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Cristina e Néstor elaboram pacto para a economia

Buenos Aires – A presidente eleita Cristina Kirchner e o presidente Néstor Kirchner estão – junto com seus assessores – elaborando o "Pacto Social" com o qual esperam proporcionar uma base sólida para que o crescimento da economia argentina – que nos últimos quatro anos chegou a 49% de aumento acumulado do Produto Interno Bruto (PIB) – se consolide e continue. A ambição dos Kirchner é realizar um Pacto da Moncloa à moda argentina, em alusão ao acordo entre partidos políticos, sindicatos e empresários realizado no final da década de 1980 na Espanha, que permitiu que o país se desenvolvesse economicamente

A idéia é poder fechar o pacto dos Kirchner pelo menos até o Natal. No pior dos casos, adiar seu lançamento para o verão. O acordo implicará uma dura negociação de duas variáveis cruciais, o aumento de preços e salários.

Um terceiro ponto, também de alta importância, será o compromisso para investimentos por um prazo de três anos. Os empresários, neste caso, esperam que o governo lhes garanta que não ocorrerão restrições energéticas tal como as padecidas entre maio e agosto passado. Para estimular os investimentos no setor energético, o governo está preparando uma liberação parcial das tarifas dos serviços públicos privatizados, congelados desde 2002.

No geral, o plano dos Kirchner para 2008 – e se possível nos dois anos seguintes – é definir um cenário no qual a inflação seja contida e ao mesmo tempo, a economia cresça.

Buenos Aires – Rosendo Fraga é um dos mais conhecidos analistas políticos da Argentina. Diretor do Centro de Estudos União para a Nova Maioria, em Buenos Aires, ele falou para a Gazeta do Povo sobre a eleição de Cristina Kirchner e o que esperar do próximo governo. Para ele, Cristina está apostando as fichas na vitória de Hillary Clinton nos Estados Unidos para se aproximar de Washignton. Não irá, todavia, se distanciar do presidente da Venezuela, Hugo Chávez, sobretudo por razões econômicas. "A Argentina seguirá oscilando entre Brasil e Venezuela, mas um pouco mais em torno da última", prevê. O professor de História do Direito na Universidade Católica Argentina diz também que a crise energética no país vai se intensificar. Confira os principais trechos da entrevista.

O legado de Néstor

"O positivo do governo de Néstor Kirchner foi a reconstituição do poder político presidencial, debilitado pela crise 2001-2002. Também soube aproveitar o crescimento econômico e reponder, pelo menos até 2007, às requisições da opinião pública. O negativo: aumentou o desquilíbrio de poderes em favor do Executivo; diminuiu a pobreza e o desemprego, mas não a desigualdade."

Corrupção afetou, sim

"Nos últimos meses, as seguidas denúncias de corrupção afetaram o governo, mas não o suficientemente para que não ganhasse. Em março, Cristina tinha 60% dos votos e agora teve 45%. O oficialismo perdeu 15 pontos em sete meses. As denúncias de corrupção, de manipulação dos dados do Indec e as restrições energéticas foram as causas, mas a oposição não soube aproveitar esta situação."

Um casal no poder

"Não há um caso similar no mundo como o que se registra na Argentina, de um casal se sucedendo imediatamente no poder. No entanto, cabe assinalar que a cultura política latino-americana – em qual se inscreve o personalismo e o nepotismo da política argentina –, ainda que muito diferente da do mundo desenvolvido, tem curiosas coincidências com a das novas democracias européias. Na Polônia – um país importante naquele continente – estavam governando, até a recente derrota eleitoral, dois irmãos gêmeos, um presidente e outro primeiro-ministro, sem que os cidadãos pudessem diferenciar quem era quem. Este caso é mais curioso que o casal Kirchner se sucedendo na Argentina."

Evita e Perón

"Quanto ao casal Kirchner e a comparação com Perón e Evita, há mais diferenças do que coincidências. A similaridade é que se trata de um casal compartindo o poder e que não o exercem de forma concentrada e pragmática. A diferença central é que Perón e Evita eram genuinamente populares nos setores mais desprezados e os Kirchner não são. Perón e Evita realizaram uma política de massas, enquanto a dos Kirchner é uma política de pompa, ostentação. Os primeiros fizeram uma reforma social importante – não uma revolução – enquanto que os Kirchner mantiveram o status quo."

Mulheres e o peronismo

"Historicamente, desde Evita Perón – mais de 60 anos atrás –, é normal na cultura do peronismo que a mulher líder tenha um rol político próprio. Também o teve a mulher seguinte de Perón, Isabelita, que chegou à presidência nos anos setenta, quando faleceu o marido e era a sua vice-presidente. Na eleição de 2005, a briga principal na província de Buenos Aires foi entre Cristina e a esposa do ex-presidente Duhalde, a atual senadora Hilda Duhalde."

Hillary Clinton

"A comparação de Cristina com Hillary Clinton tem três diferenças. A primeira é que se a senadora por Nova Iorque ganhar, será depois de vencer Barack Obama numa primária difícil, enquanto que Cristina foi diretamente nomeada por seu marido. Se a senadora Clinton chegar ao poder, será depois de oito anos de governo republicano e não depois de seu marido, como a senadora Kirchner. Por último, nos Estados Unidos, Clinton não pode voltar a ser presidente nunca mais, enquanto Néstor Kirchner pode voltar em 2011 por mais oito anos."

Política externa

"O projeto político de Cristina é o mesmo do seu marido. Em política exterior ela implica uma drástica mudança de estilo diplomático, aceitando as regras das relações internacionais que seu marido combate, mas as linhas centrais se manterão. Por essa razão, Cristina não mudará substancialmente a relação com o presidente venezuelano Hugo Chávez. Seu marido deixa uma pendência de compra de bônus, de importações de gás para solucionar a crise energética e de alguns outros negócios em andamento, o que impede Cristina de se afastar do mandatário venezuelano. A Argentina seguirá oscilando entre Brasil e Venezuela, mas um pouco mais em torno da última."

Wasghington

"A respeito da relação entre Argentina e Washington, a estratégia central de Cristina é a de manter uma boa relação com Hillary e apostar em seu triunfo. Desta forma, a relação com Bush não será boa porque Cristina aposta abertamente em um eventual governo de Hillary Clinton."

Crise energética

"A crise energética é uma realidade que vai se intensificar seguramente na gestão de Cristina. Até agora, o governo não se mostrou disposto a enfrentar o problema mudando a política atual que impede o investimento, e os empresários preferem evitar o tema em suas manifestações públicas."

A dinastia Kirchner

"A existência de uma suposta dinastia Kirchner gera um repúdio da classe média argentina, que em geral vota com a oposição e historicamente não tem sido peronista. Todavia, o repúdio é muito menor nos setores populares, onde a tradição peronista é mais forte."

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