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análise

Com Brexit e renúncia, a sorte do primeiro-ministro David Cameron chega ao fim

David Cameron e a esposa, Samantha, antes de seu pronunciamento à imprensa, anunciando a renúncia ao cargo de primeiro-ministro | BEN STANSALL/AFP
David Cameron e a esposa, Samantha, antes de seu pronunciamento à imprensa, anunciando a renúncia ao cargo de primeiro-ministro (Foto: BEN STANSALL/AFP)

O primeiro-ministro britânico David Cameron apostou seu legado em dois referendos, mas foi derrotado no segundo. Nesta sexta-feira (24), Cameron anunciou que abandonará o cargo em outubro, no mais tardar, em resposta à vitória da opção pela saída do Reino Unido da União Europeia (UE) no referendo de quinta-feira.

“Eu não penso que seria correto tentar ser o capitão que orienta nosso país até até seu próximo destino”, disse Cameron diante da residência oficial de Downing Street.

Ele completou que o “novo primeiro-ministro deveria estar no cargo antes do início do congresso do Partido Conservador”, em outubro. “Os britânicos votaram a favor de deixar a União Europeia e sua vontade têm que ser respeitada”, declarou.

O primeiro-ministro já havia levado um grande susto quando a Escócia ficou próxima da independência no referendo de setembro de 2014, que ele convocou quando os favoráveis a secessão não passavam de 20% nas intenções de voto.

O unionismo venceu, mas o independentismo escocês avançou como espuma. No caso do referendo da UE, o euroceticismo transbordou e derrubou Cameron.

Muito longe de servir unir o Partido Conservador, a campanha do referendo dividiu a formação ainda mais e a pergunta agora é o que acontecerá com outros perdedores, como o ministro das Finanças George Osborne.

A primeira vítima foi o próprio chefe de Governo. Cameron representa o paradoxo de um primeiro-ministro que, a princípio cético sobre o projeto europeu, passou três meses pregando as bondades do bloco e fazendo advertências sobre as calamidades que seriam provocadas em caso de abandono da UE.

“Mas é um eurocético pragmático”, explicou Peter Snowdon, coautor do livro “Cameron at 10”, que narra seus primeiros anos como líder dos conservadores. “Não é Edward Heath [eurófilo], nem Margaret Thatcher [eurófoba]. É muito mais pragmático”, afirmou o biógrafo.

Um espécime britânico Cameron, de uma família abastada, nunca provocou grandes paixões, nem em seu partido nem entre os eleitores. O político de 49 anos é pai de três filhos e estudou no prestigioso colégio privado Eton. “É educado, mas não é um intelectual, é determinado, mas não dominante, é um cavalheiro mas não é esnobe (...) É crente, mas não muito crente. As pessoas como ele têm bastantes limitações, como a falta de originalidade, a ausência de paixão e a tentação da satisfação própria, mas outrora dominaram o mundo”, escreveu o biógrafo Charles Moore.

Para Moore, Cameron representa “o perfeito protótipo moderno de uma espécie britânica muito antiga”. Em Eton, ele estudou com o rival Boris Johnson, que na época parecia mais brilhante e promissor, recordou o biógrafo Michael Ashcroft. Sua trajetória em Oxford e sua entrada na política transcorreram sem incidentes. A ascensão foi rápida, até assumir o posto de líder do Partido Conservador há 11 anos.

Na época ele iniciou o trabalho de modernizar o partido e atualizá-lo com o mantra do conservadorismo “compassivo”. Também tentou encerrar as disputas sobre a Europa, um motivo constante de batalhas, que acabou com várias carreiras políticas, como a da Dama de Ferro, Margaret Thatcher.

A ideia do referendo nasceu durante o avanço do partido populista e eurocético UKIP nas eleições europeias de 2014. “A derrota é um golpe terrível para sua credibilidade”, disse à AFP Tim Bale, professor de Ciências Políticas da Universidade Queen Mary em Londres.

“Não aguentaria nem 30 segundos no poder”, havia previsto o dirigente conservador Kenneth Clarke, que foi ministro durante seu governo. Cameron já havia anunciado que não disputaria as próximas eleições em 2020, alegando que deseja dedicar mais tempo a outras atividades, especialmente sua família.

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