Pesquisadores disseram nesta quinta-feira que fezes de chimpanzés analisadas por eles mostram como o vírus da Aids se originou em macacos selvagens de Camarões e de lá se espalhou para seres humanos da África - e depois do mundo todo.
O estudo, publicado na revista "Science", sustenta outras pesquisas que sugerem que de alguma forma as pessoas contraíram a doença de chimpanzés - provavelmente consumindo sua carne.
- A análise diz que o grupo de chimpanzés que deu origem ao HIV é uma comunidade que reside em Camarões - disse Beatrice Hahn, da Universidade do Alabama, responsável pelo estudo. - Mas isso não significa que a epidemia tenha começado lá, porque não foi assim - afirmou Hahn, que há anos estuda a origem genética do HIV.
- Na verdade, sabemos como a epidemia decolou. Ela decolou em Kinshasa e Brazzaville - afirmou, referindo-se às capitais respectivamente da República Democrática do Congo e da República do Congo, separadas apenas pelo rio que batiza ambos os países.
Os estudos remontam o primeiro contágio humano a um homem que doou uma amostra de sangue em 1959 em Kinshasa (então chamada Leopoldville). Análises posteriores mostraram que se tratava do vírus da Aids.
A versão do HIV que circula entre chimpanzés se chama vírus da imunodeficiência símia e é inócuo aos animais. Os humanos são os únicos animais naturalmente suscetíveis ao HIV.
A Aids foi identificada há apenas 25 anos. Atualmente, o vírus atinge 40 milhões de pessoas no mundo e já matou 25 milhões. O vírus da imunodeficiência símia já havia sido encontrado em chimpanzés de cativeiro, mas Hahn queria provar que ele existe também na natureza. Sua equipe internacional obteve a cooperação do governo de Camarões e contou com guias locais.
- Os chimpanzés daquela área são caçados. É certamente impossível vê-los. É difícil localizá-los para encontrar esses materiais - afirmou a cientista.
Entretanto, os guias conseguiram recolher 599 amostras de fezes. O laboratório de Hahn encontrou nelas o DNA dos animais, identificou cada espécime e então encontrou evidências do vírus.
- Fomos a dez locais e encontramos evidência de infecção em cinco. Conseguimos identificar um total de 16 chimpanzés infectados e conseguimos a sequência viral de todos - afirmou Hahn.
Até 35% dos macacos em algumas comunidades estão infectados. Não só isso: há também diferentes clades (variedades) do vírus.
- Descobrimos que algumas das clades eram bastante próximas ao vírus humanos, e outras não eram - afirmou ela.
Chimpanzés separados por um rio foram infectados por diferentes clades, segundo Hahn, e o rio pode ter levado o vírus para a população humana.
- Então como ele chegou do sul de Camarões à República Democrática do Congo? - indagou ela. - Alguns humanos podem ter feito o caminho. Há um rio que vai do sudeste de Camarões e até o Rio Congo.
Comerciantes de marfim e madeira usavam o Rio Sangha na década de 30, quando supostamente ocorreram as primeiras transmissões entre humanos. O estudo de Hahn sugere que o vírus foi transmitido de chimpanzés para humanos mais de uma vez.
- Realmente não sabemos como essas transmissões ocorreram - disse Hahn. - Sabemos que não se pega de brincar com um chimpanzé, ou de um assento sanitário, assim como não se pega HIV em assentos sanitários. A transmissão exige a exposição a sangue infectado ou a fluidos corporais infectados. Assim, se alguém é mordido por um chimpanzé que está sendo caçado, o contágio é possível.
O estudo de Hahn só vale para o HIV do grupo M, que é a principal cepa viral responsável pela pandemia da Aids.
"É possível que ainda existam outras linhagens de vírus de chimpanzés que possam representar riscos de infecção humana e se provem problemáticos para o diagnóstico do HIV e suas vacinas", escreveu a equipe.



