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Svante Pääbo
Svante Pääbo, biólogo sueco, recebeu o Nobel de Medicina ou Fisiologia de 2022 por suas descobertas baseadas em genomas de seres humanos arcaicos. Foto de 26 de janeiro de 2019.| Foto: EFE / Morell

O vencedor do prêmio Nobel de Fisiologia ou Medicina deste ano é Svante Pääbo, sueco de 67 anos e geneticista do Instituto Max Planck de Antropologia Evolutiva em Leipzig, Alemanha. O cientista liderou diversas pesquisas que culminaram na publicação do primeiro rascunho da sequência do genoma do homem de Neandertal, em 2010, e na descoberta dos denisovanos, hominídeos contemporâneos dos neandertais, cujos fósseis foram encontrados na caverna de Denisova, localizada nas montanhas de Altai, Sibéria. Entre as contribuições do cientista estão também o recorde de DNA humano mais velho já estudado e novos caminhos abertos no estudo de doenças (incluindo Covid) e adaptações humanas.

O laureado pode ser considerado um pai dessa área de estudos, chamada paleogenômica, que começou nos anos 1980 cheia de preocupações com contaminação — ele admitiu, por exemplo, que o DNA que extraiu de uma múmia egípcia provavelmente era o dele próprio. Pacientemente, as técnicas foram melhoradas e a preocupação com contaminações foi sanada. Em uma coletiva de imprensa após o anúncio do prêmio, Pääbo disse que ainda estava digerindo a notícia, incrédulo após a ligação da Academia. “Pensei que era uma pegadinha elaborada pelas pessoas no meu grupo”, declarou.

Nascido em Estocolmo, Pääbo e seus colaboradores mostraram que os seres humanos modernos têm uma parte importante do seu DNA, menor que 5%, que veio dos neandertais e dos denisovanos. Essa contribuição para o material genético presente nos núcleos das células, chamada pelos geneticistas de introgressão, é encontrada entre europeus e asiáticos, no caso dos neandertais, e apenas entre populações asiáticas no caso dos denisovanos. Isso significa que, entre 47 e 65 mil anos atrás, os Homo sapiens, ao sair da África e encontrar outras espécies de hominídeos inteligentes no continente da Eurásia, tiveram com elas filhos híbridos férteis que deixaram bilhões de descendentes. Todos os europeus e asiáticos, portanto são “mestiços” entre espécies humanas. Como a introgressão é pequena, isso não quer dizer que essas populações são muito diferentes geneticamente das populações africanas.

Em 2018, o laboratório alemão onde o cientista atua anunciou a descoberta de uma mulher que era uma híbrida descendente de neandertais e denisovanos e viveu 90 mil anos atrás. Um único osso dela foi preservado pelo tempo na caverna Denisova. Os trabalhos de Svante Pääbo permitem até mesmo inferir que esses fósseis, nos quais ele aplicou métodos próprios para a delicadíssima extração de DNA degradado por dezenas a centenas de milênios, não contam a história completa, como é de se esperar pela minoria de esqueletos que encontram condições ideais para a fossilização. Os genomas indicam que havia no mínimo uma terceira linhagem misteriosa de hominídeos que também teve filhos em raras ocasiões (fez introgressão) apenas com os denisovanos.

O cientista e seus pupilos também têm o recorde de mais antigo DNA humano já sequenciado: são amostras da Espanha com idade estimada em 430 mil anos. O corpo de conhecimento gerado permite inclusive saber mais da saúde do Homo sapiens e seus parentes mais próximos: já contribuiu para o melhor entendimento da esquizofrenia e até da Covid severa, e esclareceu que os tibetanos modernos devem suas adaptações à altitude do Himalaia ao DNA que herdaram daquela introgressão dos denisovanos. Os frutos são inúmeros: no mês passado, por exemplo, uma equipe de pesquisadores mostrou que uma variante genética presente apenas em sapiens, mas não em neandertais e denisovanos, faz com que cresçam mais neurônios em tecidos cultivados em laboratório.

Não se pode subestimar o quanto o trabalho de Svante Pääbo foi importante para revolucionar o entendimento da história da nossa espécie. Ele confirmou não apenas que a família humana era mais diversa do que se esperava, como também que diferentes espécies (ou subespécies, a depender da teoria do parentesco adotada) de pessoas conviveram juntas nos mesmos ambientes e tiveram filhos, alterando o destino de populações de continentes inteiros. É improvável que algum de seus colegas duvide de seu merecimento.

O clima entre geneticistas é de festa. David Reich, geneticista de populações humanas de Harvard que trabalhou com Pääbo no genoma dos neandertais, disse à revista Nature que se sente inspirado pelo colega. “Ele percebeu o quão especial e singular era esse tipo de dado”, acrescentou Reich. “O fato de que uma boa fração de pessoas correndo pelo mundo hoje têm DNA de humanos arcaicos como os neandertais tem consequências importantes para quem nós somos”.

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