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Julgamento

Brasil decidiu manter crucifixos

Em 2007 o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) julgou quatro representações questionando a presença de crucifixos em tribunais, como o que há no Supremo Tribunal Federal. Na ocasião o CNJ, que é o órgão de fiscalização externa da justiça brasileira, decidiu pela permanência dos crucifixos, entendendo que o uso de símbolos religiosos em órgãos do Poder Judiciário não fere a autonomia do Estado em relação à religião. Na avaliação do CNJ os crucifixos são muito mais símbolos culturais e tradicionais do que representantes de uma religião específica.

Entenda

O que é o Tribunal de Estrasburgo

O Tribunal Europeu de Direitos Humanos, ou apenas Tribunal de Estrasburgo, é a autoridade judicial para a garantia dos direitos humanos e liberdades fundamentais em toda a Europa. Qualquer europeu que se considere vítima de abusos nessas áreas, depois de esgotados os recursos na Justiça de seu país, pode recorrer ao tribunal. Regida pela Convenção Europeia de Direitos Humanos, a instituição tem sede na França e não é vinculada à União Europeia.

A recente decisão do Tri­bu­­nal Europeu de Direitos Hum­­anos de reverter uma sentença através da qual or­­denava a retirada de crucifixos das es­­colas públicas italianas reacende o debate sobre liberdade de crença e laicidade do estado. Palco de frequentes protestos contra as restrições da expressão religiosa, a Eu­­ropa vive um momento de tensão no qual são protagonistas os que pregam a limitação da fé ao foro íntimo, os que defendem a expressão da religião mesmo na vida pública e os que en­­tendem os objetos religiosos muito mais como símbolos culturais do que instrumentos de doutrinação.

Leia mais sobre o tema no artigo de Joel Pinheiro da Fonseca

Em 2009 o Tribunal de Estrasburgo, como também é chamado, acatou o pedido de uma mãe que alegava que o crucifixo presente na sala de aula dos filhos prejudicava seu direito de educá-los conforme suas convicções. O tribunal impôs ao governo italiano o pagamento de uma indenização de 5 mil euros e a imediata retirada dos símbolos religiosos. A decisão causou manifestações em todo o continente, não apenas por parte de grupos religiosos, mas também governos que viram no caso uma ofensa à soberania de cada nação e um exagero do tribunal, que teria ido além de suas atribuições. A Itália entrou com recurso e foi oficialmente apoiada por dez países europeus, incluindo a Rússia.

No dia 18 deste mês o recurso foi julgado e o mesmo tribunal emitiu nova sentença afirmando que a presença de crucifixos não viola o direito dos pais e não há provas de que afete a livre escolha de religião dos alunos. O fato dividiu analistas.

Para o sociólogo Gustavo Biscaia de Lacerda, da UFPR, a decisão é um erro. "Se o estado não tem doutrina não pode ostentar símbolo algum. Isso fere o estado laico", afirma Lacerda, para quem a defesa da manutenção de crucifixos é apenas casuísta. "Se nas paredes das escolas hou­­vesse uma lua crescente islâmica ou um sinal da umbanda, os cristãos se sentiriam ofendidos", enfatiza o sociólogo.

Mas a compreensão do que é a laicidade do estado é diferente para o jurista Ives Gandra Martins. "Estado laico não é estado ateu, é aquele que permite aos seus cidadãos a livre escolha de religião, garantindo o direito de professá-la", comenta Martins. Para o jurista, objetos religiosos em locais públicos não afetam a laicidade porque não privam as pessoas de crer naquilo que quiserem, mas tratam-se de símbolos históricos e culturais de uma nação. "Além do próprio Cristo Redentor, o Brasil tem centenas de cidades com nomes de santos por razões históricas, nem por isso seus habitantes são obrigados a ser católicos", diz Martins citando a recente visita de Barack Obama ao monumento no Rio de Janeiro.

Cerco

O caso dos crucifixos na Itália não foi o único episódio recente de discórdia envolvendo símbolos religiosos na Europa. Em 2009 a Suíça proibiu comunidades muçulmanas de erguerem minaretes (torres de onde se anunciam os momentos de oração) em suas mesquitas, gerando revoltas em todo o mundo islâmico e críticas da ONU. No mesmo ano, o presidente francês Nicolas Sarkozy afirmou durante um discurso que o costume de mulheres muçulmanas de usar burcas "não é bem-vindo no território da República Francesa". Em setembro de 2010 o senado da França aprovou a proibição do uso de burcas e véus integrais (que cubram o rosto inteiro) em todo o país, sob pena de multa e aulas de civilização às mulheres flagradas usando a vestimenta.

O filósofo e colunista do jornal Folha de S. Paulo Luiz Felipe Pondé afirma que a repressão às religiões tem raízes em séculos passados. "A radicalização anticlerical vem dos movimentos que se seguiram à Revolução Fran­­cesa, e acho que tende a crescer o radicalismo contra o Islã", diz Pondé ao comentar que o islamismo já é a segunda maior religião na Europa.

Para o filósofo as ações restritivas afetam a liberdade religiosa, mas reconhece tratar-se de um dilema. "As pessoas devem ter o direito de usar os símbolos que quiserem, entretanto não se pode negar que isso cause tensões entre setores mais e menos secularizados na sociedade", conclui.

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