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| Foto: Mauro Campos

Chirac se despede após 12 anos no topo do poder

Curitiba – Após 12 anos no comando da Presidência da França, Jacques Chirac, de 74 anos, se despede do cargo. Encerra-se mais um capítulo em seus 40 anos de vida política.

No currículo, dois mandatos como primeiro-ministro e outros 18 anos à frente da prefeitura de Paris. Em 1995, foi eleito presidente pela primeira vez, sucedendo ao socialista François Mitterrand. Em 2002, venceu o líder da extrema-direita Jean Marie Le Pen, com 82% dos votos.

Chirac, como líder popular e carismático, ganhou visibilidade ao não apoiar a política norte-americana no Iraque e Afeganistão, mantendo assim uma "certa independência" da França frente aos EUA – algo que os franceses apreciam muito, analisa Mônica Lessa, historiadora da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ).

Em relação à política interna, não cumpriu todas as suas promessas e enfrentou denúncias de corrupção, lembra. Apesar de sua longa carreira e prestígio político, Chirac teve sua imagem "arranhada" com os distúrbios de violência e com a polêmica lei do primeiro emprego, diz Mônica. "Tudo isso desgastou sua imagem."

Alexandre Pagliarini, coordenador da pós-graduação em Direito da UniBrasil, analisa a "era Chirac" como uma "não-era". "Jacques Chirac fez a França estagnar-se de todos os modos e em todos os sentidos."

Curitiba – Imigração e desemprego. Os problemas que arranharam a imagem do atual presidente da França, Jacques Chirac, são os mesmos que "assombram" a disputa presidencial francesa. O primeiro turno da eleição será dia 22 de abril.

A onda de violência em 2005, ocorrida nos subúrbios de Paris, que deixou um saldo de mais de 10 mil veículos queimados, reacendida nesta semana pelos confrontos em uma estação de trem de Paris que terminaram com 13 presos – além dos dois meses de protestos em 2006 contra o Contrato do Primeiro Emprego, defendido pelo premier Dominique de Villepin, são exemplos de episódios recentes que vão desencadear debates fervorosos entre os 12 candidatos à Presidência.

Outro tema espinhoso que todos os candidatos terão de expor ao crivo do eleitorado é a política francesa em relação aos avanços da integração na União Européia. Ou seja, aquele que tiver a proposta que agrade ao maior número de eleitores tende a angariar votos. Uma missão quase impossível já que os franceses rejeitaram a adoção da Constituição da União Européia (UE), em maio de 2005, e têm se mostrado profundamente insatisfeitos com os rumos que o bloco está tomando.

Mas qual é a pedra no caminho? Ironia ou não, é justamente a livre circulação de pessoas. Os franceses temem uma "invasão" de trabalhadores provenientes dos dez países do Leste Europeu, que passaram a fazer parte do bloco em 2004. É o velho conhecido fantasma do "encanador polonês", temido pelos franceses.

A assimilação dos trabalhadores do Leste é gradativa em boa parte dos países da UE, mas parte dos franceses não vê com bons olhos essa abertura, já que eles mesmos já sofrem com a escassez de postos de trabalho.

Nesse quesito a candidata Ségolène Royal, do Partido Socialista, parece ter saído na frente. Para a professora Mônica Lessa, do departamento de História da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), o diferencial é que a "herdeira política" de François Mitterrand, que governou a França entre 1981 e 1995, desenhou com calma o seu programa de governo e ouviu o que o eleitor francês mais deseja neste momento. "Ségolène propõe mais empregos e escolaridade para os filhos de imigrantes. Ela deve tentar também frear a migração de empresas francesas para outros países", diz a historiadora.

Se para Ségolène o tema migração parece confortável, para seu principal concorrente, o atual ministro do Interior, Nicolas Sarkozy, tem se mostrado desgastante. Sarkozy, que é do mesmo partido do presidente Jacques Chirac e aparece empatado com Ségolène nas pesquisas de intenção de voto, com 27%, chocou parte do eleitorado com a proposta de criação do Ministério da Imigração e da Identidade Nacional. "A proposta foi um escândalo. O ministério provocaria ainda mais conflito na França. Os debates em torno deste tema tendem a pegar fogo", avalia a professora da UERJ.

Mais radical é Jean-Marie Le Pen, da Frente Nacional, que explorou o tema migração para chegar ao segundo turno da eleição presidencial de 2002, quando foi derrotado por Chirac. Agora não é diferente. "Para Le Pen, a França não pode servir de asilo para ninguém", acrescenta Mônica Lessa.

Já o candidato de centro, François Bayrou, da União pela Democracia Francesa, defende a boa administração para equacionar o problema da imigração na França, diz.

Apoio ao desafeto

O presidente Jacques Chirac, meio a contragosto, anunciou na semana passada seu apoio a Sarkozy. "Chirac gostaria de ter comandado o processo de escolha de quem seria o candidato a presidente por seu partido. Isso não ocorreu. Hoje seu apoio a Sarkozy não altera a situação em nada", diz José Guilhon, pesquisador do Núcleo de Pesquisas em Relações Internacionais (Nupri) da Universidade de São Paulo.

Ameaça do centro

Nas últimas pesquisas de intenção de voto, a grande novidade é o centrista Bayrou, que aparece com 20%. Seu crescimento tem trazido maior prejuízo à esquerda que à direita. "Ele (Bayrou) tende a complicar a vida da socialista Ségolène", diz Guilhon. "A insatisfação com a direita não é suficiente para se votar na esquerda", complementa o pesquisador.

Para Alexandre Pagliarini, coordenador da pós-graduação em Direito da UniBrasil, Bayrou é aquele que, no fundo, quer dizer: "Votem em mim porque não sou nem socialista de carteirinha, muito menos herdeiro de Chirac".

Com esse cenário, qualquer previsão sobre o resultado do primeiro turno tem grande probabilidade de não se comprovar. Tanto que cientistas políticos contratados pelos institutos de pesquisa e órgãos de imprensa são unânimes em afirmar que de cada oito eleitores franceses, um está disposto a trocar de candidato, diz Pagliarini. "Nesta tendência, o maior beneficiado dessa debandada seria Bayrou".

Futuro da UE

Sarkozy era ministro de Chirac na época do "não" francês. Portanto, é partícipe de um governo que "entrou em campo" tarde demais para a tentativa da aprovação de um "sim" à Carta Magna para a Europa, analisa Pagliarini.

Le Pen é contra toda e qualquer fusão ou espécie de integração, diz. Ségolène, em tese – por ser socialista – , seria uma espécie de guardiã dos interesses dos mais pobres de seu país na arquitetura européia, mas isso não é mencionado em seu programa e nem faz parte de seu discurso, avalia.

Bayrou é a favor da redação de uma nova proposição de Constituição Européia e propõe uma Aliança Mediterrânea que não inclua a Turquia. "Todos os potenciais ganhadores da eleição deixam a desejar quanto ao alcance e ao que entendem de Europa unida", conclui o coordenador.

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