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Cidadãos iniciam derrubada: após queda, ruas ficaram lotadas e famílias puderam se reencontrar | David Brauchle/Reuters
Cidadãos iniciam derrubada: após queda, ruas ficaram lotadas e famílias puderam se reencontrar| Foto: David Brauchle/Reuters

Opinião

União da identidade alemã ainda permanece incompleta

Quando disse a uma amiga alemã que iria encontrar um tio-avô em uma cidadezinha perto de Chemnitz, em uma região que antes era a Alemanha Oriental, ela me disse que eu notaria a diferença assim que atravessasse a fronteira. Ela falava de uma divisão imaginária, ainda presente na forma como os alemães encaram a reunificação, que já completa 20 anos.

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Análise

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Enquanto as primeiras lascas do Muro da Vergonha desciam ao chão, o então casal José Antô­­nio Ribas e Márcia Bueno se preparava para dormir. Naturais do Rio Grande do Sul e vivendo em Curi­­tiba nos últimos 15 anos, Ri­­bas e Már­­cia moravam em 1989 a poucas quadras do lugar onde o evento histórico se encenava. Po­­rém, não estavam próximos o su­­fi­­ciente para que a extinção do país comunista atrapalhasse a rotina matinal do casal e de seus dois filhos, na época com 6 e 4 anos.Na primeira manhã da Ale­­manha unificada, Ribas iniciou seus afazeres normalmente. Ar­­rumou-se para um dia de estudos no curso de extensão profissional que o levara à Berlim ocidental. No caminho, deixaria as crianças na escola.Ao sair do apartamento, en­­controu vários vizinhos dizendo que o Muro havia caído. Pen­­sando tratar-se de um simples acidente, não deu importância e seguiu para a aula.Foram os colegas estudantes que o informaram da real dimensão do "acidente". A surpresa foi arrebatadora: "Naquela época nem se cogitava abrir as fronteiras entre o lado ocidental e o oriental. Dias antes havíamos assistido às comemorações dos 40 anos da República Democrá­­tica da Alemanha [leste comunista] e tudo parecia normal", relata Ribas.A notícia também chegou até Márcia aos poucos. Segundo o esquema que o casal havia montado, ela deveria buscar as crianças na escola, à tarde. Márcia saiu de casa às 16 horas, e começou a decifrar os pequenos signos que a cidade transformada emanava."Quando saí, havia muito mo­­vimento na rua. A cidade estava cheia de gente; as estações de metrô, lotadas. Foi então que vi a manchete do jornal exposto em uma banca de revista. Olhei em volta e vi que as pessoas estavam felizes, chorando e se cumprimentando."

Naquela mesma manhã, o professor e diretor de colégio José Luís Chong percebeu que o trânsito em Berlim parecia estar mais alvoroçado do que o usual. Mas para alguém que morava em Curitiba, na época uma cidade muito mais pacata, qualquer sirene ou freada era motivo de sobressalto. Ele estava em Berlim havia apenas dois meses, para realizar um estágio pelo Cefet (atual UTFPR), onde leciona. "Não estava acostumado a multidões. Alguns colegas de São Paulo, que também faziam estágio, diziam que era normal. Mas eu sempre ficava alerta", confessa.

Sem conter a inquietação, saiu para a portaria do hotel. En­­tão foi informado sobre a queda do muro.

Visitas

No dia seguinte, Chong e um grupo de professores resolveram visitar o lado oriental comunista, que durante décadas esteve proibido para qualquer pessoa vinda da outra metade da cidade. "Foi muito difícil atravessar. Os postos de fronteira estavam to­­mados por pessoas querendo en­­trar no lado ocidental."

Ao chegar à Berlim comunista, Chong presenciou o entusiasmo que se esparramava pelas ruas: "Gente pulando, dançando, be­­bendo. Parecia que o país tinha ganhado a Copa do Mundo", com­­para. Segundo ele, a diferença en­­tre as duas nações cabe em uma metáfora automobilística: "É como comparar um Lada a uma Mercedes. Na Berlim comunista tudo era diferente: roupas, construções, o gênio das pessoas."

Ribas, Márcia e os filhos só atra­­vessaram a fronteira semanas depois da queda. "Nos primeiros dias quase não saímos de casa. Tinha muita gente na rua, nos mercados", conta Márcia. Uma dessas saídas foi para ver o que estava acontecendo no Por­­tão de Brandenburgo, o principal posto de controle da Berlim dividida. "Vimos a alegria das famílias se reencontrando. Várias pessoas estavam em cima do muro, festejando." Contagiado pela união dos berlinenses, Ribas também subiu no que restou do concreto que antes os separava. "Há al­­guns dias estava vendo uma re­­portagem sobre o muro na televisão e passou um filme na mi­­nha cabeça", conta Ribas.

Herança afetivaRibas relembra: "Inesquecível. Você é um abençoado por estar ali, no lugar certo, e vivenciar um acontecimento mundial." A ex-esposa corrobora: "Sabia que era um mo­mento único e sabia que estava fazendo a História junto deles, apesar de não ter sofrido o que eles sofreram."

Chong lamenta: "Eu só acho uma pena poder participar da união da Alemanha e não poder ver o mesmo acontecer na China – terra dos meus ancestrais – e na Coreia".

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