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O israelense Adham Brik, de 19 anos, não poderia estar mais satisfeito. Todo dia, ele deixa sua casa, na aldeia árabe de Abu Snan, para vestir o avental de voluntário no Departamento de Oncologia do Hospital Rambam, em Haifa, a terceira maior cidade de Israel. Lá, aprende os fundamentos da enfermagem, profissão que quer seguir. A volta para casa, porém, é menos entusiástica. Alguns amigos o boicotam desde que aceitou ser voluntário do Serviço Nacional, a opção civil ao alistamento militar obrigatório israelense. Para eles, ao colaborar com instituições do governo, Brik se tornou um traidor da causa árabe.

"Conversei com a família antes de aceitar, e meu pai deu força. Mas meus amigos foram menos compreensivos. Eles não se identificam com o Estado de Israel", explica Brik. "Mas não me importo porque não estou pegando em armas. Além do mais, meu país me deu muito: educação, saúde, bem-estar. Agora é hora de devolver".

A grande maioria dos árabes-israelenses (20% da população) se recusa a fazer parte de qualquer convocação relacionada ao Exército, até mesmo da prestação de serviços comunitários. Por enquanto, a opção é voluntária. Mas pode se tornar obrigatória como parte da nova lei de alistamento militar que o premier Benjamin Netanyahu tenta aprovar. A validade da lei atual termina na quarta-feira, e Netanyahu enfrenta pressões políticas e sociais para criar regras que agradem a todos. Uma tarefa difícil, já que as minorias isentas de convocação não querem mudar o status quo, enquanto a maioria clama pela "igualdade do fardo".

À exceção dos drusos, os árabes de Israel foram isentos do alistamento na criação do Estado. A iniciativa foi do premier Ben-Gurion, para quem seria injusto criar conflito entre a lealdade ao país ou aos "irmãos árabes". Pouquíssimos são voluntários. Outros optam pelo Serviço Nacional: trabalho comunitário em instituições públicas como hospitais, escolas, asilos. Eles recebem os mesmos benefícios de soldados, como soldo, transporte subsidiado e bolsa de estudos para a faculdade.

Campanhas contra a participação em serviço civil

O número de inscritos no Serviço Nacional cresce a cada ano. Em 2003, eram apenas cem. Hoje, a quantidade de voluntários árabes é recorde: 2.400. Mas eles lutam contra o estigma por parte de seus próprios líderes, contrários à inserção num projeto paralelo ao militar. Alegam que Israel trata os árabes como cidadãos de "segunda classe" e não pode exigir colaboração.

"Fazer Serviço Nacional é como servir no Exército", diz Nadim Nashef, diretor da ONG Baladna, uma associação de jovens árabes que faz companha contra a inscrição nos serviços comunitários. "Somos discriminados desde a criação de Israel, um país com símbolos nacionais judaicos no qual não podemos desenvolver nossa identidade. Querem que sejamos serviçais de um Estado do qual não queremos fazer parte?".

A polêmica do alistamento deslanchou com o fim da validade da lei de 2002. Ela permitiu aos jovens ultraortodoxos que estudam em seminários rabínicos escolher a farda por apenas seis meses ou serviços comunitários por um ano - em contraste com a maioria dos jovens, que servem o Exército por três anos (dois, no caso das mulheres). Quanto aos árabes, a lei manteve a liberação das casernas, encorajando o voluntariado civil. Mas ONGs contrárias reagiram com ações na Justiça, e a lei foi considerada inconstitucional pela Suprema Corte, sob a alegação de que infringe o princípio de igualdade entre cidadãos.

"Pode-se esperar que árabes lutem contra árabes?, perguntam, como se eles não estivessem lutando contra árabes por todo o Oriente Médio. É como se os cidadãos árabes devessem receber todos os direitos de cidadania sem precisarem cumprir com as obrigações de um cidadão", reclamou o ex-chanceler Moshe Arens, no jornal "Haaretz".

Depois da decisão do Supremo, Netanyahu nomeou uma comissão para redigir uma nova lei, mas, no dia 2 de julho, discussões internas acabaram dissolvendo o grupo. Diante do fracasso e de indícios de que o premier pensa em manter o status quo, o partido de centro Kadima abandonou a coalizão de governo à qual tinha se unido havia dois meses. Partidos religiosos ameaçam fazer o mesmo caso a nova lei exija alistamento universal.

Ao largo das discussões políticas, os 38 voluntários árabes-israelenses do Hospital Rambam continuam a trabalhar. Segundo o diretor do hospital, Raphael Beyar, a convivência é excelente.

"Não somos uma "ilha" de paz no meio do conflito, mas queremos ser um exemplo de convivência. Queremos provar que podemos trabalhar lado a lado, podemos viver em paz".

O ex-voluntário Muhamad Abu Roumi, de 21 anos, que cumpriu dois anos de Serviço Nacional e foi contratado como enfermeiro, concorda, e está encorajando a irmã a seguir o mesmo caminho:

"Vai sempre ter gente contra. Mas o tempo como voluntário só faz bem. Estou ajudando minha comunidade e construindo minha autoestima".

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