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Guilhermina Guinle no papel da socialite Alice, em "Paraíso Tropical" | Reprodução www.globo.com/paraisotropical
Guilhermina Guinle no papel da socialite Alice, em "Paraíso Tropical"| Foto: Reprodução www.globo.com/paraisotropical

Madri – Há duas décadas a única atividade econômica com algum brilho na Espanha consistia em atrair pálidos europeus de países frios e ricos e fazê-los esvaziar os bolsos em bares, porções de paellas e hotéis à beira-mar. Isso foi antes de os espanhóis entrarem para a União Européia – ressabiados e pela porta dos fundos, é verdade. Hoje, suas empresas estão fazendo negócios pelo globo com tal agressividade e senso de urgência que os concorrentes mal têm tempo de entender o que aconteceu. A compra do banco ABN Real pelo espanhol Santander e a vitória da OHL no leilão para concessão de estradas federais brasileiras são só alguns exemplos.

A lista das companhias ibéricas que estão ganhando milhagens inclui construtoras, as grifes Zara e Mango e a Telefônica. O que começa a incomodar os vizinhos do bloco europeu, porém, não é tanto o fato de o primo pobre ter virado a estrela da festa, mas quem ele convidou para montar o bolo.

Se os recursos da UE deram impulso ao crescimento espanhol, este só foi mantido graças às levas de imigrantes que chegaram ao país vindos da América Latina, África e, mais recentemente, Leste Europeu. Por um lado, esses estrangeiros garantiram mão-de-obra farta para as empresas se fortalecerem e extrapolarem os limites da península. Por outro, se tornaram uma das grandes preocupações dos colegas europeus. "Num momento em que os vizinhos querem fechar todas as vias de acesso para a Europa, seu medo é que a Espanha seja uma porta escancarada", diz Angels Pascual, do grupo de pesquisas sobre imigração da Universidade Autônoma de Barcelona.

Atualmente vivem em território espanhol 4,3 milhões de estrangeiros, cinco vezes mais que há uma década. Em 1997, eles representavam menos de 2% da população. Hoje, são quase 10%. Os imigrantes constroem edifícios, limpam casas e trabalham nos restaurantes. Calcula-se que ocupem a metade dos novos postos de trabalho criados no país. O slogan de uma campanha para estimular a sua integração dá a medida da diferença entre o modo como o governo espanhol e os de outros países europeus encaram a questão: "Imigrantes: todos diferentes todos necessários", diz o anúncio veiculado pela tevê espanhola, que consumiu 1,7 milhão em recursos públicos.

Só para comparar, na Suíça o partido União Democrática de Centro venceu as eleições de outubro com uma propaganda que mostrava ovelhas brancas expulsando uma ovelha negra do seu território. A França aprovou uma lei obrigando os estrangeiros a fazerem testes de DNA para se reunir com familiares residentes e a Itália um decreto facilitando a expulsão de imigrantes do Leste Europeu. A política espanhola que mais incomoda os vizinhos é, sem dúvida, as anistias concedidas periodicamente para imigrantes ilegais. O maior desses processos de regulamentação foi concluído no final de 2005 e deu vistos de trabalho para 600 mil estrangeiros que provaram estar empregados. Os que se opõe a essa estratégia alegam que ela anima africanos e latinos a tentarem a sorte na Espanha com a esperança de serem legalizados Para os vizinhos, o problema é que numa Europa de fronteiras diluídas não há como impedir que um imigrante que chegue a Madri acabe em Paris ou Berlim.

Os argumentos pró-imigração do governo espanhol podem ser traduzidos em números: os estrangeiros foram responsáveis por metade do crescimento médio de 3,1% no PIB do país nos últimos cinco anos de acordo com um relatório da assessoria econômica da Presidência. Devidamente empregados, eles pagam impostos, contribuem com o sistema de previdência, consomem e podem financiar a compra de uma casa própria. No primeiro trimestre deste ano, uma pesquisa do Ministério de Habitação revelou que os imigrantes estavam comprando 12% das residências negociadas no país.

Ao passar de uma sociedade relativamente homogênea para uma multicultural num piscar de olhos, a Espanha já está se deparando com uma série de problemas que em outros países demoraram mais para aparecer. Nas pré-escolas, o início do ano letivo surpreende os professores com turmas que reúnem marroquinos, equatorianos, brasileiros, chineses e árabes. Segundo uma enquete divulgada pelo diário madrilenho El Mundo, 70% dos espanhóis acreditam que os estrangeiros estão chegando "rápido demais". Descobrir como lidar com questões como a submissão feminina em comunidades muçulmanas e o fanatismo religioso se tornaram novos desafios, assim como o controle das gangues importadas da América Latina. "Depois dos atentados de 11 de março, por exemplo, muitos empregadores começaram a evitar contratar marroquinos porque imigrantes do norte da África ajudaram a planejar os ataques", conta Rosa.

Por enquanto, como a economia vai bem, a integração dos imigrantes parece caminhar nos eixos. A questão é: e se o bolo desandar? Uma das maiores preocupações dos espanhóis é o que aconteceria com todos esses imigrantes se a economia do país entrasse em recessão. Segundo analistas, a construção civil, principal motor do boom econômico espanhol e um dos setores que mais empregam imigrantes, seria um dos primeiros a entrar em crise. "Enquanto houver emprego para todos, não haverá grandes problemas, mas caso a situação piore as tensões sociais devem aumentar", diz Angels. "Provavelmente é aí que os limites dessa política serão de fato testados. Afinal, se a imigração é uma riqueza, é preciso saber gerenciá-la."

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