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Nayib Bukele, da Grande Aliança Nacional (GANA), fala aos partidários depois de vencer as eleições presidenciais de El Salvador, em 3 de fevereiro de 2019 | LUIS ACOSTA/AFP
Nayib Bukele, da Grande Aliança Nacional (GANA), fala aos partidários depois de vencer as eleições presidenciais de El Salvador, em 3 de fevereiro de 2019| Foto: LUIS ACOSTA/AFP

O candidato do partido de centro-direita Grande Aliança pela União Nacional (Gana), Nayib Bukele, foi eleito presidente de El Salvador neste domingo (03), segundo declaração do Tribunal Superior Eleitoral do país. Após a apuração de cerca de 90% das urnas, o ex-prefeito de San Salvador venceu com quase 54% dos votos, obtendo mais apoio que seus três principais adversários juntos e evitando um segundo turno.

Durante a campanha Bukele, 37 anos e ex-prefeito de San Salvador, se apresentou como uma mudança da política tradicional do país, dominada por ex-guerrilheiros e por um partido associado a governos apoiados por militares no passado.

"El Salvador virou a página na era pós-guerra. E agora podemos começar a olhar para o futuro", disse Bukele a uma multidão de apoiadores quando a sua vitória já era certa. 

Uma das preocupações mais importantes dos eleitores é a violência atribuída às gangues, que têm enorme poder nesse país da América Central. Embora as taxas de homicídio tenham diminuído em relação ao pico de 2015, El Salvador continua sendo um dos países mais violentos do mundo, com mais de 3.300 mortes no ano passado em um país de cerca de 6,5 milhões de habitantes. A violência é um fator chave que impulsiona a migração para os Estados Unidos. Os candidatos presidenciais se comprometeram a encontrar maneiras de reduzir a violência, oferecendo programas de prevenção ao crime em vez de uma abordagem de mão de ferro, sem dar detalhes de como fariam isto. 

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Bukele, um homem de negócios, concorreu ao partido de centro-direita Gana. A Aliança Republicana Nacionalista, de direita, conhecida como Arena, terminou em primeiro lugar nas eleições legislativas do ano passado, mas seu candidato, o magnata dos supermercados Carlos Calleja, ficou em segundo lugar na noite de domingo, com 31,6%. Hugo Martinez, ex-ministro das Relações Exteriores e membro da Frente de Libertação Nacional Farabundo Marti (FMLN), teve 13,9% dos votos. O presidente Salvador Sanchez Ceren, da FMLN, não pode concorrer porque o cargo está limitado a um mandato. 

A força política das gangues

Desde o fim da guerra civil de 12 anos em El Salvador, em 1992, dois partidos dominaram o sistema político do país: Arena e FMLN. Mas os salvadorenhos estavam procurando uma nova opção depois de grandes escândalos de corrupção e do que muitos eleitores vêem como falta de progresso no combate ao crime. 

"A violência aqui está fora de controle", disse Gerardo Alfaro Gomez Castillo, 37 anos, um segurança. "Apenas o plano de segurança de Bukele é atraente para mim porque é algo diferente das medidas que vimos nos últimos 15 anos." 

O período que antecedeu a eleição foi marcado por violência, com 285 pessoas mortas em janeiro, incluindo oito policiais. O número de homicídios foi menor do que em janeiro de 2018, mas o ataque contra a polícia foi visto como um sinal de que as gangues podem estar pressionando os candidatos a negociar com eles depois que forem eleitos. 

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Os assassinatos de policiais "nos fizeram lembrar que as gangues continuam a ter uma presença política e uma presença desestabilizadora no país", disse Veronica Reyna, especialista em segurança da organização de direitos humanos Passionist Social Service, afiliada à Igreja Católica. 

Em 2003, sob o presidente Francisco Flores (Arena), El Salvador começou a implementar a política de "mano dura", ou mão firme, contra as gangues. Quando a FMLN conquistou a presidência em 2009, prometeu lidar com a segurança de maneira diferente, abordando as causas profundas da violência com programas voltados para a juventude e o desenvolvimento econômico. Em 2012, o presidente Mauricio Funes, da FMLN, iniciou negociações com as gangues para chegar a uma trégua, oferecendo-lhes concessões, como condições prisionais menos restritivas. As taxas de homicídio despencaram, mas depois dispararam novamente quando as conversações se desfizeram em 2014. 

A trégua deixou claro que as gangues são forças políticas importantes em El Salvador. Uma investigação do diário El Faro revelou que o então candidato Bukele pagou gangues para votar nas eleições para prefeito de 2015. El Faro informou que tanto a Arena quanto a FMLN pagaram gangues para votar nas eleições presidenciais de 2014. Bukele negou a negociação com gangues, mas reconheceu a importância de obter aprovação de gangues para realizar projetos governamentais. O vice-presidente da Arena recentemente reconheceu em uma entrevista que "há lugares onde temos que pagar para entrar". A FMLN negou as alegações. 

"O melhor ator que determina se você tem mais ou menos homicídios amanhã ou agora ou em uma semana não é o governo. São as gangues", disse José Miguel Cruz, especialista em gangues salvadorenhas da Universidade Internacional da Flórida. "Eles fazem isso para fins políticos como uma ferramenta de barganha para melhorar sua posição frente ao governo ou vis-à-vis a sociedade". 

Os políticos tentaram se distanciar de qualquer tipo de diálogo com as gangues por causa da reação pública que ocorreu após as últimas conversas.

Insatisfação popular

Sob o segundo mandato presidencial da FMLN, de 2014 a 2019, o partido adotou ainda mais as medidas de “mano dura” que havia criticado. As forças de segurança começaram a cometer um número crescente de assassinatos extrajudiciais, segundo grupos de direitos humanos e autoridades da Organização das Nações Unidas (ONU). O governo negou essa alegação, dizendo que a maioria morreu em tiroteios com forças de segurança. 

Nenhuma das abordagens anteriores satisfez os salvadorenhos afetados pela violência diariamente. 

"Eles nos desapontaram", disse José Isaac Cubias Hernandez, um estudante de engenharia de 20 anos que considerava se votava em Bukele ou se não votaria, enquanto a eleição se aproximava. "Mano dura não funcionou. A trégua não funcionou." 

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Durante a campanha, os três principais candidatos afirmaram favorecer a prevenção da violência, através do fornecimento de atividades esportivas e artísticas para jovens, bem como de programas de capacitação profissional. 

"Os candidatos sempre se retratam fazendo as coisas de maneira diferente, dependendo do que tem sido o programa de segurança vigente do último governo", disse Cruz. "No final, eles acabam fazendo quase a mesma coisa: novas versões das políticas de mano dura ou de tolerância zero." 

Bukele alegou que não irá aprovar as políticas da mano dura, mas muitos membros proeminentes do seu partido têm defendido essas táticas.

Além disso, o novo governo herdará uma força policial acusada de corrupção e execuções extrajudiciais e um sistema penitenciário problemático. El Salvador tem a segunda maior taxa de encarceramento do mundo, depois dos Estados Unidos, mas muitos membros podem continuar se comunicando com gangues enquanto estão na prisão. 

Analistas dizem que o novo governo precisa de uma estratégia sofisticada. 

"Um plano de segurança não passa por campos de futebol, bolas de futebol e emprego", disse Reyna. "Trata-se de definir como a polícia vai agir, definir como abordar áreas controladas por gangues, como abordar o sistema penitenciário e que tipo de diálogo com essas estruturas criminosas eles poderão ter."

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