domésticas. Mas agora ele está sendo forçado a responder a exigências cada vez maiores por mudanças políticas, feitas por um movimento de protesto mobilizado, e à ascensão política dos islamistas há muito perseguidos.
Esses desenvolvimentos vão contra sua natureza conservadora e sua profunda ligação à estabilidade e à continuidade. De certo modo, o Exército tem sido o encarregado de administrar o próprio processo que pouco a pouco tem consumido suas quase sete décadas de prerrogativas políticas e econômicas.
Os generais certamente não gostam muito de governar, mas com a segurança em baixa, a volatilidade no Sinai e os problemas nas regiões vizinhas da Faixa de Gaza, Líbia e Sudão, eles estão relutantes agora em confiarem numa liderança civil ainda não provada. Tampouco eles aceitam as tentativas de minar seu estatuto privilegiado, que incluem um orçamento em sua maior parte além do controle civil, imunidade virtual à processos legais e relações de negócios importantes em pontos chave da economia.
Mais do que nunca, o Cairo precisa de um consenso para encerrar a paralisia econômica e política que tem sofrido durante os 18 meses de sua transição, e precisa consegui-lo rapidamente para cumprir com as expectativas salientes daqueles que participaram da revolta do dia 25 de janeiro, e da maioria que ainda sofre para suprir suas necessidades básicas como alimentação e assistência de saúde.
Essa poderá ser a última chance que os generais terão de produzir pacificamente um sistema político equilibrado e democrático capaz de refletir a proeza eleitoral da Irmandade Muçulmana e as aspirações democráticas do movimento de protesto, ao mesmo tempo em que protegeria os interesses tão cruciais para os militares. No fim de contas, o CSFA deverá se afastar e deixar o caminho livre para as instituições civis eleitas democraticamente; o truque é garantir que isso ocorra com ordem, segurança e dignidade.
Yasser M. el-Shimy, especialista em Oriente Médio do International Crisis Group.
Tradução: Adriano Scandolara.



