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Muro na fronteira entre EUA e México na cidade mexicana de Tijuana, Baja California| Foto: Agustin PAULLIER/AFP

O final do ano se aproxima e o destino do muro que Donald Trump prometeu construir na fronteira entre Estados Unidos e México é incerto.

O "grande e bonito muro", como Trump o chamou, alcançou a extensão de 400 milhas (cerca de 640 KMs) no final de outubro. O Department of Homeland Security (Departamento de Segurança Nacional, em tradução livre) realizou até mesmo cerimônia para comemorar o marco. Porém, quase toda construção foi desenhada como substituição de barreiras já existentes: apenas 9 milhas (14,4 KMs) de novas barreiras foram levantados em seções previamente vazias da fronteira.

Isso não significa que nada foi feito, quando consideramos que boa parte das cercas existentes precisavam de manutenção. Alguns trechos da barreira estavam em ruínas, já as novas barreiras consistirão em postes de aço de até 9 metros de altura, melhores vias de acesso, câmeras, iluminação e outros recursos que vão dificultar a passagem pela fronteira. No entanto, o esforço do presidente para aumentar a extensão do muro não colheu frutos e acabou sendo substituído por uma modesta reforma.

A história das reformas no muro é parecida com a de quando Trump planejou construir um loteamento no Upper West Side em Manhattan, nos anos 90. Trump havia proposto uma "cidade de televisão", um empreendimento próximo ao Rio Hudson que contaria com construções residenciais e um enorme arranha-céu, mas a ideia parou em trâmites burocráticos, oposição por parte de moradores e problemas financeiros do próprio Trump. O terreno acabou vendido para investidores de Hong Kong, e o resultado, o Riverside South, foi um complexo residencial comum.

De forma similar, as visões fantásticas para o muro que Trump tinha – cobrir todo o limite sul da fronteira americana –, amplamente propagandeadas na campanha de 2016, não se concretizaram. O governo de Trump enfrentou diversos processos judiciais que impediram ou atrasaram a construção do muro. Legisladores democratas se recusaram a aprovar qualquer financiamento público do projeto. Proprietários de terras na fronteira também lutaram contra as tentativas do governo de se apropriar das suas terras, mesmo com compensações.

As tentativas de Trump de financiar o projeto terminaram em uma manobra arriscada para consegui-lo sem a aprovação do Congresso. Durante negociações para aprovação do Orçamento Federal Americano em 2018, democratas limitaram os recursos para operações na fronteira em 1,6 bilhões de dólares. No entanto, Trump se recusou a aprovar o Orçamento caso 5 bilhões de dólares não fossem destinados ao muro. O imbróglio levou à maior paralisação do governo federal na história dos Estados Unidos. Em fevereiro de 2019, o presidente recuou e aprovou o orçamento sem os fundos adicionais – como alternativa, Trump declarou emergência nacional na fronteira sul para que recursos do Pentágono fossem direcionados para a construção do muro.

O governo de Trump conseguiu impedir que "caravanas" de imigrantes ilegais entrassem no país naquele ano. Porém, a declaração de emergência nacional encontrou oposição de senadores republicanos, incluindo Ben Sasse (de Nebraska), que se preocupava com abuso de poder por parte do Poder Executivo. Sasse acabou votando contra uma condenação formal da declaração de emergência de Trump, argumentando que ela não excedia os limites do que ele considerava um estatuto de emergência nacional excessivamente abrangente.

O Supremo Tribunal aceitou, em novembro de 2020, pedido que questionava a constitucionalidade da declaração de emergência. É possível que a Corte Americana considere o redirecionamento de recursos do Pentágono para a construção do muro como inconstitucional.

Em abril deste ano, o governo de Trump já havia canalizado pelo menos 10 bilhões de dólares de recursos do Pentágono para a construção do muro. De acordo com documentos obtidos pelo Washington Post em 2019, o governo estimava que a construção de 500 milhas (800 KMs) de novas barreiras custaria aproximadamente 36 milhões de dólares por milha.

Depois das manobras orçamentárias, processos judiciais e outros obstáculos, as construções hoje existentes devem chegar a 450 milhas (720 KMs) de extensão, caso as obras mantenham o ritmo atual. O resultado é como aquele do Riverside South: longe de ser o que a ambição de Trump projetava, mas bom o suficiente.

Biden e o muro

Contudo, o projeto pode empacar durante o próximo governo. Joe Biden já prometeu suspender as políticas imigratórias de Donald Trump, inclusive a construção do muro.

"Nenhum centímetro de muro será construído durante o meu governo", disse Biden em um encontro com repórteres latinos e negros, em agosto.

Ainda não está claro, porém, se o presidente eleito paralisará completamente as construções em andamento. Empresas contratadas pelo governo federal estão trabalhando em novas seções do muro, o que levaria o governo a passar por alguns processos administrativos caso opte por encerrar os contratos vigentes.

"Geralmente, as cláusulas [do contrato] são mais favoráveis ao governo, muito mais favoráveis que no mercado privado", disse John Horan, professor de Direito na Universidade de Georgetown e especialista em contratos do governo, ao Arizona Central em novembro. "Existe um processo regulatório já estabelecido para paralisar esses contratos, caso o presidente decida fazê-lo. É uma forma eficiente e ordenada de compensar de forma justa aqueles que o governo contratou pelos serviços já prestados", concluiu.

Enquanto isso, mesmo antes das eleições, grupos progressistas pediam a Biden que não apenas parasse a construção, mas também derrubasse seções que já foram construídas.

"A construção desse muro ilegítimo profanou terras locais, desmatou preservações ambientais e destruiu comunidades", disse o advogado da ACLU (União Americana Pelas Liberdades Civis) Dror Ladin ao Daily Beastem outubro. "Cada milha ilegítima desse muro deve ser derrubada, e o governo deve trabalhar com comunidades da fronteira para desfazer os danos que a construção do muro já infringiu", completou.

O quão "ilegítimo" é o muro pode ser assunto para futuras batalhas judiciais. Se a Suprema Corte considerar que o direcionamento de recursos do Pentágono foi inconstitucional, por exemplo, isso pode indicar que algumas partes do muro foram construídas ilegalmente. Consequentemente, as acusações e clamores democratas ganhariam legitimidade.

É claro que, assim como construir, derrubar paredes é caro. E recuar as políticas imigratórias de Trump pode levar tempo, segundo três pessoas envolvidas na elaboração das políticas imigratórias de Biden disseram à NBC. Biden assumirá o cargo em meio a uma pandemia, e provavelmente os esforços pela vacinação serão prioridade na Casa Branca.

Se a história nos conta alguma coisa, é que ação do governo sobre um muro na fronteira continuará, de certa forma, desconectada da realidade. O Congresso aprovou em 2006 o Secure Fence Act, que estabelecia a construção de cercas de duas camadas por todas 670 milhas (1072 KMs) da fronteira entre Estados Unidos e México. A "segunda camada" nunca saiu do papel. Destino semelhante teve o muro prometido por Trump, que acabou se tornando apenas uma cara reforma das barreiras existentes.

Agora, no governo Biden, os progressistas pedirão a demolição das barreiras reformadas. Mas seus sonhos de desmantelar o "grande e bonito muro" que Trump prometeu se mostram impossíveis, já que o próprio Trump falhou em construí-lo.

*Zachary Evans é redator de notícias da National Review Online e veterano das Forças de Defesa de Israel.

© 2020 National Review. Publicado com permissão. Original em inglês.

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