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Mesmo com a acusação apresentada pela ONU de que crimes contra a humanidade são cometidos na Síria, grupos a favor do presidente Bashar al-Assad vão às ruas em defesa do regime do ditador | AFP/Sana
Mesmo com a acusação apresentada pela ONU de que crimes contra a humanidade são cometidos na Síria, grupos a favor do presidente Bashar al-Assad vão às ruas em defesa do regime do ditador| Foto: AFP/Sana

Confronto

Soldados, rebeldes e civis são mortos após cobrança da ONU

Um dia após o Conselho de Direitos Humanos da Organização das Nações Unidas (ONU) condenar as "graves violações" na Síria e cobrar sanções mais duras contra o governo do presidente Bashar al-Assad, 18 pessoas foram mortas no país, entre elas cinco civis.

Na cidade de Idlib, no noroeste do país, rebeldes entraram em confronto com forças de segurança perto da sede do governo provincial, deixando 15 pessoas mortas, três delas civis que ficaram no meio do fogo cruzado, segundo informações do grupo de Observatório Sírio para os Direitos Humanos. As outras vítimas são sete soldados do regime e cinco rebeldes.

Já na província de Daraa, um civil foi morto a tiros e outros cinco ficaram feridos hoje durante uma ação das forças de segurança na cidade de Tafas. Outros dois civis foram assassinados na cidade de Homs.

Os protestos contra a ditadura de Assad, iniciados em março, eram liderados por manifestantes pacíficos, mas nos últimos meses desertores das forças de segurança começaram a se organizar e criaram o Exército Sírio Livre. Nesta quinta-feira, soldados rebeldes mataram oito pessoas e deixaram 13 feridos em um ataque a uma base de inteligência da força aérea em Idlib.

Em uma reunião na Turquia no fim do mês passado, o Exército Sírio Livre se encontrou com representantes da oposição civil, do Conselho Nacional Sírio, e ambos os grupos concordaram em coordenar seus esforços para derrubar o regime de Assad.

Ontem, a comissária de Direitos Humanos da ONU, Navi Pillay, disse que mais de 4 mil pessoas foram mortas nos protestos desde março.

Agência Estado

Especialista explica conceitos do conflito

O Direito Internacional aponta características que definem um estado de guerra civil. O professor Luís Alexandre Winter, da Pontifícia Universidade Cató­­lica do Paraná (PUCPR), explica alguns dos conceitos em entrevista à Gazeta do Povo.

A existência de um grupo que tem como objetivo, a separação de um território do restante do país é um dos fatores que podem estimular uma guerra civil. Esse tipo de conflito também pode ser suscitado por parte da população que se organiza para derrubar o poder instituído, com possibilidade de chegar a recorrer ao uso de armas para isso, como ocorre na Síria.

Nesse tipo de guerra, também é comum o grupo opositor dominar uma porção do território e aplicar suas próprias leis. Durante a tentativa de transição, os insurgentes deixam de seguir às leis locais passam a se basear nos tratados internacionais. Ao estipular, por exemplo, o tipo de tratamento que dão aos prisioneiros recorrem às convenções firmadas em organismo externos, como as Nações Unidas. Para aprovação de medidas, também é preciso buscar reconhecimento de outros países, já que o objetivo é destituir o governo que está no poder.

Winter destaca ainda que as forças armadas envolvidas no conflito passam a se estruturar segundo moldes de hierarquia militar.

Um país que apresenta todas essas características é considerado pelo direito internacional em estado de beligerância, ou seja, em guerra civil plena. Se somente uma ou algumas das situações citadas ocorrem, considera-se que o país está em estado de insurgência, também chamada de guerra de fato. (JN)

O anúncio da Organização das Nações Unidas, na última quinta-feira, de que a Síria se encontra em estado de guerra civil confirma o que já era previsto por diversos analistas, repórteres e observadores internacionais. A insistência de Bashar al-Assad em permanecer no poder, insurgentes contra o regime do ditador, conflitos entre diferentes vertentes religiosas e uma posição geográfica estratégica são alguns dos elementos que estimulam a agora reconhecida guerra civil.

"A situação da Síria é extremamente complexa com etnias, com sistemas de tribo e um grupo que está há muitos anos no poder, e quer continuar. Além disso, a insatisfação popular é muito grande. Forças que eram do governo debandaram e estão contra agora. E o governo sírio perdeu apoio de antigos aliados, como a Turquia e a Liga Árabe", diz o professor Expedito Bastos pesquisador de assuntos militares da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF) ao analisar o atual panorama do país.

Bashar al-Assad é o presidente sírio desde 2000 e foi antecedido por seu pai, Hafez al-Assad, que ficou 30 anos no poder. A Síria, junto com o Líbano, é considerado um país em que a minoria cristã goza de grande liberdade. A família Assad é alaoíta (vertente minoritária da religião muçulmana), e a elite do país é formada por muitos integrantes desse grupo religioso, assim como as lideranças militares.

Essas duas minorias religiosas temem que, com a queda de Assad, passem a sofrer perseguições e integram os grupos que vão as ruas em defesa do presidente. Durante a revolta, além dos pedidos para que Assad deixe o poder, também já estão ocorrendo manifestações de ódio religioso. "Vários grupos que se toleravam começam a se combater", observa Bastos.

"Para ocorrer uma guerra civil, o Estado perdeu algum domínio, não consegue mais ter controle de todo seu território", explica Rui Dissenha, professor de Direitos Humanos da Universidade Posi­­tivo. Damasco, a capital síria, ainda é descrita por alguns dos que conseguem entrar e enviar informações como uma cidade em aparente normalidade. Mas em cidades como Homs, que é a terceira maior do país e de maioria sunita (em geral oposicionista), que os conflitos dão motivo para que se reconheça uma guerra civil no país. Imagens de corpos ensanguentados, sem identificação, circulam o mundo. Muitas das mortes são causadas por forças do governo que reprimem os rebeldes, mas também há assassinatos entre civis armados por questões religiosas.

Ao apresentar sua avaliação da situação síria, na última quinta (1), a alta comissária de direitos humanos da ONU, Navi Pillay, recordou que em agosto já havia avisado ao Conselho de Segurança que o número de desertores estava aumentando e que isso levaria a uma guerra civil, já que essas pessoas têm acesso a armas. A ONU apurou que mais de 4 mil pessoas morreram nos confrontos e que até agora 307 crianças foram assassinadas.

Consequências

Diante da constatação da guerra civil síria e das atrocidades cometidas pelo governo de Assad, as reações internacionais devem prosseguir. Depois de a Liga Ára­­be aprovar sanções contra a Síria, há duas semana, o Conselho de Direitos Humanos da ONU condenou na última sexta-feira (2) os atos violentos cometidos no país e classificou como crimes contra a humanidade, que devem ser levados aos Tribunal Penal Inter­­nacional.

Para Luís Alexandre Winter, professor de direito internacional da Pontifícia Universidade Cató­­lica (PUCPR), não irá ocorrer uma intervenção militar como aconteceu na Líbia. "A Síria tem a Rússia como aliada que tem poder para impedir o fechamento do espaço aéreo caso fosse proposto no Conselho de Segurança da ONU". A vizinhança já repleta de conflitos (veja infográfico) também pode fazer com que a comunidade internacional tenha mais cautela antes fazer uma intervenção militar na Síria.

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