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Buenos Aires – Saques aos comércios da Grande Buenos Aires, correntistas furiosos tentando invadir os bancos para reaver depósitos confiscados, colunas de fumaça despontando no céu portenho, provenientes das fogueiras com as quais os piqueteiros bloqueavam as avenidas da capital argentina enquanto uma multidão cercava o Congresso Nacional aos gritos de "que se vayan todos! ("que todos vão embora!").

Este era o caótico cenário em Buenos Aires em dezembro de 2001. O país, após seis meses de uma colossal fuga de divisas, havia sido abalado pelo impopular "corralito", o confisco bancário decretado pelo então presidente, Fernando de la Rúa. O resultado foi a paralisação da economia, a disparada do desemprego e da pobreza. As províncias, arruinadas, pediam mais autonomia, emitiam suas próprias moedas, e alguns políticos até flertavam com a idéia de proclamar a independência do poder central.

Apesar do caos social e político, pela primeira vez as Forças Armadas argentinas não se envolveram na crise para tomar o poder.

Mas, uma investigação realizada pelo jornal dominical "Perfil" indica, na edição publicada ontem, que os militares tinham um plano para tomar o poder, acalmar os ânimos, restabelecer a ordem social e convocar novas eleições. Seria o primeiro desembarque dos generais no poder sem a marca do "golpe de Estado clássico". Os militares avaliaram que a ocasião era ideal para tentar limpar sua imagem, maculada com uma seqüência de desastrosas ditaduras entre 1955 e 1983 (das quais, a última, entre de 1976 a 1983, marcada por violações dos direitos humanos sem precedentes na história da América do Sul).

A idéia de voltar ao poder circulou intensa – mas discretamente – entre chefes militares após a fuga precipitada do presidente De la Rúa pelo telhado da Casa Rosada, a bordo de um helicóptero. As máximas autoridades militares elaboraram um "plano de contingência para "cobrir o vácuo de poder" e a "necessidade de guiar uma transição" política.

Segundo o ex-ministro da Defesa José Pampuro, as Forças Armadas trabalharam com a hipótese de que, se o Congresso não conseguisse funcionar, se produziria um vácuo de poder e alguém teria de se encarregar da situação. A idéia dos militares era agir como avalistas de última instância da ordem e da unidade nacional. "Não foi planejado como um golpe de Estado clássico, com os tanques nas ruas", diz Pampurro.

No dia 20 de dezembro, na sede do Estado-Maior, as autoridades militares concluíram um plano que previa a mobilização de 9 mil soldados para proteger as duas usinas nucleares em funcionamento, as hidrelétricas, a Casa Rosada, o Congresso e outros edifícios públicos.

Na seqüência, De la Rúa decretou o estado de sítio, mas sem especificar as funções das Forças Armadas nessa situação de anormalidade. Diante da indefinição, os militares preferiram ficar de fora da crise. Nas horas seguintes, De la Rúa fugiu e os presidentes se sucederam com celeridade. Foram cinco presidentes diferentes em 12 dias. Na confusão, o contato entre os poderes civil e militar foi nulo. No dia 2 de janeiro, Eduardo Duhalde assumia o poder como presidente provisório.

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