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Tomi Nakagawa, 99, Seiko Yamanaka Sasaya, 63, Ângela Maria Ribeiro Lopes, 36, Mariana Yanaguizawa, 19, e Julia Yumi Yamawaki, 6. Cada uma delas é parte de uma história que completa hoje 98 anos e envolve cerca de 1,5 milhão de descendentes japoneses no Brasil.

Era manhã de quinta-feira, 18 de junho de 1908. Depois de 51 dias de viagem, atracava em Santos o Kasato Maru, o primeiro navio com imigrantes japoneses vindos para trabalhar nos cafezais do oeste paulista, conforme previa um acordo firmado entre o Governo do Estado de São Paulo e a Companhia Imperial Japonesa de Emigração. Entre todos os 781 passageiros, Tomi Nakagawa, então um bebê de pouco mais de um ano, é a única que ainda vive. Atual moradora de Londrina, ela recorda bem da infância nas lavouras, onde trabalhou desde pequena plantando e colhendo café.

"Trabalho tinha muito, trabalho não era pouco. Minha mãe acordava ainda no escuro, fazia café e já ia trabalhar", conta Tomi. Nessa primeira fase da colonização japonesa, o espírito dos imigrantes era de fazer dinheiro e retornar ao Japão. Logo eles perceberam que precisariam desenvolver uma atividade independente, na qual a possibilidade de ganhos fosse maior, para conseguirem cumprir o objetivo de retorno à terra natal.

"Sem conhecer a língua, eles se voltaram para agricultura, mas dessa vez independente dos barões do café paulista. Em conjunto, compraram terras. Com a crise de 1929, o governo paulista proibiu o plantio de novos pés de cafés. É exatamente o momento em que vai ser desbravada a região norte do Paraná", explica a diretora do Museu Histórico da Imigração Japonesa, Célia Oi.

Até o início da Segunda Guerra, 180 mil isseis (nascidos no Japão) chegaram ao Brasil. Em 1941, os dois países rompem ligações. O governo de Getúlio Vargas passa a perseguir os imigrantes e proíbe qualquer manifestação cultural ligada ao Japão em território brasileiro. "Foi uma época difícil para meus pais, porque foram proibidos de falar japonês, tiveram de esconder livros, as escolas japonesas foram fechadas", diz Seiko Yamanaka Sasaya, nissei, filha de japoneses, hoje diretora do Curso Bunkyo de Língua Japonesa, em Curitiba.

Ao término da guerra, aqueles que pretendiam retornar ao Japão se conscientizaram da dificuldade de voltar e resolveram se fixar no Brasil. "Minha mãe, nas primeiras viagens que fez ao Japão após chegar ao Brasil, dizia, ‘vou voltar ao Japão’. Da terceira vez, ela disse, ‘vou pro Japão’. Ela já não tinha para onde voltar, sua terra era aqui", conta Seiko.

Até meados dos anos 1970, mais 53 mil imigrantes chegaram ao país. Com o respaldo das grandes empresas japonesas que abriram filias aqui, eles saíram do campo para viver na cidade. A crise da economia brasileira no início dos anos 80 transforma a direção da migração, e os descendentes japoneses no Brasil se voltam ao Japão em busca de trabalho.

Foi o que levou Ângela Maria Ribeiro Lopes, sansei, a voltar ao país de onde veio seu avô. Num dia em 1992, o marido chegou em casa após ter um pedido de contrato recusado no trabalho. Ângela abriu a porta e ele disse apenas: "Vamos para o Japão". Foram com planos de ficar dois anos. Voltaram há seis meses, depois de 14. "Tivemos que ter muito jogo de cintura, para superar as dificuldades. Ninguém vai para o outro lado do mundo e começa dando lição. Ralamos até mostrar que podíamos fazer tão bem quanto eles", conta Ângela. Estima-se que 270 mil brasileiros dekasseguis (literalmente, sair para ganhar dinheiro) vivam hoje no Japão.

Mariana Yanaguizawa, yonsei, e Julia Yumi Yamawaki, gossei, fazem parte da quarta e quinta gerações de japoneses, respectivamente. As gerações "Churrasco com niguiri", como prefere Seiko, em óbvia demonstração da inevitável miscigenação da raça ao passar dos anos. Mariana mora em Curitiba, na Casa do Estudante Nipo-Brasileiro. Filha de japonês com brasileira, ela fala apenas algumas palavras da língua de seus antepassados. "A maior parte da cultura que recebi é mesmo na área da culinária. Mas aqui na Casa, aprendi a ter mais carinho pela cultura e pelos japoneses pioneiros", diz.

Mais do que levarem na vida a filosofia do seu povo, elas carregam os 98 anos de história no rosto. Ou, em época de Copa do Mundo, até no futebol. "Eu torço pelo Japão", diz a pequena Júlia, de 6 anos. Mas e se o Japão perder? Rindo, ela confessa: "Aí, bem, aí o Brasil vai ganhar e vou torcer pro Brasil".

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