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Iraquianos ignoram ordem de hastear a bandeira nacional, optando por símbolos da religião ou etnia | Karim Kadim/Associated Press
Iraquianos ignoram ordem de hastear a bandeira nacional, optando por símbolos da religião ou etnia| Foto: Karim Kadim/Associated Press

Nos postos de controle em Bagdá, soldados desafiaram uma ordem recente do primeiro ministro de remover bandeiras religiosas xiitas e substituí-las por bandeiras do Iraque. Nas escolas em Kirkuk, estudantes ergueram bandeiras curdas. E na cidade de Basra, cidadãos furiosos desenharam sua própria bandeira, com uma imagem de uma gota de petróleo.

E há também as bandeiras negras do Estado Islâmico, o grupo extremista que controla cerca de um terço do país. Nunca, desde que o Iraque moderno foi criado há quase um século pela fusão de três províncias otomanas — Bagdá, Basra e Mosul —, tantas pessoas desafiam a ideia do país como um Estado unificado.

Agora que o novo governo luta para derrotar os militantes do Estado Islâmico, também conhecido por EIIL ou EIIS, enfrenta também um desafio que pode ser ainda mais difícil: promover um novo sentido de identidade nacional que, mesmo que não possa transcender as diferenças entre sunitas e xiitas, árabes e curdos, pelo menos consiga mantê-los juntos como compatriotas.

Algumas autoridades pedem o restabelecimento do serviço militar obrigatório, na crença de que isso pudesse unir as comunidades. Outros sugerem promover casamentos mistos entre sunitas e xiitas.

"A questão da identidade — uma com que todos os iraquianos concordem para que o Estado permaneça unido — é séria. Essa é uma busca por uma nova visão do Iraque", disse a historiadora Phebe Marr.

A TV estatal promove uma enxurrada de propaganda. Ela mostra o poeta iraquiano Douglas al-Maliki recitando poemas patrióticos, às vezes em uniforme militar e segurando uma arma. Seu objetivo, segundo ele, é "promover a unidade nacional e a convergência de pontos de vista e conclamar uma coexistência pacífica e a não violência entre as comunidades". Graças a isso, recebeu inúmeras ameaças de morte.

Em um recente decreto, o primeiro-ministro Haider al-Abadi ordenou que as forças armadas não utilizem bandeiras religiosas xiitas nem de milícias. Há tempos essas bandeiras enfurecem a minoria sunita do Iraque, que governava o país antes da invasão americana. Essa determinação de Abadi foi elogiada pelo representante do Iraque das Nações Unidas em um discurso em Nova York como a primeira etapa de "uma iniciativa mais ampla para restaurar a confiança entre as comunidades iraquianas".

Mas as bandeiras xiitas não desapareceram.

"As identidades secundárias — culturais, religiosos, étnicas — prevalecem. Cada um foi para seu canto", disse Mowaffak al-Rubaie, ex-conselheiro de Segurança Nacional do Iraque.

A luta pela identidade nacional persiste desde a fundação do país moderno após a Primeira Guerra Mundial e desafiou monarcas, ditadores e ocupantes do Iraque.

Sob os otomanos, a identidade primária era simplesmente ser muçulmano. Depois que os britânicos assumiram o comando, a ideologia do nacionalismo árabe uniu muitos líderes iraquianos. Mais tarde, Saddam Hussein e seu partido, o Baath, governaram com punho de ferro e seu único credo era a obediência. E por um tempo, nas décadas de 70 e 80, uma crescente classe média deu origem a alguns sentimentos de identidade nacional e patriotismo, disse Phebe.

Mas quando os americanos chegaram, a sociedade iraquiana viu a situação como "a tampa saindo da panela de pressão", disse Rubaie.

Poucas pessoas acreditam que o país se desfaça em breve. Mas muitos falam sobre essa possibilidade, que há muito tempo é um assunto de reflexão ocidental, mas que agora se tornou tópico de discussão nos cafés e casas dos cidadãos iraquianos, e nos salões e escritórios dos poderosos.

"Não sentimos que temos um país que irá nos defender, nos proteger e nos amar. Todos se esqueceram de seu país e começaram a pensar em suas tribos e seitas", disse Arkan Hussain, sunita de 28 anos que mora perto de Tikrit, cidade controlada pelo Estado Islâmico.

Muitos iraquianos dizem que, no máximo, a unidade é coisa para um futuro longínquo.

"Não há reconciliação agora. Mas daqui a décadas, talvez as próximas gerações possam esquecer o que aconteceu com todo esse derramamento de sangue", disse Ahmed Amar, de 42 anos, de Tikrit.

Contribuiu Falih Hassan

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