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Terminadas as cerimônias e os discursos da abertura, chegara a hora de os bispos colocarem mãos à obra. Na verdade, eles já vinham trabalhando desde 1959, quando foram consultados sobre os temas que deveriam fazer parte do concílio. "Os assuntos eram basicamente relacionados com a vida da Igreja, a fé, a moral e as transformações do mundo moderno", recorda dom Serafim Fernandes de Araújo. Os bispos recebiam esboços do que seriam os documentos do concílio, e mandavam comentários, sugestões e emendas. "Propus uma redistribuição dos recursos humanos e materiais da Igreja. No Brasil havia paróquias de 50 mil pessoas sem padre, e na Itália paróquias de 200 habitantes tinham seu cura", afirma dom José de Aquino Pereira, bispo emérito de São José do Rio Preto (SP).

Mas, quando o concílio tem início, o trabalho preparatório começou a ser descartado. "A Cúria Romana, o conjunto de órgãos que ajudam o Papa no governo da Igreja, havia preparado um concílio que resolveria os problemas da Europa. Os bispos do Terceiro Mundo perceberam isso e contaram com a ajuda de europeus ocidentais para mudar a situação", descreve o teólogo Mário Betiato. Aos poucos, liderados pelo cardeal Frings, de Colônia (Alemanha), e pelo cardeal Liènart, de Lille (França), boa parte dos "72 esquemas" preparados pela Cúria eram derrubados pelos padres conciliares. "A cúpula da Igreja esperava um concílio curto em que nós viéssemos, víssemos e assinássemos. Óbvio que não concordamos", descreve dom Francisco de Mesquita, bispo emérito de Afogados da Ingazeira (PE). Betiato ainda ressalta o papel de dom Hélder Câmara na derrubada do modelo de concílio desejado pela Cúria. "Nem é bom pensar no desastre que teria sido com os 72 esquemas", sentencia dom Clemente Isnard, bispo emérito de Nova Friburgo (RJ).

Dom Antônio Fragoso, de Crateús (CE), ainda se recorda de outro episódio que mostra os diferentes objetivos dos grupos de bispos: "Cerca de 400 padres conciliares, liderados pelo arcebispo Marcel Lefebvre, pediram a João XXIII que o concílio condenasse as ‘heresias de nosso tempo’. Depois, o cardeal Pericle Felici comunicou, da parte do Papa, que o concílio não tinha sido convocado para condenar, mas para apresentar ao mundo um rosto novo da Igreja, sobretudo da Igreja dos Pobres. Para nós foi uma explosão de alegria."

Para dom Serafim e dom Jaime Coelho, o começo não foi tão turbulento. "Em 1962 devíamos estudar a questão da Revelação e da Palavra de Deus, mas a discussão emperrou. O que o Papa fez foi mandar iniciar os debates sobre a liturgia", diz o cardeal mineiro. O documento acabou aprovado em 1963, enquanto a constituição dogmática sobre a Revelação ficaria para 1965. João XXIII já havia advertido, na véspera da abertura: "Em matéria de concílio, somos todos noviços." Agora os bispos todos aprenderiam isso na prática. (MAC)

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