Sentada numa sala de monitoramento alegre e apinhada no Laboratório de Estudos sobre Desenvolvimento da Universidade de Harvard, Elizabeth S. Spelke, professora de psicologia e uma pesquisadora proeminente da lista de ingredientes básicos sobre os quais se constrói todo o conhecimento humano, lança um olhar cheio de expectativa, enquanto seus alunos preparam uma menina de 8 meses de idade, de cabelo escuro e enrolado e cheia de energia, para a tarefa onerosa de ver desenhos animados.
O objetivo dos pesquisadores, como em meia dúzia de outros projetos semelhantes no laboratório, era explorar o que as crianças pareciam compreender sobre grupos e expectativas sociais.
Mesmo antes do processo começar, o objeto de pesquisa de quase 6 quilos deixou bastante claro o escopo de seu cérebro social. Ela acompanhava as conversas, encarava quem chegava e queimava nossos olhares adultos com o brilho de seu sorriso. Elizabeth, que veio à sua posição de proeminência por delinear como as crianças aprendem sobre objetos, números e território, balançou a cabeça num gesto de assombro e autoironia.
Elizabeth Spelke, de 62 anos, é alta e magra e divide seu longo cabelo no meio, como uma aluna universitária. Quando fala, ela se inclina para frente e planta os braços nas coxas, com as mãos uma na outra, parecendo, ao mesmo tempo, profundamente envolvida e pronta para partir.
"Quando as pessoas perguntam a Liz, O que você faz?, ela lhes responde, Eu estudo bebês", disse Steven Pinker, colega professor de Harvard e autor de Como a Mente Funciona (Companhia das Letras), entre outros livros. "É engraçadinho, mas ela dá a impressão de que faz pouco caso".
O que Elizabeth está fazendo mesmo, segundo Pinker, é o que os filósofos Descartes, Kant e Locke tentaram fazer. "Ela está tentando identificar as categorias fundamentais do conhecimento humano."
Elizabeth estuda bebês não por eles serem bonitinhos, mas porque são a base de tudo. "Eu sempre fui fascinada por questões de cognição humana e organização da mente humana", ela disse, "e o porquê de sermos bons com algumas tarefas e ruins com outras".
Elizabeth é pioneira em utilizar o olhar dos bebês como uma chave para sua mente isto é, identificar as expectativas inerentes de bebês com até uma semana ou duas de idade, medindo quanto tempo eles encaram uma cena na qual essas assunções são desafiadas ou frustradas. "Mais do que qualquer cientista que eu conheço, Liz combina a perspicácia teórica com um gênio experimental", disse a colega Susan Carey.
De acordo com o laboratório de Elizabeth Spelke, os bebês em geral sabem, antes de completarem 1 ano de idade, o que é um objeto: uma unidade física distinta, em que todas as partes se movem mais ou menos como uma só e com alguma independência dos outros objetos.
"Se eu esticar a mão e pegar o canto de um livro, eu espero que o resto do livro venha junto, mas não um pedaço da mesa", disse Phil Kellman, o primeiro aluno de pós-graduação de Elizabeth, agora na Universidade da Califórnia, em Los Angeles.
"O sistema visual vem equipado para dividir uma cena nas unidades funcionais de que nós precisamos para a sobrevivência", disse Kellman. Se você perguntasse a um bebê se o seu saco com quatro laranjas lhe põe além do limite para o caixa rápido do mercado, ele diria, "Você pega o saco, as partes ficam juntas, logo é um item só, então, entre na fila".
Os bebês também sabem que os objetos não podem atravessar limites sólidos ou ocupar a mesma posição que outros objetos, e que os objetos em geral viajam pelo espaço numa trajetória contínua. Se você alegasse ter inventado uma teletransportador como o de Jornada nas Estrelas, um bebê não iria acreditar.
O laboratório de Elizabeth descobriu ainda que crianças pequenas não são boas em utilizar pontos de referência ou a decoração para se orientar. Só depois dos 5 ou 6 anos que elas começam a otimizar suas estratégias de busca com pistas como "Ela escondeu meu brinquedo num canto cuja parede à esquerda é vermelha em vez de branca".
Tradução de Adriano Scandolara.