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Nas eleições legislativas deste domingo (11), os candidatos apoiados pelas Farc tiveram 52 mil votos em um universo de 17,3 milhões de eleitores | FEDERICO RIOS ESCOBARNYT
Nas eleições legislativas deste domingo (11), os candidatos apoiados pelas Farc tiveram 52 mil votos em um universo de 17,3 milhões de eleitores| Foto: FEDERICO RIOS ESCOBARNYT

A Colômbia, durante muito tempo, foi conhecida como um lugar extremamente violento. Disputas políticas, narcotráfico e guerrilhas ditaram os conflitos, que ultrapassaram mais de meio século. Este cenário ganhou, inclusive, espaço nas telas em séries como “Pablo Escobar: El Patron del Mal” e “Narcos.” Agora, o país quer respirar a paz e enfrentar novos desafios.

A incursão das Forças Armadas Revolucionárias Colombianas (Farc) – o grupo guerrilheiro mais famoso e que depôs as armas em 2016 – na política não convenceu. Os candidatos apoiados por eles tiveram 52 mil votos em um universo de 17,3 milhões de eleitores nas eleições legislativas do último domingo.

“O discurso das Farc não empolgou”, diz Jorge Gamez Gutierrez, professor de Economia da Universidade La Salle. Mas, mesmo assim, eles terão voz ativa no Legislativo: terão cinco cadeiras na Câmara de Representantes e cinco no Senado. A decisão é fruto do acordo de paz assinado em 2016.

É o panorama de uma nova Colômbia, que não quer de volta os tempos em que a guerrilha ocupava boa parte do país e se confrontava com os paramilitares e as Forças Armadas. Edwin Tarapuez Chamorro, professor de Economia da Universidad Nacional do Quíndio, aponta para um retrato desses novos tempos: o movimento no Hospital Militar de Bogotá praticamente caiu a zero. Era o local para onde iam as vitimas militares do conflito com a guerrilha.

Outro indicador de que os tempos são outros é citado por Gamez: a tranquilidade nas eleições. “Foram as eleições mais calmas em mais de 50 anos”, enfatiza ele. Na campanha eleitoral não houve assassinato de candidatos – coisa comum em outros anos. E a abstenção também caiu. Em um país em que o voto é facultativo, quase a metade dos eleitores foram às urnas. O número de votantes cresceu 24,6% em relação às eleições legislativas passadas, em 2014. 

O que mais agitou o processo eleitoral foi um escândalo de corrupção. É a denúncia de compra de votos por parte da senadora eleita Aída Merlano, do Partido Conservador, que ocorreu na cidade portuária de Barranquilla (Norte). O caso está sob investigação e pode ser submetido à Corte Suprema (equivalente colombiano do STF). 

Gamez avalia que o grande vencedor nas eleições legislativas não foi o Centro Democrático e seus aliados, que obtiveram a maior parte dos votos. “Foi a sociedade e a democracia colombiana.” 

O processo de paz segue adiante 

Apesar de as Farc terem tido uma grande derrota e o Centro Democrático – partido do ex-presidente Álvaro Uribe, contrário ao acordo com a guerrilha feito pelo atual presidente Juan Manuel Santos – e seus aliados terem obtido a maioria na Câmara de Representantes e no Senado, o processo de paz segue adiante. 

A avaliação é de que o processo já está institucionalizado e legitimado, apesar de muitos considerarem que foram dadas muitas concessões às FARC, como, por exemplo, a criação de uma justiça especial para julgar os crimes cometidos por guerrilheiros, paramilitares, militares e outros agentes do governo durante os anos de repressão. 

“As prioridades da Colômbia agora são outras”, enfatiza Gamez. As questões que devem estar em jogo na campanha presidencial vão estar mais vinculadas à economia. O crescimento do PIB vem caindo desde 2013, mas pode registrar uma alta neste ano. A previsão mais recente, do banco de investimentos Itaú BBA, aponta para uma taxa de 2,5%. 

Um relatório, distribuído pelo Santander a seus clientes em dezembro, aponta que a eleição pode ser um fator crucial para assegurar o crescimento. “Um governo que mantenha políticas mais favoráveis ao mercado poderá estimular a confiança empresarial”, escreveram os analistas do banco. Também é relevante, segundo eles, a manutenção da estabilidade fiscal. 

Um dos grandes desafios do país é a elevada pobreza – 28% são extremamente pobres, segundo o Banco Mundial - e grande informalidade. E os sistemas de saúde e previdência necessitam de reformas urgentes. 

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Polarização eleitoral pode favorecer uma terceira via 

As eleições do último domingo também serviram para definir os últimos candidatos à presidência da Colômbia. São Ivan Duque, do Centro Democrático (centro-direita) e Gustavo Petro, do Colômbia Humana (esquerda). Sobre eles pesam muitas dúvidas. 

Ivan Duque é senador e considerado muito alinhado ao ex-presidente Álvaro Uribe, acusado de envolvimento com os paramilitares. O Tribunal Superior sediado em Medellín, segunda maior cidade do país, solicitou no mês passado, a abertura de investigações contra Uribe. “Pairam muitas dúvidas sobre ele”, diz o professor da Universidade Nacional do Quíndio. 

Apesar do bom desempenho nas urnas, o partido enfrenta resistências por estar vinculado a muitas oligarquias do interior do país, donas de boa parte das terras. Por outro lado, Duque é o “queridinho” do mercado financeiro. “A tendência é de que ele, se eleito, adote políticas econômicas pró-mercado”, destaca Tarapuez. 

O outro forte candidato é Gustavo Petro, senador e ex-prefeito de Bogotá, cargo do qual foi afastado e, posteriormente, reintegrado. Um dos fortes temores que rondam muitos colombianos é que ele adote políticas econômicas e sociais que transformem a Colômbia em uma “segunda Venezuela.” Isto é improvável, já que a esquerda é minoritária no Congresso colombiano. 

Gamez, da Universidade La Salle, também descarta esta hipótese. Ele enxerga que, se Petro conseguir chegar ao Palácio de Nariño (sede do governo colombiano), é provável que adote mais políticas de inclusão social. 

Diante desse quadro, abre-se espaço para candidaturas alternativas. Os nomes mais ventilados são os de Sérgio Fajardo, ex-prefeito de Medellín e ex-governador do departamento (equivalente ao Estado) de Antíoquia. Ele lidera a Coalizão Colômbia, um grupo de partidos de centro-esquerda. 

O outro nome é o do ex-vice-presidente e negociador-chefe do processo de paz com as Farc, Humberto de la Calle, do tradicional Partido Liberal. 

Eles terão de testar sua viabilidade ao longo da campanha eleitoral. Gamez acredita que diante do quadro atual os colombianos tendem a apoiar posições mais centristas.

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