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Mulher com véu do tipo “niqab” em supermercado de Leers, no norte da França: projeto de lei quer multar o uso em 750 euros, o que pode reforçar a discriminação dos muçulmanos no país | Farid Alouache/Reuters
Mulher com véu do tipo “niqab” em supermercado de Leers, no norte da França: projeto de lei quer multar o uso em 750 euros, o que pode reforçar a discriminação dos muçulmanos no país| Foto: Farid Alouache/Reuters

O projeto de lei anunciado na semana passada na França para multar o uso da burca (véu islâmico) ou qualquer outro adereço de cobertura do rosto em 750 eu­­ros (R$ 1,8 mil) está longe de ser uma medida isolada. Para muitos, é apenas a ponta do iceberg.

Outras decisões dão uma ideia do crescente clima de embate no país entre europeus e muçulmanos. Um exemplo é o minarete da nova Grande Mesquita de Mar­­selha, cuja construção começa no próximo mês de abril. Em vez de ter um "muezim" (palavra de origem árabe que indica aquele que convoca os crentes à prece), a torre irá emitir um raio de luz por alguns minutos, cinco vezes por dia.

Em situações normais, a luz seria verde, a cor do Islã. Mas, provavelmente, será roxa – o que irá conferir certo ar de clube noturno ao prédio elegante.

Seria esse tipo de assimilação a desejada pelos islâmicos na Europa?

Com a imersão da Europa Ocidental em uma verdadeira onda de ansiedade causada pelos impactos da imigração muçulmana pós-colonial – o que assume ações e implicações inusitadas como o recente plebiscito suí­­ço que proibiu os minaretes no país – alguns estudiosos te­­mem uma dinâmica destrutiva, fomentando uma reação que po­­de, por sua vez, semear ressentimentos, especialmente entre os jovens muçulmanos.

Segundo Vincent Geisser, es­­tudioso do islamismo e da imigração no Centro Nacional de Pes­­quisas Científicas da França, quanto mais os muçulmanos da Europa se estabelecem como parte permanente do cenário na­­cional, mais assustam alguns eu­­ropeus que pensam que suas identidades nacionais podem ser mudadas para sempre.

"Hoje, na Europa, o medo do Islã cristaliza todos os outros me­­dos", disse Geisser. "Na Suíça, são os minaretes. Na França, é o véu, a burca e a barba."

A nova mesquita, chamada pe­­­­los construtores de "o símbolo do Islã em Marselha", é fonte de orgulho dos muçulmanos, que res­­pondem por pelo menos 25% da população na se­­gunda maior cidade da França. "Todos esses símbolos re­­velam uma presença mais forte e duradoura do Islã. É a clara transição de algo temporário para algo permanente e enraizado", disse Geisser.

Ainda de acordo com Geisser, a mudança tem sido mais significativa nos últimos cinco anos. "Estamos em uma encruzilhada que mistura a complicada ansiedade europeia provinda da crise econômica, o medo de globalização, o aumento perceptível do número de imigrantes, a queda da natalidade no velho continen­­te e a conglomeração dos es­­tados na­­cionais em uma única e grande Europa."

Terrorismo

De maneira geral, as relações en­­tre muçulmanos e outros eu­­ro­peus estão sendo boas. Todavia, o terrorismo associado aos ataques na França, em 1995, e nos Estados Unidos, em 2001, ainda ressoa pe­­los anos, mensagem esta reforçada pelo atentado a Madri em 2004; pelo assassinato do diretor holandês Theo van Gogh, crítico dos muçulmanos conservadores, também em 2004; os ataques em Londres, em 2005; e a controvérsia das tirinhas dinamarquesas sobre o profeta Maomé publicadas também em 2005.

Ultradireita

A ultradireita e os partidos contrários a imigração se saíram re­­lativamente bem nas últimas eleições europeias, em junho do ano passado, que teve poucos vo­­tos: pela primeira vez, o partido de ultradireita britânico fi­­cou com duas cadeiras, e o Par­­tido da Liberdade da Dinamarca garantiu 17% dos votos.

Este ano, dinamarqueses e suí­­ços colocaram um novo foco sobre as mesquitas e minaretes. Os planos para as duas primeiras grandes mesquitas de Cope­­nha­­gue encontraram forte oposição da direita. O voto suíço trouxe con­­denações generalizadas apon­­­­tando disseminação do me­­do e do racismo. As acusações vão con­­tra o próprio governo suíço.

Um estudo sobre o islamismo em 11 cidades da Europa realizado pelo Open Society Institute publicado neste mês aponta que 55% dos muçulmanos acreditam que a discriminação religiosa aumentou nos últimos cinco anos. Os muçulmanos têm uma chance 300% maior de estar de­­sempregados e vivem de maneira menos abastada, conforme apontou o estudo. Foi também descoberto que existe uma forte conexão entre seus países de origem e as comunidades onde es­­tão instalados.

Gabrielle Martelli disse que a tolerância de Marselha tem uma boa reputação, "mas as coisas ficaram tensas demais há algum tempo por aqui".

"Existe muito racismo aqui de ambos os lados. Quando você é in­­sultada e chamada de ‘sale fran­­çaise’ (francesa suja), você pensa: ‘Es­­pere um pouco. Este é o meu país’".

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