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No fim de outubro, um homem entrou em uma sinagoga em matou 11 judeus, o maior ataque antissemita nos EUA | BRENDAN SMIALOWSKI/AFP
No fim de outubro, um homem entrou em uma sinagoga em matou 11 judeus, o maior ataque antissemita nos EUA| Foto: BRENDAN SMIALOWSKI/AFP

A professora de psicologia abriu as pesadas portas de carvalho do Horace Mann Hall, com teto de 6 metros de altura e pisos de madeira envernizada, e foi para o escritório do quarto andar. Enfileirados atrás dela estavam os estudantes, a espera de uma aula que começaria às 13h30 na quarta-feira. Quando entraram no espaço de trabalho, passaram por uma mezuzá, uma pequena caixa contendo textos religiosos hebraicos, afixada na ombreira da porta. 

Mas a visão que os encontrou em seguida fez com que a professora e seus alunos parassem. 

Um grafite antissemita havia sido pintado com spray nas paredes do escritório de Elizabeth Midlarsky, psicóloga clínica e estudiosa do Holocausto no Teachers College de Columbia, no Upper West Side de Nova York. O vandalismo incluía suásticas e um insulto antissemita, "Yid", pintado em vermelho vivo nas paredes brancas do escritório. A porta externa estava fechada, mas não trancada, segundo um aluno.  

"Fiquei chocada. Não pude acreditar", disse ela em entrevista ao Washington Post. "Normalmente não sou uma pessoa medrosa, mas eles me pegaram. Estou com medo". 

Midlarsky notificou a segurança e ela disse que o Departamento de Polícia de Nova York estava investigando o incidente. A professora contou que "não tinha ideia de quem estava por trás disso". 

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O episódio ocorre em meio a crescentes preocupações sobre o antissemitismo, revitalizado para o século 21, ao passo que a memória do Holocausto começa a desvanecer. Em fevereiro, a Liga Antidifamação, organização judaica internacional com sede nos Estados Unidos, informou que o número de incidentes antissemitas foi quase 60% maior em 2017 do que em 2016, marcando o maior aumento registrado em um ano e o segundo maior número registrado desde que a organização começou a coletar dados de incidentes. Enquanto isso, muitos americanos não têm conhecimento básico sobre o Holocausto, como saber o nome de um único campo de concentração, de acordo com uma pesquisa divulgada em abril. 

O problema não se limita ao tipo de simbolismo que marcou as paredes do escritório do professor. Faz pouco mais de um mês desde que 11 judeus foram massacrados em uma sinagoga de Pittsburgh, o ataque antissemita mais mortal da história dos EUA. 

O preconceito também não é limitado aos Estados Unidos. Um em cada três europeus acredita que os judeus usam o Holocausto para "promover suas próprias posições ou objetivos", segundo uma pesquisa da CNN divulgada esta semana. 

Medo de ficar sozinha

Documentar o verdadeiro legado do Holocausto na vida judaica tem sido o foco do trabalho acadêmico de Midlarsky. Ela aplicou a psicologia clínica ao significado do resgate durante o genocídio dos judeus europeus no século XX e a resposta dos sobreviventes e seus descendentes. Em um artigo de 2005, "Correlatos de personalidade do resgate heroico durante o Holocausto", ela perguntou se certos traços de personalidade, como tolerância e empatia, poderiam ajudar a explicar por que algumas pessoas se tornaram "heróis não judeus" durante o Holocausto. 

O vandalismo descoberto na quarta-feira não foi a primeira vez que seu escritório foi manchado pela iconografia antissemita. Em 2007, ela se tornou alvo de assédio constante. Naquele ano, uma suástica foi pintada na porta de seu escritório cerca de uma semana depois de ela ter encontrado dois panfletos antissemitas em sua caixa de correio no trabalho. 

"Eu acho que há uma pessoa muito cheia de ódio que é uma extrema covarde”, disse ela ao New York Sun na época. "Faz meu sangue gelar." 

Na mesma época, uma forca foi encontrado na porta do escritório de um professor negro do Teachers College. Esses incidentes foram condenados por líderes do colégio, a primeira e maior escola de pós-graduação do país, como crimes de ódio. 

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Na quarta-feira, quando Midlarsky novamente se viu alvo do antissemitismo, o presidente do Teachers College, Thomas Bailey, divulgou um comunicado prometendo trabalhar com a polícia "para descobrir o autor desse ato odioso". 

"Nós condenamos inequivocamente qualquer expressão de ódio, que não tem lugar na nossa sociedade", disse ele. "Estamos indignados e horrorizados por este ato de agressão e uso deste vil símbolo antissemita contra um membro valorizado da nossa comunidade". 

Midlarsky atribuiu o graffiti a um "tremendo aumento no antissemitismo", mas disse que não conseguia entender por que ela havia sido escolhida como alvo. 

A experiência, ela disse, diferia de uma década atrás, quando ela estava "chocada, mas não surpresa" em enfrentar o abuso antissemita. Naquela época, ela estava ativa nos debates do campus sobre o sionismo, conflitos religiosos e o conflito no Oriente Médio. Em particular, ela se envolveu em protestos contra o discurso do presidente iraniano, Mahmoud Ahmadinejad, em setembro de 2007, na universidade da Ivy League. 

"Naquela época, eu estava fazendo coisas pelas quais os antissemitas me odiariam, mas eu não tenho estado tão visível recentemente", disse ela na noite de quarta-feira. 

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Esse fato, continuou, a fez se sentir ainda mais vulnerável, como se sua identidade judaica fosse suficiente para torná-la um alvo. 

"Sou judia nessa faculdade – uma das únicas que age como judia", acrescentou, sugerindo que não se esquiva de sua identidade religiosa. "Minha escrita tem a ver com tópicos judaicos".

Depois que Midlarsky descobriu o vandalismo e chamou a segurança, ela esperou com seus alunos, que tiraram fotos e verificaram o quão extenso era o vandalismo. 

"Eu estava com medo de ficar sozinha", disse ela. "Eu estava com medo de estar sozinha no meu escritório".

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