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Refugiados atravessam a fronteira da Líbia com a Tunísia, principal ponto de partida para a Europa | Yannis Behrakis/Reuters
Refugiados atravessam a fronteira da Líbia com a Tunísia, principal ponto de partida para a Europa| Foto: Yannis Behrakis/Reuters

Entrevista

Philippe Legrain, escritor inglês, autor do livro Immigrants: Your country needs them (Imigrantes: Seu país precisa deles)

De que forma os europeus podem lidar com os grandes fluxos imigrantes ?

Precisamos ser mais mais generosos em nosso sistema de asilo. Os países da comunidade europeia não podem ficar jogando os refugiados indesejados uns para os outros. Com o envelhecimento da sociedade europeia e a diminuição da população em idade ativa, a UE precisa ser mais aberta ao trabalhadores que vem de fora. Devemos ver a imigração como uma oportunidade e não uma ameaça.

A intenção dos países integrantes do espaço Schengen de retomar os controles fronteiriços pode ser considerada um retrocesso?

Sim, é um regresso. A liberdade de trânsito é um princípio central da União Europeia e não deve ser restringido, a não ser em circunstâncias extremas.

Esse tipo de medida pode estimular a xenofobia?

A xenofobia nunca deixou de existir na Europa e as dificuldades econômicas têm trazido isso à tona. É evidente que há uma guinada para o populismo na política europeia, mas os políticos que estão no poder precisam confrontar a xenofobia e não ceder.

Entrevista

Estêvão Rezende Martins, pesquisador de História da União Europeia, da Universidade de Brasília (UnB)

De que forma os europeus podem lidar com os grandes fluxos de imigrantes ?

A primeira coisa seria trocar os regimes políticos dos países africanos, para que eles se tornem, efetivamente, democracias sociais decentes. Também é preciso combater a corrupção que, de alguma maneira, copia a mentalidade colonial em que muitos desses países acabaram sendo formados.

Existe vontade política da União Europeia em colaborar com os países de origem dos imigrantes?

Existe. Em mais de uma ocasião foram feitos processos de investimentos locais para, por exemplo, dar acesso à água, viabilizar condições de saúde. Mas quando há uma revolução, começam a dar tiros na porta das casas e muitas vezes esses investimentos se perdem.

A intenção dos países integrantes do espaço Schengen de retomar os controles fronteiriços pode ser considerada um retrocesso?

Não. Porque pode ser que voltem a pedir o passaporte em várias fronteiras, mas isso, até pouco tempo, era normal. As pessoas vão acabar se acostumando.

Uma onda gigante vem do norte da África em direção à Europa e a solução proposta para contê-la é fechar as fronteiras entre os países. Essa é a visão do primeiro mi­­nistro italiano, Silvio Berlusconi, que chegou a chamar de "tsunami humano"o grande fluxo de refugiados que entram no território da União Europeia. Com a com­­panhia do presidente francês Ni­­colas Sarkozy, o premiê italiano lançou um clamor para que se­­jam feitas mudanças no acordo de Schengen, que permite livre circulação de pessoas e bens pela Europa.

Mas antes de liderarem o coro uníssono anti-imigração, Sar­­kozy e Berlusconi trocaram farpas. Desde o início do ano, mais de 25 mil imigrantes, refugiados dos conflitos da revolta árabe, chegaram à Europa. A maioria vem da Tunísia e entra no continente pela Itália. Por não receber o apoio que esperava da União Europeia para lidar com a imigração, Berlusconi resolveu conceder vistos de residência temporários aos tunisianos. Assim, eles poderiam transitar livremente pelos países da Europa e ir ao en­­contro de seus familiares que já moram lá, principalmente na França e Alemanha.

A reação de Sarkozy foi suspender temporariamente , no dia 17 de abril, a entrada de trens vindos da Itália para a França, em uma tentativa de frear a chegada de imigrantes. A decisão do presidente francês contrariava justamente o consenso de livre circulação no Espaço Schengen.

Foi no dia 26 de abril que Sar­­kozy e Berlusconi manifestaram que não são rivais nessa questão, mas temem um mesmo inimigo. Os dois se uniram no pedido de que os países signatários do acordo de Schengen reconsiderem o livre trânsito entre as fronteiras. O principal objetivo seria evitar a imigração ilegal.

O professor da Universidade de Brasília (UnB) Estêvão Rezen­­de Martins, que pesquisa História da União Europeia, diz acreditar que a retomada dos postos de controle nas fronteiras faz sentido: "É um pico de pressão que não é normal. Estão imigrando em verdadeiras canoas, com 250 pessoas, sem documento, sem dinheiro. É porque a condição é anormal no país de origem e vai se tornar anormal no país de destino."

De acordo com a Agência da Or­­ganização das Nações Unidas para Refugiados, são justamente essas pessoas sem lenço e sem documento que precisam de abrigo. "Os refugiados necessitam deslocar-se para salvar suas vidas ou preservar sua liberdade", informa o texto no site da agência e alerta: "Se outros países não os aceitarem poderão estar condenando estas pessoas à morte ou à uma vida insuportável nas sombras, sem sustento e sem direitos".

Problema antigo

As mudanças propostas no acordo de Schengen por Itália e Fran­­ça são o ápice dos problemas com imigração que a Europa vem acumulando nos últimos anos. Em 2004, o premiê italiano Silvio Berlusconi foi criticado por organizações de direitos humanos após deportar centenas de líbios que chegavam ao seu país, sem dar oportunidade para que verdadeiros refugiados fossem identificados.

Revoltas no subúrbio de Paris também foram notícia em todo o mundo, em 2005, após a morte de dois jovens, descendentes de africanos, que morreram enquanto eram perseguidos pela polícia e morreram

O escritor inglês Philippe Le­­grain, autor do livro Immigrants: Your country needs them (Imi­­grantes: Seu país precisa deles), defende que a solução para esses problemas não está no controle entre as fronteiras: "A imigração tende a se regulamentar por si mesma: as pessoas vão para onde há trabalho. Muitas pessoas estão saindo da Irlanda, por exemplo, pa­­­­ra economias que estão melhor".

Acordo garante livre circulação de pessoas

O Acordo de Schengen permite a livre circulação de pessoas e bens entre 25 países da Europa. Parti­­cipam 22 membros da União Eu­­ropeia e ficam de fora Grã-Bre­­tanha, Irlanda, Bulgária e Romê­­nia. Países que não fazem parte da UE também assinaram o acordo: Islândia, Noruega e Suíça.

O pacto foi assinado em 1985 próximo uma localidade de Lu­­xemburgo chamada Schengen. A partir de 1995, foi abolida exigência de passaporte entre os países signatários do acordo e estabelecido o livre trânsito. Na última quin­­ta-feira, ministros do interior dos países membros da União Europeia se reuniram para discutir a fixação temporária de fronteiras internas do bloco para conter o aumento de imigrantes ilegais. Dois dias antes. a Dinamarca já se adiantou e voltou a fazer controle aduaneiro nos limites com a Alemanha e a Suécia.

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