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Paraquedistas russos durante exercício militar em Belgrado — a Sérvia vive situação semelhante à da Ucrânia, dividida entre os encantos da Europa e os da Rússia | Marko Djurica/ Reuters
Paraquedistas russos durante exercício militar em Belgrado — a Sérvia vive situação semelhante à da Ucrânia, dividida entre os encantos da Europa e os da Rússia| Foto: Marko Djurica/ Reuters

Opinião

Guerra improvável, paz impossível

Vladmir Pires Ferreira, doutorando em Ciências Jurídico-Internacionais e Europeias pela Universidade de Lisboa

Agravadas pela crise ucraniana, as tensões entre a Rússia e o Ocidente elevaram-se a níveis dramáticos ao longo de 2014, não existindo, no horizonte próximo, expectativas de que esse quadro seja revertido. Para além da retórica política comum em outras crises anteriores, tais como a da Geórgia, em 2008, ou com a Estônia, em 2007, a atual é marcada por sanções econômicas e pela realização de massivos exercícios militares em regiões de fronteira.

Nesta última quarta-feira, o governo russo decidiu, às vésperas do inverno no hemisfério norte, reduzir em dois terços o fornecimento de gás natural para a Europa, gerando escassez em pelo menos cinco países naquele continente e ainda mais apreensão internacional.

O atual estado das relações russo-ocidentais atinge níveis tão dramáticos que nomes como Henry Kissinger, antigo Secretário de Estado americano, e Noam Chomsky, professor do Instituto de Tecnologia do Massachusetts, concordam que a humanidade encontra-se na iminência de presenciar uma "nova Guerra Fria".

Embora válida como indicador da gravidade dos acontecimentos atuais, a metáfora não se revela, todavia, adequada.

Não estamos diante de uma "nova" Guerra Fria, mas da natural e lógica continuação de um confronto que nunca chegou a ser efetivamente ultrapassado. Como demonstra o desenvolvimento da atual crise, a dissolução da URSS não marcou o fim daquele conflito, mas a perda do estatuto de superpotência por uma das partes "beligerantes" e o início de um período de distensão ou relaxamento em suas relações, similar, em certa medida, a détente dos anos 70.

É por essa razão que, apesar da euforia internacional no início dos anos 1990, ou do efêmero alinhamento russo-americano no combate ao terrorismo pós-11 de Setembro, ambos os países mantiveram as armas nucleares estratégicas, ao longo das últimas duas décadas, no mesmo estado de "prontidão e alerta" em que estiveram durante os 45 anos de Guerra Fria.

A situação de conflito permanente entre os blocos ocidental e oriental ocorrida na segunda metade do século 20 foi, certa vez, descrita como um impasse no qual "a paz era impossível e a guerra improvável". Essa máxima ainda se mostra válida no atual estado das relações entre a Rússia e o Ocidente.

A paz, compreendida como a "ausência de maiores conflitos", ainda é uma utopia. Por outro lado, apesar do acirramento das relações e do atual quadro de belicosidade, a guerra continua a ser improvável. Impossível de prever é até quando a sorte continuará a favor da humanidade.

A crise na Ucrânia pode dominar a reunião de líderes do G20 neste fim de semana, enquanto Reino Unido e Austrália acusam a Rússia de aumentar o problema.

Antes da cúpula, o primeiro-ministro britânico, David Cameron, e o premiê australiano, Tony Abbott, se reuniram na capital, Camberra, e levantaram a possibilidade de adotar mais sanções contra Moscou.

"Espero que os russos tenham bom senso e reconheçam que precisam permitir que a Ucrânia siga como um país independente e livre para fazer as próprias escolhas", disse Cameron.

Para o líder britânico, falando no Parlamento da Austrália, o Kremlin "ameaça nossos valores mais do que eu gostaria de admitir".

Comboios

A Rússia está enviando comboios e tanques militares para o leste da Ucrânia, segundo informações da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan).

O governo russo também afirmou que pode enviar aviões para manobras no Golfo do México, exercitando as tropas ao estilo da escalada da Guerra Fria.

O presidente da Rússia, Vladimir Putin, declarou que não pretende levantar a questão das sanções na reunião do G20.

"Parece inútil para mim", disse Putin à agência russa Tass. O líder russo argumentou que as sanções vão de encontro às leis internacionais e às regras da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Abbott, anfitrião do encontro, afirmou que quer discutir a crise financeira global e chegar a acordos para promover o crescimento econômico e a criação de empregos, em vez de usar o encontro para tratar de questões como o ebola, a mudança climática e o conflito na Ucrânia.

Sanções

Reino Unido ameaçou fazer mais sanções contra a Rússia caso o país não ajude com uma solução da crise na Ucrânia.

Kiev precisa montar exército para deter Rússia, diz premiê

A prioridade máxima da Ucrânia é construir um exército forte o bastante para deter a agressão militar russa, disse ontem o primeiro-ministro ucraniano, Arseny Yatseniuk.

A afirmação veio depois que as Forças Armadas do país relataram mais mortes em um conflito separatista.

A Ucrânia acusa a Rússia de enviar soldados e armas para ajudar os rebeldes pró-Moscou do leste a lançar uma nova ofensiva, em um conflito que já matou mais de 4 mil pessoas. "Construir um exército, que seja capaz de parar a agressão da Rússia, é a tarefa número um", disse Yatseniuk. O aumento da violência, desrespeitos ao cessar-fogo e relatos de comboios armados sem identificação que entram na Ucrânia a partir da direção da fronteira russa têm despertado temores de que a frágil trégua firmada em 5 de setembro possa entrar em colapso.

Um porta-voz militar ucraniano disse que bombardeios entre as forças governamentais e os rebeldes continuaram nas últimas 24 horas nas regiões de Donetsk e Lugansk, resultando na morte de um soldado e de uma criança de cinco anos em ataques diferentes.

A perspectiva de uma guerra no leste da Ucrânia aumentou a pressão sobre a economia do país, que enfrenta dificuldades, levando a moeda local (chamada grívnia), a desabar e a uma alta expressiva nos custos de empréstimos.

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