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Mulher somali refugiada da secae seus filhos chegam à  capital Mogadíscio em busca de ajuda | Feisal Omar/Reuters
Mulher somali refugiada da secae seus filhos chegam à capital Mogadíscio em busca de ajuda| Foto: Feisal Omar/Reuters

Entrevista

É uma tragédia humanitária sem precedentes

António Guterres, alto comissário das Nações Unidas para Refugiados (Acnur).

O ex-primeiro ministro português António Guterres comanda uma verba anual do equivalente a R$ 5,1 bilhões para ajudar o total de 25,2 milhões de refugiados atualmente existentes no mundo que estão sob a proteção do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (Acnur). O alto comissário da ONU desembarca no Brasil na semana que vem para encontrar-se com autoridades do governo do Brasil — país que vem aumentando suas doações ao órgão. Nesta entrevista concedida pelo telefone à Agência O Globo, de Genebra, ele fala sobre as dificuldades na Somália e classifica como "generosa" a política brasileira relacionada ao tema.

O que o Acnur está fazendo para ajudar os famintos da Somália?

Em conjunto com nossos parceiros e outras agências estamos fazendo o possível para garantir que essas pessoas tenham finalmente a assistência e proteção devidas. Há cerca de 200 mil novos refugiados que cruzaram a fronteira da Somália fugindo do conflito e da fome e que se recolheram no Quênia, na Etiópia e no Djibuti. Num desses campos de refugiados (Dolo Ado, na Etiópia), os índices de subnutrição aguda é de 50% e de subnutrição aguda severa de 28% nas crianças com menos de cinco anos. Estamos perante uma tragédia humanitária sem precedentes.

Os campos do Quênia e da Etiópia estão superlotados, e há denúncias de que a ONU tentava transferir refugiados para um campo do Quênia onde não há as menores condições básicas. Como são as verdadeiras condições nesses campos?

Essa questão é um simples mal-entendido. Nós estamos com campos altamente congestionados, temos cerca de 400 mil pessoas numa área que foi prevista para 90 mil e ao fim de muito tempo foi possível obter autorização do governo queniano para utilizar uma zona de expansão dos campos com duas áreas. Uma das áreas ainda não está de fato estruturada, só que as necessidades são tantas e o congestionamento é tal que a nossa decisão foi a de avançar para ocupar essas duas extensões que agora foram postas à nossa disposição e portanto tentar descongestionar ao máximo a situação trágica em que temos muita gente na periferia dos campos, em áreas muito piores que aquelas que agora estamos utilizando.

O Brasil tem um papel importante no mundo na questão do asilo?

É importante reconhecer que hoje o Brasil é um dos países do mundo que têm a legislação mais perfeita em matéria de asilo, é um país que tem tido uma política muito generosa de acolhimento não apenas dos refugiados que chegam ao Brasil, mas também reassentamento de refugiados vindos de zonas aonde é muito problemática a sua proteção.

O governo brasileiro vai aumentar para 38 mil toneladas as doações de alimentos para a Somália. Há uma semana, o Itamaraty in­­formou que 20 mil toneladas se­­riam enviadas ao país, onde mais de 3,7 milhões de pessoas enfrentam uma crise de fome.

Com o apoio de navios mercantes, partindo do porto do Rio de Janeiro, o Brasil enviará à Áfri­­ca até o fim de agosto carregamentos de arroz, feijão, milho, leite em pó e sementes.

Os números são recordes brasileiros em matéria de ajuda humanitária internacional. É a primeira vez que o Brasil faz um envio de alimentos ao país africano e é a maior doação do tipo já realizada.

"Também serão enviadas 15 mil toneladas de alimentos a campos de refugiados na Etiópia", disse à reportagem Milton Rondó, coordenador-geral de Ações In­­ternacionais de Combate à Fome do Itamaraty.

Liderança

As entregas de alimentos colocam o Brasil como o décimo maior doador de fundos humanitários para a crise no chifre da África – região que compreende Somália, Quê­­nia, Etiópia, Djibuti – onde 12 milhões sofrem com a pior seca em 60 anos. Na lista da ONU, di­­vulgada esta semana, o país soma US$ 22 milhões em contribuição, em 2011. À frente de potências co­­mo Alemanha, França e Suíça.

As doações foram autorizadas por lei sancionada mês passado e serão realizadas em parceria com o Programa Mundial de Alimentos (PMA), da ONU. Segundo a nova legislação, o Brasil deve doar em 2011 um total de 710 mil toneladas de alimentos a diversos países, no valor de US$ 350 milhões.

"Esse montante de alimentos representa 13% de nosso fluxo global", explica Kyomi Kawa­­gu­­chi, representante do PMA no Brasil. A nova lei brasileira também permite que as 710 mil toneladas sejam vendidas. "Caso não encontremos parceiros para trans­­porte de todo este volume, podemos monetizar o recurso", afirmou Rondó.

Segundo o ministro, o Brasil ainda deve lançar nos próximos dias um número de conta na Cai­­xa Econômica Federal para receber doações de dinheiro. "Que­­re­­mos que seja o mesmo que já estava sendo usado para recolher fun­­dos para o terremoto no Haiti", informou o ministro. A iniciativa ficaria sob os auspícios do Pro­­gra­­ma da ONU para o Desenvol­­vi­­mento e da própria Caixa.

O investimento da diplomacia brasileira em criar uma imagem humanitária para o Brasil acontece no momento em que o país se esforça para ganhar mais exposição na cena internacional. Entre os principais motivos está a disputa por uma cadeira permanente no Conselho de Segurança da ONU.

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