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Quem guia a Europa? Manifestante cego participa de protesto contra as medidas de austeridade diante do Ministério das Finanças em Atenas, na Grécia | Angelos Tzortzinis/AFP
Quem guia a Europa? Manifestante cego participa de protesto contra as medidas de austeridade diante do Ministério das Finanças em Atenas, na Grécia| Foto: Angelos Tzortzinis/AFP

Entrevista Faltam políticas regionais em várias áreas

Rodolfo Coelho Prates, doutor em Economia pela Universidade de São Paulo, professor do Programa de Mestrado e Doutorado em Administração da Universidade Positivo

Fala-se em uma cisão entre norte e o sul da Europa. O senhor acredita que esse risco é real?

Não acredito. De fato há um problema econômico, mas a separação consiste em abandonar todo o avanço conquistado pela União Europeia. No meu entendimento, não é a União que gerou a crise, mas sim alguns comportamentos inadequados de alguns países. Se esses mesmos países tivessem levado em consideração as metas fiscais estabelecidas, por exemplo, não se encontrariam em situação tão complicada. Outro ponto é questionar se as ações para conter a crise são corretas. Qualquer opinião é apenas uma opinião, sem muito embasamento. Por mais que seja amargo o remédio, o remédio está sendo adotado. E uma coisa que não podemos esquecer, as pessoas são livres para trabalhar em qualquer parte da UE. Dessa forma, um desempregado grego pode migrar para a Alemanha e procurar e obter trabalho lá. Isso é uma vantagem imensa. Pense na situação do Nafta. O México foi afetado pela crise dos EUA, mas os mexicanos não podem sair de seus países em busca de oportunidades melhores em outros países. Qual situação é preferível? Imagino onde as possibilidades sejam maiores.

O "fosso" entre as duas regiões seria causado pela ausência de uma política em comum. Essa é uma maneira coerente de ver a situação?

A Europa é um continente, com peculiaridades regionais muito diversas. O problema é a ausência de políticas regionais, nos mais diversos âmbitos: econômicas, sociais e territoriais, por exemplo. É claro que o problema da macroeconomia deve ser tratado como tal e isso prevalece para todos os países de forma igualitária. Mas existem muitas diferenças em termos de produtividade, educação e infraestrutura, por exemplo. E acho que isso deve ser levado em consideração nas decisões de âmbito do parlamento.

"Problemas estão em toda parte e as soluções devem ser comuns", disse o presidente do parlamento europeu, o alemão Martin Schulz. O senhor concorda com Schulz?

Os problemas estão em toda parte, mas as soluções devem ser pensadas caso a caso. Devem ser adotadas medidas que não interfiram na unidade europeia, mas sempre levando em consideração a realidade dos países envolvidos. A solução para a Alemanha não é a mesma para a Itália ou para a Grécia.

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Os percalços do euro acentuam diferenças entre os países da União Europeia. Então alarmistas se investem de questões históricas que soam perigosamente deterministas (ou mesmo preconceituosas) para falar de uma cisão entre o norte e o sul da União Europeia, ou de um "fosso" entre as duas regiões, para usar um termo do português Diário de Notícias.

Seria o Norte financeiramente saudável versus o Sul em dificuldades. Mas falar da Europa nesses termos é simplificar a história, a economia e o continente europeu.

"O risco não é o da Europa se dividir, mas a possibilidade de saída de alguns países da zona do euro e da União Europeia é real, principalmente de Portugal e Grécia, onde se discute as vantagens e desvantagens de permanecer no euro", diz Marcelo Curado, professor do departamento de Economia da Universidade Federal do Paraná. "O risco é para o projeto do euro."

O alemão Martin Schulz, social democrata que preside o Parlamento Europeu, fez advertência sobre os riscos que correm a União Europeia para o jornal El País, da Espanha: "Os problemas estão em toda parte e as soluções devem ser comuns".

Na opinião de Curado, o cenário é um pouco diferente porque os problemas não estão em toda parte no mesmo grau. "Para alguns países, a crise não é tão séria", diz. Mas ele concorda com uma "solução europeia".

"Enquanto não existir uma solução definitiva, que considere as diferenças do euro para os países, os impactos da moeda sobre cada país, a situação não vai melhorar. Para os portugueses [por exemplo], o euro é muito caro", diz.

Os analistas ouvidos pela reportagem sublinham o fato de que os problemas são de ordem econômica. Buscar leituras históricas, sociológicas, religiosas ou até climáticas – entre muitas outras –, é enfrentar uma questão antiga e complexa. "Mas há processos econômicos concretos", diz Curado, que cita a produtividade alta dos alemães. "A Alemanha tem uma tradição em engenharia que não começou na semana passada", diz. "As diferenças estão nos níveis educacionais e na inovação tecnológica."

Para o professor de Geo­­­po­­lítica Adalberto Scortegagna, do Centro Universitário FAE, o problema dos países com economias mais frágeis é não poder controlar a moeda. "O euro continua forte e isso dificulta a recuperação. Se tivessem o controle da moeda, poderiam desvalorizá-la, o que facilitaria as exportações. Como não têm, a única saída é diminuir os gastos públicos com cortes impopulares", explica.

Scortegagna também rebate a ideia de Schulz sobre "soluções comuns". "A realidade da Alemanha ou a da França são muito diferentes da realidade da Grécia", diz. Se soluções comuns são possíveis, elas devem considerar as particularidades de cada um dos países europeus.

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